Acórdão nº 1526/20.5T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO AA instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB (o mesmo que …), CC e FF, pedindo que os réus sejam condenados: «a) a reconhecer que a A tem direito, nas mesmas condições deles próprios, a obter o produto líquido da venda da cortiça produzida e a extrair na “HERDADE”, na percentagem de 25%, nas tiradas de cortiça de 2020 a 2025, ou nos anos alternativos em que se proceda a essas tiragens no novénio de criação em curso.

  1. a pagar à A o produto líquido da venda da mesma cortiça, na percentagem de 25%, a liquidar em execução de sentença».

Alega, em síntese: - Autora e réus foram comproprietários, cada um na proporção de ¼, do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...8, sendo a exploração agrícola do mesmo feita pela Sociedade A..., Lda., desde pelo menos 31.05.1990 até 08.06.2020, exceto a cortiça, cujo produto da venda que, a partir de 2004, pertenceu à autora e a cada um dos réus, na proporção de 1/4 para cada um.

- A autora intentou contra os restantes comproprietários, aqui réus, uma ação de divisão de coisa comum, na qual foi proferida sentença em 30.01.2019, transitada em julgado em 16.03.2019, que julgou procedente a ação, do que resultaram 4 prédios distintos, designados por Lote 1, Lote 2, Lote 3 e Lote 4, compostos, no que à parte rústica diz respeito, respetivamente, pelas áreas de 131, 140, 164 e 145 hectares, tendo o Lote 1 sido adjudicado ao réu BB, o Lote 2 à autora, o Lote 3 à ré CC e o Lote 4 ao réu FF.

- O prédio tem montado de sobro, espalhado por toda a sua área, em várias cercas, denominadas “Poço do Cão”, “Gramicha”, Ferranha”, “Velada”, “Pereiro”, “Cabaços”, “Quinta” e “Pomar”, e a extração da cortiça segue uma programação, repartindo-se por 6 anos dentro do ciclo normal de produção, que é de 9 anos. No ciclo atual, a extração de cortiça tem lugar, segundo a programação estabelecida, nos anos de 2020, 2021, 2022, 2023, 2024 e 2025. A última tirada foi em 2016, correspondendo-lho, no novénio seguinte, à que irá ser tirada em 2025 e, deste modo, sucessivamente: à de 2020 corresponderá a que foi tirada em 2011; à de 2021, a de 2012, à de 2022 a de 2013, à de 2023 a de 2014 e à de 2024 a de 2015; - Autora a réus acordaram que o lucro da venda da cortiça a extrair em 2020, 2021, 2022, 2023, 2024 e 2025 seria de todo eles, em igual percentagem de 25%, para cada um, direito que os réus vieram, agora, negar à autora, reservando-o apenas para eles próprios, sendo que o valor da cortiça não foi considerado na valorização dos Lotes em que se dividiu o prédio (“Herdade”).

Os réus contestaram, impugnando parte da factualidade alegada pela autora, designadamente a celebração de qualquer acordo com vista à divisão do lucro da cortiça extraída da totalidade do prédio e a desconsideração do valor de tal cortiça na formação e valorização dos lotes aquando da prolação da sentença de divisão de coisa comum, oportunamente transitada em julgado.

Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu os réus do pedido.

Inconformada, a autora apelou do assim decidido, tendo finalizado a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem: «1. A questão para que a recorrente pediu a tutela jurisdicional nesta acção foi a de que se reconhecesse a existência entre ela e os recorridos de um entendimento na repartição entre eles, na percentagem de 25% para cada um, do valor líquido da cortiça em criação na data da sentença proferida na acção de divisão de coisa comum referida nos autos que corria entre eles referente à Herdade ... de que eram comproprietários.

  1. Esse entendimento resulta com evidência de factos e circunstâncias invocados pela recorrente ocorridos na fase anterior à propositura da acção referida no anterior n.º 1, e também no decurso dessa mesma acção.

  2. O objecto da presente acção, com a recorrente o definiu, foi assim entendido e impugnado pelos recorridos na contestação.

  3. A douta sentença proferida decidiu pedido diverso do formulado, decidindo sobre o mencionado “acordo”, no sentido que lhe é dado pela recorrente, mas relativamente ao período posterior à sentença proferida na acção de divisão de coisa comum, cometendo a nulidade prevista no art.º 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, por violação do dever imposto pelo art.º 608.º, n.º 2 do mesmo diploma.

  4. Caso se entenda não ter sido cometida a invocada nulidade, invoca-se o erro de julgamento, com a mesma fundamentação.

  5. A recorrente não pôs em causa na acção a constituição dos lotes e a sua configuração, entendeu, sim, que o valor da cortiça em criação não foi tida em conta na respectiva constituição, tendo tratamento à parte, destinado a ser repartido igualitariamente entre os, então, comproprietários.

  6. Sem o valor da cortiça em criação a ser repartido igualitariamente, o lote da recorrente não poderia ser o mesmo, sob pena de ficar injustamente empobrecida, com o correspondente enriquecimento indevido dos recorridos.

  7. Em consequência da errada definição do objecto do processo não foram tidas em conta na decisão impugnada, como relevantes para a decisão da causa, elementos factuais constantes de documentos autênticos não impugnados, não sendo, também, permitida a produção de prova testemunhal tendente a demostrar o entendimento entre a recorrente e os recorridos quanto à distribuição entre eles do valor líquido da cortiça no período em causa.

  8. Mesmo na ausência de tal entendimento, a sentença recorrida deveria ter considerado como fonte de obrigação de dare dos recorridos à recorrente, como eles próprios disseram, o valor promocional da cortiça extraída e a extrair no período em causa correspondente ao tempo de criação na situação de compropriedade da recorrente na Herdade ....» Os réus contra-alegaram, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

    Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões a decidir, considerando a sua precedência lógica, consubstanciam-se em saber: - se a sentença enferma da nulidade invocada pela recorrente; - se ocorreu erro de julgamento, designadamente, por se ter desconsiderado na sentença a causa pedir invocada pela autora.

    III – FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: 1. Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ..., ...25 e inscrito nas matrizes prediais com os n.ºs ...0, ..., secção E-..., da freguesia ..., concelho ..., o prédio misto denominado “Herdade ...”, com a área de 579,9000 hectares.

  9. Correu termos no Juízo Local Cível – J 1 – do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, o Processo n.º 2311/07.5TBEVR tendo por objeto a divisão do prédio misto identificado em 1., no qual era requerente AA e requeridos DD, EE e FF, tendo sido proferida sentença em 30.01.2019, transitada em julgado em 06.03.2019, não tendo da mesma sido interposto recurso, na qual se decidiu: Pelo exposto, em conformidade com as disposições legais supra citadas: 1. Declaro a divisibilidade do prédio misto denominado “Herdade ...”, com a...

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