Acórdão nº 612/06.9TBVRS-E.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelCRISTINA DÁ MESQUITA
Data da Resolução14 de Março de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1.

BB interpôs recurso da sentença proferida pelo Juízo de Comércio de Olhão, Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, no âmbito do incidente de qualificação de insolvência instaurado por apenso aos autos de insolvência da CC, Lda., pessoa coletiva n.º …, com sede na rua …, n.º … B, em Monte Gordo, os quais correm termos sob o n.º 612/06.9TBVRS, o qual: a) Qualificou a insolvência daquela sociedade como culposa; b) Declarou afetado pela qualificação da insolvência como culposa o ora recorrente; c) Declarou que, durante três anos, o recorrente fica inibido para o exercício do comércio e para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa; d) Determinou a perda de quaisquer créditos sobre a insolvente ou sobre a massa insolvente detidos pelo recorrente; e) Condenou o recorrente a indemnizar os credores da sociedade CC, Lda. no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças do respetivo património, a efetuar em liquidação de sentença.

A sentença, na parte que releva para o presente recurso, tem o seguinte teor: «RELATÓRIO CC, Lda. foi declarada insolvente por sentença proferida em 21 de Novembro de 2006, transitada em julgado, na qual foi declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência com carácter pleno.

Foi realizada assembleia de apreciação do relatório.

O Administrador da insolvência veio apresentar o seu parecer e requereu a qualificação da insolvência como fortuita.

O Ministério Público emitiu parecer e requereu a qualificação da insolvência como culposa, propondo que seja por esta afetado BB.

Foi ordenada a notificação da Insolvente e a citação do indicado como proposto afetado pela qualificação da insolvência como culposa, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 188º, n.º 6, do CIRE.

O proposto afetado pela qualificação da insolvência como culposa deduziu oposição.

Foi realizada audiência prévia na qual foi proferido despacho saneador, que fixou o objeto do litígio e enunciaram-se os temas de prova.

Foi realizada audiência final com inteiro respeito pelo legal formalismo, conforme resulta da respetiva ata.

II – Saneamento Mantém-se a regularidade e validade da instância.

III – Questões a resolver: As questões a resolver nos presentes autos são: a verificação dos pressupostos da qualificação da insolvência como culposa relativamente ao proposto afetado por essa qualificação.

IV- Factos Provados: Discutida a causa, e tendo presente o preceituado no artigo 11º do CIRE, resultaram provados os seguintes factos, com relevância para a decisão da causa: 1. CC, Lda., pessoa coletiva n.º …, com sede na Rua …, nº … B, Monte Gordo, foi declarada insolvente por sentença proferida em 21.11.2006, transitada em julgado.

  1. BB foi sócio e gerente da Insolvente desde a sua constituição mostrando-se registada pela AP. 08/20000720 a sua nomeação como gerente da Insolvente CC, Lda.

  2. Mostra-se registada pela AP. 07/050419 PROVIDÊNCIA CAUTELAR constando averbado no registo “Decretada em 15 de Abril de 2005. Conteúdo: Ordenada a suspensão das funções do gerente BB, até à decisão que seja proferida a final na ação principal.” 4. Mostra-se registada pela AP. 08/050419 a nomeação de DD como gerente da Insolvente CC, Lda.

  3. A Insolvente tinha por objeto o comércio de frangos assados.

  4. A devedora CC, Lda. apresentou-se à insolvência em 06.11.2006, alegando a impossibilidade de cumprir todos os compromissos financeiros anteriores a Abril de 2005, sendo que desde a sua constituição até esta última data, a gerência foi exercida apenas pelo sócio, BB.

  5. Durante a sua gerência BB não prestou contas relativas aos vários exercícios (anos de 2000 a 2003).

  6. Enquanto exerceu a gerência da insolvente, BB retirava, diariamente, dinheiro da caixa do estabelecimento de churrasqueira sito em Monte Gordo, resultante das receitas, apropriando-se do mesmo para proveito próprio.

  7. Desde o início da gerência, BB deixou de cumprir as obrigações fiscais da sua representada, deixou de entregar o valor das contribuições relativas aos trabalhadores à Segurança Social, não entregou o valor dos impostos ao Estado, não entregou o valor das rendas dos estabelecimentos da insolvente e mais tarde passou a não entregar os valores devidos aos fornecedores e até aos trabalhadores.

  8. A insolvente só apresentou lucros em 2001, acumulando nos restantes exercícios prejuízos de 185.663,77 euros.

  9. Em data anterior a 2005, os restantes sócios da insolvente por diversas vezes solicitaram a BB a convocação de uma assembleia geral de sócios para análise da situação financeira daquela, não tendo ele procedido a tal convocatória.

  10. O sócio gerente BB enquanto esteve à frente da sociedade nunca diligenciou pela elaboração, fiscalização e depósito legal das contas anuais da insolvente.

  11. BB sócio gerente tinha perfeito conhecimento da situação financeira caótica que a insolvente apresentava desde 2002, no entanto, nada fez para a resolver e também não diligenciou pela apresentação da mesma à insolvência.

  12. BB durante a sua gerência recebia as receitas do negócio em dinheiro e efetuava pagamentos em numerário.

  13. Alguns pagamentos aos fornecedores eram feitos em numerário, por depósito ou transferência bancária.

  14. A Insolvente CC, Lda. celebrou um acordo denominado “Contrato de trabalho a termo certo” com EE, constando da cláusula Primeira que este iria exercer “(…) funções inerente à categoria profissional de gerente de lojas.”, com início em 01 de Novembro de 2003.

  15. Consta da cláusula Quarta do acordo referido em 16 que a “A primeira outorgante vincula-se ao pagamento, ao segundo outorgante, de uma remuneração mensal fixa de € 1.500 (…).” 18. Muitos dos pagamentos feitos a fornecedores, eram feitos a pronto pagamento pois a sociedade insolvente deixou de ter crédito.

  16. No início da atividade a insolvente CC, Lda. contraiu dois empréstimos: um na Caixa Geral de Depósitos, no valor de 2.500.000 escudos (12.500 Euros) e outro posteriormente na Caixa de Credito Agrícola, no valor de 5.000.000 escudos (25.000 euros), destinando-se estes valores à liquidação das obras efetuadas, nas duas lojas e ao arranque da atividade comercial nas lojas da empresa, valores esses que foram integralmente liquidados às respetivas instituições bancárias.

  17. Em Julho de 2002 ocorreu um acidente no sistema de escoamento de fumos com incêndio do motor de extração da loja de Monte Gordo, tendo sido forçado o fecho da loja ao público durante pelo menos uma semana.

V – Factos Não Provados: Com relevância para a decisão da causa, não resultou demonstrado: 1) Que no final da sua gerência BB deu ordens aos funcionários da insolvente para depositarem as quantias apuradas em caixa numa conta alheia à sociedade, titulada por EE.

2) Que na qualidade de gerente de lojas, EE estava incumbido de efetuar algumas compras necessárias para o bom funcionamento das lojas e alguns pagamentos (no ato de entrega de mercadoria), tendo o mesmo por vezes efetuado alguns pagamentos em numerário.

3) Que BB chegou a pedir ao EE, para efetuar alguns pagamentos com o seu dinheiro, uma vez que a conta da insolvente não dispunha de dinheiro para efetuar os mesmos, a fim de evitar falta de fornecimento de energia elétrica nas lojas, uma vez que foram emitidos cheque, para pagamento da eletricidade, que por falta de provisão, foram devolvidos.

4) Que BB, por várias vezes, pediu o favor a EE para emprestar dinheiro à insolvente, efetuando depósitos na conta bancária daquela, para que os cheques pudessem ser novamente apresentados ao banco e regularizar a situação da devolução.

5) Que assim que havia dinheiro para devolver o dinheiro, que o EE havia emprestado à insolvente, o mesmo era-lhe devolvido, quer em numerário, quer através de depósito bancário.

6) Que BB autorizou a funcionária Maria … a proceder a uma encomenda de frangos à empresa Citaves, uma vez que esta sociedade não permitiu a venda de frangos à insolvente em virtude de existirem valores em atraso a pagar.

7) Que 2002 foi um ano péssimo para a venda de frangos devido à “crise dos nitrofuranos”.

8) Que foram feitos investimentos na fase inicial, em ambas as lojas (Monte Gordo e Tavira), tendo sido gastos a título de obras cerca de € 15.000,00 e para equipamentos cerca de €80.000,00.

9) Que nos anos de 2002 a 2004, BB despendeu cerca de € 20.000,00, na substituição e aquisição de equipamentos danificados.

10) Que tais equipamentos foram totalmente liquidados pelo gerente BB dentro dos prazos acordados.

11) Que na loja de Tavira existiram problemas com os equipamentos em duas ocasiões diferentes (uma em 2003 e outra em 2004), que conduziram ao fecho da loja por períodos de 11 e 15 dias e à inevitável perda de faturação.

12) Que as despesas decorrentes da realização das obras e da aquisição dos equipamentos, cumuladas com a necessidade de fazer face aos compromissos nos pagamentos dos empréstimos bancários bem como dos salários a empregados em alturas de perdas de faturação, por motivos de encerramento para obras de reparação, correspondente a 38 dias (= 13 + 11 + 15)...

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