Acórdão nº 2784/21.3T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO SOUSA E FARO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

I. RELATÓRIO 1. AA intentou contra BB acção com processo especial de atribuição da casa da morada da família.

Alegou, para o efeito e em síntese que, viveu em união de facto com o réu desde .../.../2005 até .../.../2021. Durante o relacionamento tiveram dois filhos, nascidos em .../.../2006 e .../.../2015 e a autora subscreveu um contrato de arrendamento apoiado para habitação com o Município .... A autora devido a violência doméstica viu-se obrigada a sair de casa, estando a residir em casa de um amigo, auferindo um vencimento no valor do ordenado mínimo nacional.

Requereu que seja reconhecida a cessação da união de facto e lhe seja atribuída a utilização da casa de morada de família.

O Réu deduziu oposição, alegando que a Autora saiu de casa por sua iniciativa e de livre vontade, sendo falso que o Réu lhe tenha infligido quaisquer agressões, sendo que ambos são arguidos no processo de violência doméstica a que alude a autora, o qual se encontra na fase de suspensão provisória do processo. Mais referiu que esta é a terceira vez que a autora sai de casa, ficando o Réu sozinho a cuidar dos filhos, e é uma pessoa doente, estando desempregado e a viver do subsidio de desemprego no valor de € 438,00.

Realizada audiência final veio, subsequentemente, a ser proferida sentença que julgou a acção procedente, por provada, e em consequência, decidiu: “

  1. Julgar procedente o pedido de dissolução da união de facto entre a Autora AA e o Réu BB, declarando-se dissolvida tal união de facto; b) Julgar procedente o pedido de atribuição da casa de morada de família sita na Avenida ..., ..., à Autora.”.

    1. É desta sentença que recorre o Réu, formulando na sua apelação as seguintes conclusões: A. No âmbito dos presentes autos foi proferida, em primeira instância sentença que julgou procedente o pedido de atribuição da casa de morada de família à Autora”, por entender que A. tem mais necessidade de residir na casa de morada de família do que o R..

      1. A Sentença a quo baseou-se nas conclusões de que A R. é titular do arrendamento e saiu de casa devido ao ambiente de discussões e agressões para se proteger a ela e aos filhos e de que Réu tem mais capacidade económica que a Autora.

      2. O A. não se pode conformar com a motivação e conclusão do tribunal da primeira instância.

      3. Resulta provado dos autos, para além da ocorrência da discussão que deu origem à saída de casa por parte da A., que foi a A, que originou e provocou essa mesma discussão.

      4. A A. confessa-o na petição inicial ao reconhecer que foi a própria que se dirigiu ao Requerido em tom provocatório (artigo 3.º da petição inicial), iniciando uma discussão, sendo que, conforme reconhece a Requerente “O Requerido nada disse”, F. O que é confirmado seguinte pelo depoimento do filho de A. e R., CC, gravado na Audiência de Julgamento do dia 28 de Abril de 2022 a partir do minuto 3.22 da gravação do referido depoimento: Juiz: Assistiu a alguma coisa (…) Quando a discussão começou estava lá? Estava mesmo lá? Não estava no seu quarto? Testemunha: Estava lá mas depois fui para o meu quarto.

        Juiz:…e depois foi para o seu quarto. Então estava quando se iniciou? Testemunha: Sim.

        Juiz: O que é que aconteceu? Tente lá…se é que se consegue lembrar…quem começou, se a agressão foi apenas palavras, se passaram para alguma agressão física… Testemunha: Quem começou foi a minha mãe. Foi a minha mãe que começou….depois o meu pai continuou.

      5. Pelo que não basta dar apenas como provado do que naquele dia ocorreu uma discussão, como faz a sentença a quo; é necessário considerar provado que foi a A. a provocar a discussão, facto que a sentença a quo omite e que é de extrema relevância na medida em que a criação da discussão em causa terá sido apenas um pretexto para a A. sair de casa – como já havia feito anteriormente por mais de uma vez.

      6. Do número 3. dos factos provados, deveria constar a seguinte redacção: “Em 9 de julho de 2021, na casa de morada de família, sita na Avenida ..., ... ... ocorreu uma discussão entre A. e R., iniciada pela A., que culminou em agressões mútuas”.

        I. Dos factos considerados não provados, Recorrente não se pode conformar com a conclusão da sentença a quo, que entendeu não provada a alegação de que “A Requerente saiu de casa, por sua iniciativa, de livre vontade” – Facto não provado n.º5.

      7. Tal decisão foi unicamente tomada com base no testemunho do filho do casal que a sentença decide dar como não provado que a A. saiu de casa de livre vontade: A A. “saiu de casa devido ao ambiente de discussões e agressões para se proteger a ela e aos filhos”.

      8. Acontece que nesse mesmo depoimento, o filho do casal declara, para além de que foi a mãe que começou a discussão, que o pai nunca foi violento e que nunca acreditaria que o pai agredisse a mãe, considerando inclusivamente mais plausível que fosse a mãe a agredir o pai.

        L. Existe, portanto, uma clara contradição e confusão no depoimento da testemunha – completamente compreensíveis, diga-se, face à posição de fragilidade emocional em que um depoimento deste tipo pode deixar o filho do casal - que não pode deixar de ser tida em conta.

      9. Mas, não entende o Recorrente como é que a conclusão clara que a sentença a quo retira deste depoimento é que a saída de casa por parte da Autora não foi de livre vontade, quando se provou que foi a A. criou uma discussão com o R., como muitas vezes já tinha acontecido, e decidiu sair de casa, como já tinha acontecido por mais duas vezes no passado, tendo saído e regressado por livre e espontânea vontade.

      10. Deveria também a sentença a quo dar como provado, ao contrário do que fez, o facto que “Foi o Requerido que tratou do processo junto da Câmara Municipal ... – a casa de morada de família, que é de habitação social, foi atribuída ao agregado familiar, as próprias chaves foram entregues ao Requerido” – Facto não provado n.º 8.

      11. Este é um facto que não foi objecto de impugnação nem, de qualquer forma, contraditado, em parte alguma, pela A. e, se a A. não replica/impugna os factos em excepção, têm-se por confessados esses mesmos factos.

      12. A sentença considera ainda não provado o facto n.º 10: “O Requerido ficou, sozinho, a cuidar dos dois filhos menores do casal, na casa de morada de família.” Q. Para além de este facto nunca ter sido contraditado pela A., o que se verifica é que se a A. saiu de casa, parece claro que o R. ficou, efectivamente, sozinho, a cuidar dos dois filhos menores do casal, na casa de morada de família.

      13. Ainda como não provado foi dado o facto de o Recorrente ser doente crónico, insulinodependente, que precisa de fazer diariamente os seus tratamentos – facto não provado n.º 11, facto, que...

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