Acórdão nº 869/19.5T8TMR.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelEMÍLIA RAMOS COSTA
Data da Resolução12 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:[1] I – Relatório C.S.

(Autor) intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “Álvaro Matias e Filho, Lda.” (Ré), pedindo que a presente ação seja julgada provada e procedente, declarando-se a justa causa do Autor na rescisão do contrato e condenando-se a Ré a pagar-lhe a quantia de €74.450,08, acrescida dos juros moratórios sobre o capital de €62.973,62 à taxa legal, a contar desde 01-06-2019 e até integral pagamento.

Em síntese, alegou que a Ré se dedica ao transporte público rodoviário de mercadorias, tendo o Autor sido admitido ao seu serviço em 01-07-2001, como motorista, desempenhando as funções de motorista dos transportes internacionais rodoviários de mercadorias pelos vários países da Europa, trabalhando sob as ordens, direção e fiscalização da Ré, sendo que, a esta relação laboral e até Setembro de 2018, se aplicou o CCT convencionado entre a Antram e a Festru, publicado no BTE, 1.ª série n.º 9, de 08-03-1980.

Mais alegou que a Ré não pagou ao Autor as refeições à fatura, conforme consta da cláusula 47-A, al. a) do mencionado CCTV, sendo que, em vez disso, lhe pagava mensalmente um montante variável em função das viagens, que levava aos recibos na rúbrica “Ajudas de Custo” no Código “106” nos primeiros anos e depois no “008” acrescentando a Ajuda de Custo “N/E”.

Alegou ainda que o Autor, como motorista Tir, passava nas viagens ao estrangeiro, em cada mês, pelo menos 22 dias, pois nunca ficavam parados em Portugal mais de 8 dias por mês, sendo que o horário de trabalho do Autor era de 40 horas semanais, 8 horas por dia útil de 2.ª à 6.ª feira, constituindo os sábados e os domingos dias de descanso, respetivamente, complementar e obrigatório.

Alegou, de igual modo, que, em carta registada, datada de 28-02-2019, o Autor rescindiu o contrato com efeitos imediatos, com o fundamento de não lhe serem pagas as quantias legalmente devidas e relativas às duas horas extraordinárias diárias (nos termos do art. 74.º, n.º 7, do CCT); por não lhe serem pagas as diuturnidades a que tinha direito; por não lhe serem pagos os subsídios de férias acrescidos do montante do Prémio TIR e da cláusula 74.º, n.º 7 do CCT; e por não lhe serem pagos os sábados, domingos e feriados passados nas viagens com o acréscimo de 200%; sendo que tais comportamentos da Ré, dada a gravidade, reiteração e consequências, o impediam de continuar a trabalhar para esta.

Alegou também que, dado o fim do contrato, vem reclamar a título de créditos laborais, desde o ano de 2001 e até fevereiro de 2019, nos termos da cláusula 74.º, n.º 7, do CCT, do subsídio de férias e de natal e da indemnização pela rescisão do contrato com invocação de justa causa, o montante global €51.498,91, acrescido de juros de mora, já vencidos no montante de €11.476,66 e vincendos até integral pagamento.

Alegou, por fim, que entre junho de 2014 e fevereiro de 2019, a Ré não lhe pagou pelos dias de descanso trabalhados o montante total de €11.474,71.

…Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver por acordo o litígio.

…A Ré “Álvaro Matias e Filho, Lda.” apresentou contestação, solicitando, a final, que: a) a Ré fosse absolvida do pedido com exceção das retribuições em dívidas confessadas; b) fosse decidida como válida a estrutura remuneratória praticada pela Ré, por ter sido acordada e ser mais vantajosa para o trabalhador, absolvendo a entidade patronal dos pedidos; c) se julgasse a reconvenção procedente por provado e o Autor fosse condenado a pagar à Ré a quantia de €2.713,00, acrescida do valor dos prejuízos que se computam em €2.500,00, ou no valor a liquidar em execução de sentença; d) na hipótese de vir a ser declarada nula a estrutura remuneratória praticada pela Ré, se julgasse, procedente por provada, a reconvenção na parte da compensação, sendo a Ré condenada a pagar ao Autor as quantias pelos montantes previstos na CCT que o Autor provasse ter direito, compensando-se dos montantes já pagos de salário base e prémio tir acima da CCTV, em liquidação de execução de sentença; e) Se, por hipótese, vier a ser declarada nula a estrutura remuneratória praticada pela Ré, julgar-se procedente por provada a reconvenção na parte da compensação e, ser a Ré condenada a pagar ao Autor as quantias pelos montantes previstos na CCT que o Autor provar ter direito, compensando-se dos montantes já pagos de ajudas de custo no montante total de €41.429,12, abatendo o valor das refeições, compensar, pelo menos, o valor de €9.329,12, recebido a mais de ajudas de custo, aos valores que a Ré for condenada a pagar ao Autor, restituindo o remanescente, se existir - sob pena de enriquecimento à custa da Ré; f) Acrescida dos juros à taxa legal desde a citação e até integral pagamento.

Em síntese, alegou que, se é verdade que o Autor rescindiu o contrato de trabalho com efeitos imediatos, não é verdade que assistisse justa causa para a rescisão, aliás, o Autor nunca reclamou do valor acordado, do sistema de pagamento efetuado ou do trabalho realizado, sendo que o sistema de pagamento praticado pela Ré sempre foi mais favorável que o previsto no CCTV.

Alegou também que, em novembro de 2008, o Autor veio vazio de Barcelona, sem autorização, o que causou um prejuízo de €1.000,00 + IVA, à Ré, que aquele se comprometeu a pagar.

Alegou ainda que o Autor, de um dia para o outro, apresentou a carta de rescisão, levando a Ré a perder um cliente e a entregar o camião ao leasing, tendo ficado com uma dívida de cerca de €30.000,00 ao Montepio, visto que a Ré, quando comprou a viatura, foi sempre na expetativa de dar trabalho ao Autor e rentabilizar a viatura.

Enfatizou, igualmente, que não se verificando os elementos objetivos e subjetivos para a rescisão com justa causa do contrato de trabalho, o Autor não tem direito à indemnização peticionada e constituiu-se na obrigação de indemnizar a Ré pelo período do aviso prévio, em 60 dias, e no pagamento dos prejuízos que a sua conduta causou.

Relativamente às diferenças salariais, a Ré afirmou nada dever ao Autor, com exceção das férias e subsídio de férias vencidos em 01-01-2019, pois relativamente a tudo o resto sempre pagou mais do que aquilo que o Autor tinha legalmente direito, quer quanto à retribuição base quer quanto ao prémio TIR.

Mais invocou que se o Autor não pretendia receber de acordo com o acordado na empresa, então o sistema de pagamento é nulo, se não for mais favorável e o Autor tem de devolver tudo o que recebeu e a Ré tem de lhe pagar tudo de acordo com o CCT, sendo que a CCT é um todo, pelo que ou se aplica a CCT num todo ou se aplica o sistema de pagamento da empresa, não sendo possível escolher as parcelas que mais convêm ao Autor, por exemplo, o salário base da empresa porque é mais alto e a CCT noutras, pelo que o Autor tem de fazer as contas todas com os valores da tabela salarial da CCT, sob pena de abuso de direito e de litigar de má-fé, tendo de devolver/abater (compensar) o montante que recebeu a mais.

Alegou ainda que o Autor, quanto às despesas da refeição, não recebia à fatura, mas à viagem, sendo que o seu horário era móvel e não o indicado na petição inicial, e porque recebia mais do que aquilo que estava convencionado, tem de devolver à Ré o que recebeu a mais, sob pena de enriquecimento ilegítimo à custa da Ré ou, no limite, abater nas diferenças que provar ter direito a receber, visto que aquilo que recebeu a mais nas ajudas de custo no sistema de pagamento acordado dava para pagar o trabalho que efetuava em sábados, domingos e feriados, diferenças de cláusulas e diuturnidades e ainda sobrava dinheiro.

Em sede de pedido reconvencional, a Ré reclamou do Autor a quantia de €1.483,00, por falta de aviso prévio; a quantia de €14.400,00 pelos prejuízos que sofreu por falta de tal aviso prévio; e a quantia de €1.230,00, pelo facto de o Autor ter vindo vazio de Barcelona, sendo €1.000,00 de prejuízo e o restante de IVA.

Por fim, e quanto aos juros, invocou que os mesmos apenas podem ser devidos desde a citação, sendo que os vencidos há mais de 5 anos se encontram prescritos, nos termos do art. 310.º, al. d), do Código Civil.

…O Autor, em resposta, e em síntese, impugnou os factos invocados...

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