Acórdão nº 2784/20.0T8STB-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora: I Em 11-10-2020 P… deduziu oposição à execução comum para pagamento da quantia de €1.139.000,56 que …, Unipessoal, Lda.

lhe moveu com base em livranças, pedindo que a execução seja julgada improcedente.

Para tanto alegou, para o que importa e muito em síntese: Que os montantes a título de capital peticionados na presente execução não podem exceder os montantes reclamados a título de capital na insolvência da R...SA; que não foi respeitado o acordo entre a R...SA e a CGD, SA quanto aos fundos que aquela viesse a receber dos programas do Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN) e do Programa de Desenvolvimento Rural (PRODER), que seriam alocados ao pagamento do capital, juros e demais encargos do empréstimo, sendo que a R...S.A. recebeu a esse título € 451.022,32, que não foi alocado, o que prejudicou o avalista; não foi igualmente respeitado o acordo de 26-12-2013 no sentido de “impossibilitar novas utilizações a débito”, pelo que os movimentos a débito a partir dessa data, no montante global de € 524.625,92, não podem ser exigidos ao Executado; não são devidos os montantes peticionados a título de juros, comissões e imposto de selo.

A Exequente contestou, alegando em suma o seguinte: O Executado não desconhece nem podia desconhecer que, enquanto garante e avalista das operações da Sociedade R…, S.A., de que era Administrador, em caso de incumprimento dos contratos celebrados por falta de pagamento se constituíra na obrigação de pagamento dos valores que se viessem a apurar em dívida; O próprio pacto de preenchimento constante dos referidos contratos por si assinado atesta expressamente a existência de livranças em branco subscritas pela sociedade mutuária, tendo sido concedida ao Banco Mutuante, a Caixa Geral de Depósitos a sua autorização expressa para preencher as mesmas no que se refere às datas de emissão e de vencimento, local de pagamento e valor, o qual corresponderá aos créditos que o Banco seja titular por força do contrato em causa; Tendo sido, nessas mesmas circunstâncias e ao abrigo desse pacto de preenchimento, as livranças avalizadas pelo Executado, ora Embargante; A circunstância da data aposta no vencimento das livranças ser posterior à declaração de insolvência da sociedade R...S.A. não exclui a responsabilidade do executado, avalista pelo pagamento dos valores em dívida, uma vez que o preenchimento das livranças resultou tão somente do incumprimento das obrigações por si garantidas; A livrança não tem que ser preenchida, nomeadamente no que respeita à data do seu vencimento, na data da declaração de insolvência da empresa R…; No que se refere às comissões devidas que o embargante também contesta, é certo que o clausulado do contrato, estipula que existe isenção de comissões, no entanto essas comissões dizem respeito ao período de vigência do contrato pontualmente cumprido, ou seja trata-se de isenção de comissão de manutenção da conta de crédito; Coisa totalmente distinta são as comissões devidas em caso de mora que podem ser cobradas sobre o capital e juros comissões e outros encargos.

Em resposta e tendo em conta o teor da contestação, veio o Embargante pedir a condenação da Embargada como litigante de má-fé.

No despacho saneador foram julgadas improcedentes as exceções de prescrição e nulidade do pacto de preenchimento e ilegitimidade ativa, tendo sido fixado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

O Embargante veio reclamar do despacho saneador, alegando que os autos permitiam já, no momento, uma decisão parcial de mérito.

Por despacho de 23.03.2021, foi julgada procedente a reclamação, tendo sido decidido que não tendo sido alegada a interpelação do Embargado pelo Exequente, não eram devidos os juros peticionados, no montante de €60.343,24 relativamente à Livrança N.º 500467943022393285 e de €6.086,42 relativamente à Livrança N.º 500166773100652891, fixando-se a quantia exequenda em € 1.072.570,90.

Decidiu-se ainda que o valor de € 45.466,19 pedido a título de comissões não podia ser peticionado, uma vez que o mesmo já está incluído no valor da livrança de € 928.357,56, reduzindo-se a quantia exequenda para o montante de € 1.021.994,73.

Realizada a audiência de discussão e julgamento veio a ser proferida sentença que julgou parcialmente procedentes os embargos, reduzindo-se a quantia exequenda para o montante de € 100.475,65. (cem mil quatrocentos e setenta e cinco euros e sessenta e cinco cêntimos).

Julgando-se improcedente o pedido de condenação da Embargada como litigante de má-fé.

Inconformado com tal decisão veio o embargante recorrer concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso: 1.

O douto Tribunal a quo julgou apenas parcialmente procedentes os embargos deduzidos, reduzindo a quantia exequenda para € 100.475,65, condenando o Recorrente a pagar à Recorrida esse montante, e absolvendo esta última do pedido de condenação como litigante de má-fé.

  1. Apesar de se concordar com a maior parte do conteúdo da Sentença ora recorrida, salvo melhor opinião, esta devia ter julgado totalmente procedentes os embargos deduzidos e condenado a Recorrida como litigante de má-fé.

  2. O Recorrente foi administrador da sociedade R…, S.A. entre 30 de Março de 2010 e 11 de Janeiro de 2013.

  3. Durante esse período, a R...S.A. celebrou, com relevância para os presentes autos, dois contratos com a Caixa Geral de Depósitos.

  4. Um contrato de abertura de crédito em conta corrente (contrato n.º 0021.006334.192), outorgado a 4 de Novembro de 2011.

  5. E um contrato de abertura de crédito com aval (contrato n.º 0021.006335.591), outorgado a 11 de Janeiro de 2012.

  6. O contrato de abertura de crédito em conta corrente (contrato n.º 0021.006334.192) veio posteriormente a ser alterado a 26 de Dezembro de 2013, data na qual o Recorrente já não era administrador da R...S.A.

  7. Tendo a R...S.A. subscrito duas livranças em branco: livrança n.º 500467943022393285 em relação ao primeiro contrato e livrança n.º 500166773100652891 em relação ao segundo contrato.

  8. Entretanto, no dia 7 de Junho de 2017 a R...S.A. foi declarada insolvente no processo n.º … tendo a Caixa Geral de Depósitos reclamado créditos nesse processo, os quais foram reconhecidos.

  9. A Caixa Geral de Depósitos cedeu, a 4 de Outubro de 2018, os créditos detidos sobre a R...S.A. à Clooney Issuer Designated Activity Company que, posteriormente, a 29 de Abril de 2019, cedeu estes mesmos créditos à Recorrida, tendo esta ocupado o lugar de credora no processo de insolvência da R...S.A., que era anteriormente da Caixa Geral de Depósitos.

  10. Em sede de despacho saneador a quantia exequenda foi reduzida para € 928.357,56, em relação à livrança n.º 500467943022393285, e para € 93.637,17, em relação à livrança n.º 500166773100652891.

  11. Tendo a Recorrida recebido, no âmbito do processo de insolvência da sociedade R...S.A., o montante de € 835.661,23, em relação à livrança n.º 500467943022393285, e € 85.857,85, em relação à livrança n.º 500166773100652891, o Tribunal a quo entendeu que o Recorrente teria de pagar à Recorrida a diferença entre os referidos valores, que seriam de € 92.696,33, em relação à livrança n.º 500467943022393285, e de € 7.779,32, em relação à livrança n.º 500166773100652891.

  12. O Recorrente discorda desta decisão.

  13. A livrança n.º 500467943022393285 foi preenchida pelo montante de € 928.357,56.

  14. Sendo que, no processo de insolvência da R...S.A., a Caixa Geral de Depósitos viu o seu crédito relativo ao contrato n.º 0021.006334.192 ser reconhecido no montante reclamado de € 835.661,23, o qual se divide em € 728.496,68 a título de capital, € 45.466,19 a título de comissões, € 61.698,36, a título de juros, subdividindo-se este montante em € 59.157,16 a título de juros bancários e € 2.541,20 a título de juros de mora.

  15. Ficou provado que a Recorrida recebeu, no âmbito do referido processo de insolvência, a totalidade deste valor, através do mecanismo previsto no art. 783.º, n.º 1 do Código Civil.

  16. Ora, nos termos do disposto no art. 116.º do CIRE, “a declaração de insolvência implica o termo dos contratos de conta corrente em que o insolvente seja parte, com o encerramento das contas respetivas”, sendo certo que não se pode confundir o termo do contrato com o incumprimento do mesmo.

  17. Assim, à data do termo do contrato de conta corrente, o montante em dívida era de € 835.661,23, montante esse reclamado e reconhecido no âmbito da insolvência da R...S.A.

  18. A diferença entre os € 928.357,56 pelos quais foi preenchida a livrança e os € 835.661,23 reconhecidos na insolvência correspondem a juros de mora que não podiam ser exigidos ao devedor principal (a insolvente R...S.A.), porquanto a declaração de insolvência determinou o termo automático do contrato de conta corrente e não o incumprimento, não podendo, naturalmente, continuar a aumentar o valor das comissões ou dos juros bancários.

  19. Podendo apenas esses juros ser exigidos aos avalistas, como o Recorrente.

  20. No entanto, para esses juros serem devidos pelos avalistas, como bem decidiu o Tribunal a quo, estes tinham de ser interpelados para o pagamento, nos termos do art. 805.º, n.º 1 do Código Civil, o que, como ficou provado, não aconteceu, não tendo a Recorrida sequer alegado esse facto.

  21. Nem sequer a Recorrida peticionou no seu requerimento executivo o pagamento de juros vincendos.

  22. Fica, portanto, demonstrado que os € 92.696,33 não correspondem a comissões, como entendeu o Tribunal a quo, mas sim a juros de mora que, de acordo com a anterior decisão do mesmo Tribunal, não podiam ser exigidos ao Recorrente, porquanto não foi interpelado para o cumprimento.

  23. Ainda em relação ao contrato n.º 0021.006334.192, foi outorgado a 4 de Novembro de 2011 e alterado a 26 de Dezembro de 2013, o Recorrente alegou que da referida alteração contratual resultou a impossibilidade de novas utilizações a débito da conta corrente por parte da R...S.A., pelo que apenas poder-se-iam considerar os montantes creditados da conta corrente, e...

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