Acórdão nº 1304/21.4T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora: I L…, com domicílio em Lisboa, veio instaurar o presente procedimento cautelar não especificado contra N…, com domicílio em Évora, A…, com domicílio em Cascais, e S…, com domicílio em Évora alegando, em síntese: - O Requerente é o legítimo legatário de um direito de usufruto deixado por óbito do seu tio, P…; - O Autor da Herança quis atribuir, de forma separada, a nua propriedade de um imóvel designado por “Herdade …” a um legatário e o usufruto deste imóvel a outro legatário; - Assim, deixou como legado a nua propriedade da Herdade … ao aqui Requerido N… e o direito de usufruto desse imóvel à sua irmã, M…, tendo ainda previsto que, se esta não pudesse ou não quisesse aceitar o usufruto legado, o mesmo reverteria, por 5 (cinco) anos, a favor do aqui Requerente; - Com a abertura da sucessão e chamamento de herdeiros e legatários, os Requeridos, contrariando a vontade expressa do Autor da Herança, praticaram diversos atos que ofendem o direito de usufruto que, atentas as concretas circunstâncias, deveria ter sido reconhecido ao Requerente.

- Com efeito, o Requerido encetou uma série de operações notariais e de registo predial com vista à apropriação (ilegítima e plena) desse imóvel, desvirtuou por completo a disposição testamentária, que não tem sido cumprida, para se apropriar de um bem que lhe não pertence e dos rendimentos provenientes desse bem; - O Requerente tomou conhecimento pessoal e direto de que os Requeridos procederam à extração de cortiça da Herdade …, mas não comunicaram tal facto à Cabeça-de-Casal, nem distribuíram a cortiça ou o produto da sua (eventual) venda aos herdeiros, nem a terão aplicado nas obras de caridade identificadas no Testamento, fazendo-o totalmente ao arrepio da vontade do Testador, dos demais herdeiros e ainda do verdadeiro legatário do usufruto do imóvel, o aqui Requerente; Assim o Requerente pede que: - se ordene a proibição de disposição, onerosa ou gratuita, do imóvel acima identificado e designado por “Herdade …”; - bem como a notificação dos Requeridos para se absterem, conjunta ou isoladamente, de praticar quaisquer atos suscetíveis de diminuir o valor das receitas da “Herdade …” e para informarem o Tribunal do local onde se encontra a cortiça ou, caso esta já tenha sido vendida, deverão os Requeridos ser notificados para entregar ao Tribunal o contrato de compra e venda e, simultaneamente, depositar à ordem do Tribunal o produto da venda, investindo-se o Requerente enquanto usufrutuário do imóvel, atenta a disposição testamentária, da guarda e administração da propriedade.

Os Requeridos, deduziram oposição.

Tendo invocado a exceção de caso julgado e a ilegitimidade ativa do Requerente. Impugnando ainda parte da factualidade alegada no requerimento inicial.

Assim, em suma, alegam que a providência surge na sequência de uma outra que o requerente intentou anteriormente e que correu termos no mesmo Tribunal Judicial de Évora sob o n.º…. Porquanto, sendo coincidentes os sujeitos, é pedido o reconhecimento do mesmo direito subjetivo, pois que, em ambas as providências, pretende-se a salvaguarda do direito do Requerente, enquanto pretenso “usufrutuário”, cujos efeitos sempre incluem a indisponibilidade jurídica e de facto do imóvel por parte dos Requeridos, o que constitui o pedido em ambas as providências. Naquela providência decidiu-se inequivocamente inexistir o referido direito de usufruto, pelo que também aqui, a pretensão carece de fundamento por se basear no mesmo direito “inexistente”.

E, invocam a litigância de má fé por parte do Requerente.

Porquanto, sendo este já conhecedor do entendimento do Tribunal sobre os efeitos da renúncia do usufruto relativamente à posição do Requerente, não se absteve de alegar esse mesmo pretenso direito, deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar.

O Requerente respondeu às exceções e ao incidente de litigância de má fé, pugnando pela sua improcedência.

Realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida sentença que: - Julgou improcedentes as exceções de ilegitimidade processual ativa e de caso julgado; - Julgou totalmente improcedente a providência cautelar, absolvendo-se os Requeridos do pedido; - Condenou o Requerente no pagamento da multa de 4 (quatro) unidades de conta e no pagamento aos Requeridos de indemnização no valor de 2.000,00 (dois mil euros), a título de litigância de má fé.

Inconformado com tal decisão veio o Requerente recorrer assim concluindo as suas alegações de recurso: A.

O Recorrente formulou o pedido de decretamento da providência cautelar não especificada, requerendo ao Tribunal que ordenasse: “- A proibição de disposição, onerosa ou gratuita, do imóvel acima identificado e designado por “Herdade …”; - A notificação dos Requeridos para se absterem, conjunta ou isoladamente, de praticar quaisquer atos suscetíveis de diminuir o valor das receitas da “Herdade …”; - A notificação dos Requeridos para informarem o Tribunal do local onde se encontra a cortiça; - Caso esta já tenha sido vendida, deverão os Requeridos ser notificados para entregar ao Tribunal o contrato de compra e venda e, simultaneamente, depositar à ordem do Tribunal o produto da venda; - A investidura do Requerente enquanto usufrutuário do imóvel, atenta a disposição testamentária, incumbindo-o da guarda e administração da propriedade com a maior diligência e zelo; - O decretamento da providência cautelar ora requerida sem exercício prévio do contraditório dos Requeridos, nos termos do n.º 1 do art. 366.º do CPC.” B.

Alegou, sem suma, que é o legítimo legatário de um direito de usufruto deixado por óbito do seu tio, P… (doravante, o “Autor da Herança”); C. Que com a abertura da sucessão e chamamento de herdeiros e legatários, os Recorridos, contrariando a vontade expressa do Autor da Herança, praticaram diversos atos que ofendem o direito de usufruto que, atentas as concretas circunstâncias, deveria ter sido reconhecido ao Recorrente; D.

Mas mais: com a recente extração de cortiça, ter-se-ão perdido os frutos da herança que tinham, por vontade do Testador, um destino concreto de cariz social.

E.

Na Oposição deduzida, vieram os Recorridos requerer a condenação do Recorrente em multa e indemnização por litigância de má-fé, pois, alegadamente: “Resulta de todo o exposto que não só o requerente não detém qualquer direito que legitime a sua pretensão, como, apesar de ser já conhecedor do entendimento deste Tribunal e do Tribunal da Relação sobre os efeitos da renúncia do usufruto relativamente à posição do Requerente, não se absteve este de alegar esse mesmo pretenso direito, deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não podia ignorar.” F.

Para além disso, fundaram o pedido de condenação por litigância de má-fé na circunstância de este ter “atribuindo a este procedimento cautelar o irreal valor de 686.024,73€, por forma a que o procedimento se transforme num oneroso encargo para os Requeridos” (esclareça-se, valor este que foi o atribuído à causa pelo Tribunal a quo!) G.

Em sede própria – através do Requerimento de 23 de agosto de 2021, com a ref. Citius 39678265 – o Recorrente teve oportunidade de deduzir a respetiva defesa, alegando que quem se encontrava de má-fé eram, sim, os Recorridos, pela forma ardilosa com que o Requerido, apressadamente, logrou obter para si a propriedade plena do imóvel – algo que manifestamente o Autor da Herança não quis.

H.

Ora, não obstante, o Tribunal a quo, por Sentença datada de 2 de dezembro de 2021, veio, não só considerar improcedente o procedimento cautelar, como condenar o Recorrente no pagamento da multa de 4 (quatro) unidades de conta por litigância de má-fé e a pagar aos Recorridos a indemnização no valor de €2.000,00 (dois mil euros), a título de litigância de má-fé.

I.

Decisão com a qual o Recorrente não se conforma e da qual recorre, nos termos do artigo 542.º, n.º 3, do C.P.C., por não poder subsistir na ordem jurídica, pelos motivos que ora se expõem.

J.

Esclareceu o Tribunal que: “ Tomando em consideração a factualidade dada como provada e a motivação em que ela assentou constante destes autos, verifica-se que o Requerente fundamentou a sua pretensão na titularidade de um direito cuja falta de fundamento jurídico já conhecia, por força do acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido no âmbito do procedimento cautelar n.º…onde se disse expressamente: “Uma coisa é a renúncia ao legado outra, bem diferente, é a renúncia ao usufruto já constituído (e que integrava o legado). Dito...

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