Acórdão nº 253/14.7TBEVR-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelCRISTINA DÁ MESQUITA
Data da Resolução26 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 253/14.7TBEVR-B.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1. (…), requerido na ação de atribuição da casa de morada de família deduzida por apenso à ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, que lhe foi movida por (…), interpôs recurso da sentença proferida pelo Juízo de Família e Menores de Évora, do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, o qual atribuiu à segunda o direito de habitação sobre a casa de morada de família sita na Rua (…), lote 1, fração A1, 1º-Dto., Bairro (…), em Évora, mediante concentração na sua pessoa da qualidade de arrendatária relativamente ao contrato de arrendamento celebrado em 24.09.2005. Na ação a requerente pediu ao tribunal que lhe atribuísse o direito a viver no imóvel que foi a casa de morada de família, com o consequente direito ao arrendamento da mesma, alegando para tal desiderato, e em síntese, que no âmbito da ação de divórcio foi homologado um acordo entre os cônjuges no sentido de a casa de morada de família ser atribuída ao cônjuge-marido até à realização da partilha dos bens comuns do casal mas que apesar de já terem sido realizadas as partilhas o requerido permanece na referida casa apesar de ter condições para arrendar outra casa porque vive sozinho e é pedreiro, ao passo que ela foi declarada insolvente, aufere um vencimento líquido mensal de € 798,75, paga uma renda de € 400,00 mensais e vive com o filho menor de ambos e com o seu pai, de 77 anos, o qual é doente e recebe uma pensão de reforma no montante de € 697,00; mais alegou que recebe do pai do filho € 80,00 mensais a título de alimentos para o filho menor e tem despesas domésticas na ordem dos € 122,77 mensais. Realizada a tentativa de conciliação prevista no artigo 990.º, n.º 2, do CPC, não foi possível obter acordo das partes; o requerido apresentou a sua contestação, alegando que é ele quem mais precisa da casa de morada de família, em face dos rendimentos que aufere, pois o seu vencimento é de € 600,00 mensais, paga de renda € 92,00, tem despesas com alimentação na ordem dos € 300,00 mensais, para além de outras despesas domésticas (água, luz, telefone) e paga uma pensão de alimentos ao filho menor no valor de € 90,00. O tribunal determinou a realização de relatórios sociais com vista ao apuramento das condições económicas e sociais dos ex-cônjuges e da eventual existência de alternativas habitacionais para cada um deles. Após a realização do julgamento, foi proferida a sentença objeto do presente recurso. I.2. O recorrente formula alegações que culminam com as seguintes conclusões: «32- Na apreciação da necessidade de cada um dos cônjuges, considera-se a situação patrimonial de cada um deles. In casu, a situação patrimonial do ex-cônjuge marido e a situação patrimonial do ex-cônjuge mulher revelam-se muito semelhantes, antes de o requerido ter sido despedido e de der declarado insolvente, o que terá implicado uma alteração substancial da esfera patrimonial do mesmo. 33 - Pode, com efeito, dizer-se, no que respeita à necessidade, que o Recorrente e a Recorrida se encontravam em circunstâncias muito semelhantes antes do despedimento daquele. Antes a diferença de valor entre o rendimento mensal auferido por cada um dos ex-cônjuges não era relevante para o efeito da atribuição da casa de morada da família, não permitindo, só por si, decidir sobre a respetiva atribuição a um ou a outro. 34 - De facto, ambos se deparam com grandes dificuldades para fazer face às suas necessidades de vida – designadamente as de natureza habitacional, mediante o arrendamento de imóvel para habitação segundo as rendas correntes – apenas com o rendimento que auferem, sendo por esse facto necessitarem da habitação social. 35 - Inclusive a circunstância de auferir um rendimento mensal um pouco inferior ao do ex-cônjuge mulher seria suscetível de consentir ao ex-cônjuge marido obter habitação social com mais facilidade do que àquele, como aliás até ocorreu, quando a Recorrida durante o período em que a habitação esteve/está atribuída ao Recorrente, tentou obter habitação social e foi-lhe negada, pelo facto de os seus rendimentos, juntos com o do seu pai, não o permitirem. 36 - Por outro lado, filho que ainda vive com a mãe é maior mas não estuda, nem trabalha. Pelo que, pese embora o pai ainda entregue ao filho uma quantia monetária mensal entre os 75 e os 90 euros, já não há o dever de acautelar a situação, pois o percurso natural da vida deste jovem, que não quis prosseguir os estudos, será enveredar pelo mercado de trabalho e ao continuar a viver com esta, será outro ordenado no agregado composto por 2 pessoas, o que irá inviabilizar de futuro o acesso à habitação social, como já aconteceu no passado. 37 - Assim, no caso de paridade da necessidade de cada um dos cônjuges – circunstâncias patrimoniais e económicas semelhantes – e, na ausência de filhos cujo interesse haja assim que proteger, deve atender-se a “outros fatores relevantes”, conforme o artigo 1105.º, n.º 2, do Código Civil. 38 - São atendíveis, a idade, a possibilidade de trabalho – estes fatores relevam ainda no âmbito da determinação da necessidade – e a (im)possibilidade de um dos cônjuges dispor de outra casa em que possa residir sem beneficiar da mera tolerância de terceiros. No caso sub judice, a Recorrida é sete anos mais nova do que o Recorrente e tem aptidão/possibilidade de trabalhar e não lhe são conhecidos problemas de saúde. 39- O Recorrente, por seu turno, está desempregado e tem problemas de saúde crónicos, sendo que desde há muito anos dorme ligado a uma máquina de oxigénio. 40 - No âmbito do artigo 1105.º, n.º 2, importam “outros fatores relevantes”. Deve também levar-se em consideração o comportamento pretérito de cada um dos cônjuges em relação ao outro, designadamente a conduta que se consubstanciou na causa da rutura definitiva do casamento, que constituiu o fundamento do divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges. Ainda que tivesse na altura o divórcio sido convolado em mútuo, o Requerido não esqueceu o motivo pelo qual este ocorreu. Ainda hoje o Recorrente lastima o facto que a Recorrida ter abandonado o lar para se juntar com outro homem com quem manteve uma relação extra-matrimonial, o que lhe causou grande mágoa e tristeza. Tal circunstancialismo é subsumível à violação do dever de respeito. 41 - Concluindo-se, por isso, que a Recorrida se encontra em menor premente necessidade da casa de morada de família do que o Recorrente, quer em termos da sua situação patrimonial, quer das demais circunstâncias que deveriam ter sido equacionadas pelo Tribunal a quo e que devem agora ser ponderadas por Tribunal da Relação, pelo que se impõe revogar a decisão proferida em 1ª instância. 42 - Face às apontadas insuficiências da matéria de facto e de direito apuradas para que a ação intentada pudesse ter provimento e fosse favorável à Recorrida e, bem assim, ao carácter conclusivo dos...

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