Acórdão nº 278/14.2GBVNO.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelSÉRGIO CORVACHO
Data da Resolução18 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

I - Em processo penal, a possibilidade da alteração da sentença resume-se aos casos previstos no n.º 1 do art. 380º do CPP, os quais têm a ver com a correcção de erros ou lapsos materiais, obscuridades ou ambiguidades, cuja eliminação não importe modificação essencial do decidido, e com o suprimento da falta no texto da decisão das menções prescritas pelo art. 374º, fora das situações prefiguradas no art. 379.º (que são geradoras de nulidade).

II - Nesta conformidade, o juízo probatório emitido pelo Tribunal da Relação, do qual o assistente discorda, não pode ser, em si mesmo, objecto de nova discussão, no âmbito da apreciação de um requerimento de arguição de nulidade da decisão, por graves que possam ser as patologias de que o mesmo, no entender do requerente, possa enfermar.

III - A partir do momento em que o Tribunal julgou não provados factos relativos a condutas objectivas dos arguidos, que foram impugnados por estes no âmbito do recurso, o juízo probatório negativo emitido terá de afectar, por simples implicação lógica, factos que se encontram numa relação de dependência para com aqueles que foram declarados não provados, mesmo que não tenham sido objecto de impugnação, nomeadamente os factos que integram a vertente subjectiva de determinada conduta objectiva, dada como não provada.

IV - Nesta perspectiva, o objecto do juízo probatório emitido no acórdão da Relação não excede ilegitimamente o do pedido formulado no recurso interposto da sentença, em matéria factual, pelo que não se encontra inquinado de excesso de pronúncia.

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I. Relatório No Processo Comum nº 278/14.2GBVNO, que correu termos no Juízo Local Criminal de Ourém do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, foi proferida, em 13/7/2017, sentença, com seguinte segmento decisório (excepto matéria de custas): Pelo exposto, julgo a acusação procedente por provada e, em consequência: a) Condeno o arguido EE pela prática de 1 crime de ameaça agravada, p. e p. pelo artigo 153.º, n.º 1, e 155.º, n.º 1, alínea a) do C.P., na pena de 120 dias de multa à taxa diária de 10,00€, no valor de 1.200,00€; b) Condeno o arguido pela prática de um crime de sequestro, p. e p. pelo artigo 158.º, n.º 1, do C.P., na pena de 200 dias de multa à taxa diária de 10,00€, no valor de 2.000,00€; c) Condeno-o ainda, pela prática de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 145.º, n.º 1, alínea a), na pena de 1 ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; d) Condeno o arguido em cúmulo jurídico, na pena única de 245 dias de multa, à taxa diária de 10,00€, no valor de 2.450,00€ e de um ano e seis meses de prisão suspensa na sua execução por igual período.

e) Condeno o arguido PM pela prática de um crime de sequestro, p. e p. pelo artigo 158.º, n.º 1, do C.P., na pena de 230 dias de multa à taxa diária de 8,00€, no valor de 1.840,00€; f) Condeno-o ainda, pela prática de um crime de ofensa à integridade física 1 ano e 4 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período; g) Condeno-o pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º, na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de 8,00€, no valor total de 640,00€; h) Em cúmulo jurídico, vai o arguido condenado com a pena de 260 dias de multa à taxa diária de 8,00€, no valor total de 2.080,00€; i) Condeno a arguida MM do pela prática de um crime de sequestro, p. e p. pelo artigo 158.º, n.º 1, do C.P., na pena de 180 dias de multa à taxa diária de 10,00€, no valor de 1.800,00€; j) Condeno-a ainda, pela prática de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 145.º, n.º 1, alínea a), na pena de oito meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano; k) Condeno-a pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de 8,00€, no valor total de 480,00€; l) Condeno a arguida em cúmulo jurídico, na pena única de 195 dias de multa, à taxa diária de 10,00€, no valor de 1.950,00€ e de oito meses de prisão suspensa na sua execução por um ano.

m) Julgo os pedido se indemnização civil, procedentes por provados, e condeno os arguidos/demandados a pagar solidariamente o valor peticionado, a título de danos morais ao demandante e o valor dos tratamentos ao hospital.

Inconformados, interpuseram recurso da sentença proferida, para este Tribunal da Relação os arguidos e demandados civis EE, MM e PM.

Sobre o recurso interposto recaiu o acórdão desta Relação de Évora de 12/3/19 (fls. 782 e 831), no qual se decidiu: a) Conceder provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida, nos termos das alíneas seguintes; b) Determinar a alteração da matéria de facto provada e não provada consignada a fls. 33 do presente acórdão; c) Absolver os arguidos EE, MM e PM da totalidade dos crimes por cuja prática condenados, na sentença recorrida; d) Absolver os mesmos arguidos dos pedidos de indemnização civil contra eles deduzidos pelo assistente LR e pelo Centro Hospitalar de Leiria; e) Condenar o demandante civil LR a suportar as custas do pedido de indemnização por si deduzido.

O assistente e demandante civil LR veio «reclamar» do nosso acórdão de 12/3/19, tendo formulado as seguintes conclusões: 1. Os recorrentes na sua Motivação delimitou o objecto do Recurso; 2. Pretenderam a IMPUGNAR A MATÉRIA DE FACTO, conforme se extrai das suas conclusões, designadamente os pontos 1 a 7, 9 a l l , 14, 16, 17 e 18; 3. Competia-lhe pois cumprir, adequada e rigorosamente, o ónus da Impugnação da Matéria de facto; 4. Não o fizeram pelo que devia ter sido rejeitada essa sua pretensão; 5. Porém, a Douta Decisão do Tribunal ad quem, tendo aceitado apreciar a matéria de facto alegadamente impugnada pelos arguidos, procedendo a concretas alterações à resposta dada a essa matéria pelo Tribunal a quo, alargando, salvo o devido respeito, muito para além do razoável, a amplitude da impugnação apresentada pelos arguidos; 6. Ainda decidiu, muito para além das pretensões dos próprios arguidos recorrentes apreciar e decidir sobre matéria de facto que não fora sequer objecto de qualquer tipo de impugnação por parte dos arguidos; 7. Tendo alterado, em concreto, em sentido exactamente oposto, a resposta dada pelo Tribunal a quo a tal matéria; 8. O que conduziu a uma alteração tão radical que teve como consequência a absolvição integral dos arguidos, antes condenados; 9. A Douta Decisão procedeu à reapreciação da prova gravada e análise depreciativa do Relatório Médico junto aos autos; 10. Considerando que não apresentando tal relatório as lesões que, no entender da Douta Decisão, deveriam ter resultados das agressões dadas como provadas pelo tribunal a quo; 11. Tal apreciação conduziria, "sem apelo nem agravo" à completa anulação, para efeitos probatórios, de todas, e quaisquer declarações do Assistente; 12. Tão só com base num relatório médico elaborado três dias depois da, comprovada, ocorrência dos factos, (leia-se, essencialmente agressões); 13. Perpetradas, essencialmente em zonas musculares, susceptíveis de rápida recuperação; 14. E, tendo desqualificado integralmente, em termos probatórios, relativamente a toda a matéria a que se tinha referido, as declarações do assistente; 15. Alterou a Resposta à matéria de facto de todos os pontos que tinham sido, desadequada mente impugnados pelos arguidos e foi ainda mais longe e; decidiu dar como não provada matéria de facto que não fora sequer impugnada pelos arguidos no seu recurso; 16. Designadamente os pontos 12, 19, 20, 21, 22, 23, 24, e 26 - Da Matéria de Facto dada como provada pelo Tribunal a quo; 17. Sem qualquer fundamentação que não uma "consequência lógica" que na verdade e salvo o devido respeito não poderão colher numa Decisão desta relevância que altera por completo a decisão da primeira instância e, leva à absolvição dos arguidos, relativamente a CRIMES que absolutamente nada têm a ver com a singular apreciação do Relatório Médico e consequente desvalorização das Declarações quer do assistente quer das demais testemunhas dos factos; 18. E, quando o próprio Tribunal ad quem refere expressamente que tais factos nem impugnados foram pelos arguidos: - " ...ainda que não tenham sido directamente - nem indirectamente, sublinhado nosso - impugnados pelos recorrentes; 19. Incorreu pois a Douta Decisão salvo o devido respeito e nesta medida em Excesso de Pronúncia; 20. O excesso de pronúncia ocorre ainda e também porque se não encontra fundamentada, de todo, a extensão da matéria de facto apreciada na Douta Decisão, uma vez que a invocada "consequência lógica" jamais poderá servir para lastrear tal fundamento; 21. É que, o Tribunal ad quem tendo decidido desqualificar integralmente o depoimento do assistente, desqualificou também, sem nunca ter fundamentado, as declarações da única testemunha presente, sem qualquer interesse directo no diferendo; A Sr. a LF que presenciou todos os factos relativos às...

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