Acórdão nº 619/22.9T8SLV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Dezembro de 2022

Data15 Dezembro 2022

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I.

No processo de recurso de contraordenação n.º 619/22.9T8SLV do Juízo de Competência Genérica de Silves, Comarca de Faro, foi proferida sentença que, apreciando impugnação judicial da decisão administrativa proferida pela Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna em 2 de Fevereiro de 2022, na qual D..., Lda., foi condenada pela prática de 1 (uma) contraordenação grave, prevista e punida pelos artigos 8.º n.º 7 e 59.º, n.ºs 2, al. b), 4, al. b) e 8 da Lei n.º 34/13, de 16 de maio e na al. c) do parágrafo 3.1., do n.º 3 do anexo I da Portaria n.º 273/2013, de 20 de Agosto na coima no montante de €7.500,00, decidiu julgar aquele recurso de impugnação judicial parcialmente procedente e, em consequência, mantendo a condenação aplicada à recorrente, aplicou, todavia e em substituição da coima anteriormente aplicada no montante de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros), a sanção de admoestação, Inconformado com esta decisão, veio o M.º P.º interpor recurso da mesma, invocando, como QUESTÃO PRÉVIA, fazê-lo ao abrigo dos art.ºs 73º n.º 2 e 74º n,º 1 a 4 do RGCO pois a jurisprudência está longe de se encontrar uniformizada, relativamente à questão em análise (da admissibilidade ou não da admoestação no caso de contraordenações classificadas como graves ou muito graves) e quanto à formalidade (escrita ou oral) da admoestação e, quanto ao recurso da decisão propriamente dito, com os fundamentos constantes da respectiva motivação que aqui se dá por reproduzida e as seguintes conclusões: “1. O Ministério Público não concorda com a substituição da coima aplicada à Recorrente pela sanção de admoestação, por duas linhas de razão: a. inadmissibilidade da aplicação da admoestação em contra-ordenação considerada como grave; b. formalidade da aplicação da admoestação (escrita).

  1. Foi a Recorrente condenada por uma contra-ordenação que a própria formulação legal do preceito tipificador da conduta, classifica como grave (art.º 8º nº 7 e 59º nº 2 al. b), 4º al. b) e 8 da Lei nº 34/13 de 16 de Maio e na al. c) do parágrafo 3.1 do nº 3 do anexo I da Portaria nº 273/2013 de 20 de Agosto).

  2. Esta classificação legal da contra-ordenação em causa afasta desde logo a possibilidade da aplicação da medida de admoestação, prevista no artigo 51º, do Regime Geral das Contra-Ordenações, pois que objectiva e expressamente, trata-se de uma contra-ordenação com gravidade. (neste sentido, entre outros o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 08-03-2018; Processo nº 2551/17.9T8ENT.E1; Relator, Dr. Gomes de Sousa, disponível em www.dgsi.pt; Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça nº 6/2018, publicado no D.R nº 219/2018, Série I de 14 de Novembro de 2018; o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17 de Setembro de 2014, Processo nº 656/13.4TBPNF.P2; Relator Dra. Elsa Paixão; disponível em www.dgsi.pt”.

  3. No fundo, a admoestação trata-se de uma alternativa para os casos de pouca relevância do ilícito criminal e da culpa do agente, isto é, para contraordenações leves ou simples, ou seja, quando quer a gravidade do ilícito quer a culpa sejam reduzidos (cfr: PAULO PINTO de ALBUQUERQUE, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações, p. 222 e ss. e SIMAS SANTOS e LOPES DE SOUSA, Contra- Ordenações, Anotações ao Regime Geral, 2011, p. 394).

  4. Entendeu o tribunal a quo que: “(…) em nosso entendimento, que, não obstante a integração dum tipo legal de ilícito contra-ordenacional definido em abstracto como sendo grave, as circunstâncias do caso concreto podem apontar em concreto para uma diminuta ilicitude e gravidade. (…).

  5. Na verdade, para a aplicação da admoestação terão de verificar-se no caso concreto, dois requisitos legais, a pouca relevância do ilícito e a diminuta culpa do agente, cumulativamente e não em alternativa um do outro. E, se neste caso concreto, resultaram provados factos relevantes relativos à menor culpa do arguido/recorrente, como sejam actuação ser qualificada como negligente, a ausência de antecedentes contra-ordenacionais, contudo, foi a Recorrente condenada por uma contra-ordenação que a própria formulação legal do preceito tipificador da conduta, classifica como grave.

  6. Ora, por si só, esta classificação legal da contra-ordenação em causa afasta desde logo a possibilidade da aplicação da medida de admoestação, prevista no artigo 51º, do Regime Geral das Contra-Ordenações, pois que objectiva e expressamente, trata-se de uma contra-ordenação com gravidade.

  7. Sempre se dirá que a circunstância de o tribunal a quo ter considerado a conduta negligente isso apenas faz cair a culpa de “muito grave” para “menos grave”, mas não é considerada por si só diminuta ou reduzida.

  8. Ora, no caso em apreço, preenchidos que se encontram os elementos objectivos e subjectivos do tipo e uma vez que estamos perante uma contra-ordenação tipificada como grave, inadmissível será de aplicar a sanção de admoestação, pelo que deverá ser revogada a decisão de substituição que ora se recorre, e substituída por outra que mantenha a decisão anteriormente proferida pela autoridade administrativa.

  9. Pelo exposto, violou o tribunal a quo o art.º 51º nº 1 do RGCO e (art.º 8º nº 7 e 59º nº 2 al. b), 4º al. b) e 8 da Lei nº 34/13 de 16 de Maio e na al. c) do parágrafo 3.1 do nº 3 do anexo I da Portaria nº 273/2013 de 20 de Agosto).

  10. Ademais, sempre se dirá que, mesmo que se considerasse a admissibilidade da aplicação da sanção de admoestação no caso em apreço, a mesma deveria ser proferida oralmente e não por escrito.

  11. De facto, resulta do artº 51º, nº 2 do RGCO que: “A admoestação é proferida por escrito (…)”, porém, tal só ocorre quando a admoestação é aplicada pela autoridade administrativa, uma vez que, quando a admoestação ocorre em fase judicial, se aplicará, a nosso ver, o disposto no artº 60º, nº 4 do C.P., por via do disposto no artº 32º da RGCO. Neste sentido, vd. Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, in Contra-Ordenações – Anotações ao Regime Geral, 2002, pp. 316 e 317, em anotação ao referido artº 51º.

  12. A decisão proferida por escrito é nula por vício de forma, devendo ser substituída por outra que preveja o cumprimento cabal da admoestação (censura solene oral).

  13. Pelo exposto, o tribunal a quo violou as seguintes disposições legais: 60º, nº 2 do CP, 32º do RGCO e 497 º do CPP.” Termina no sentido de a sentença do tribunal ser revogada.

    A este recurso veio responder a arguida pessoa colectiva, concluindo nessa resposta: “1 – À recorrente não assiste qualquer razão quer de facto quer de direito; 2 – Pelo Tribunal “a quo” foi feita uma correcta apreciação dos factos e uma digna aplicação do Direito; 3 – A gravidade da contra-ordenação afere-se pelo grau de ilicitude, bem assim como às consequências ou inexistência delas considerando os factos em causa.

    4 – Está provado que:

    1. No dia 5 de Dezembro de 2018, no Posto de Combustível Intermarché, sito na Rua ..., em ..., propriedade da Recorrente, encontrava-se em funcionamento o sistema de videovigilância, não estando o horário sincronizado com a hora legal e real, marcando no respectivo monitor 12:25h, quando eram 11:01.

    2. A recorrente, enquanto proprietária do estabelecimento referido no ponto n.º 1, era conhecedora da obrigatoriedade da sincronização dos servidores do sistema de videovigilância, referido no mesmo facto, com a hora legal portuguesa, pelo que ao não promover por tal sincronização, i.e., não se certificando que o horário do referido sistema de videovigilância estava sincronizado com a hora legal e real, sem ter representado tal possibilidade, não agiu com o cuidado e diligência a que se encontrava obrigada, que lhe era exigível e de que era capaz.

    3. A recorrente agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei contraordenacional.

    5 – Considerou o Tribunal que a medida da coima fixada pela entidade administrativa se tem como adequada às circunstâncias do caso concreto, se atendermos ao desfasamento do horário marcado no sistema de videovigilância [12h25m] e a hora legal e real [11h01m] e que não se apurou qualquer ao benefício económico ilegítimo por si retirado com prática da contraordenação em causa nos autos.

    6 – Atendeu à gravidade da infração, não se tendo apurado que, no caso concreto, a prática da contraordenação imputada à ora recorrida causou quaisquer danos patrimoniais ou não patrimoniais a terceiros ou os prejudicou de qualquer forma e ainda à sua culpa, que se afigura como negligente, na forma inconsciente; 7 - O Tribunal “a quo” aplicou uma admoestação e no...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT