Acórdão nº 2208/17.0T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Fevereiro de 2019
Magistrado Responsável | MOISÉS SILVA |
Data da Resolução | 28 de Fevereiro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Apelante: B... (ré).
Apelado: J... (autor).
Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo do Trabalho de Portimão, J1.
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O A. instaurou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra a R., pedindo que deve ser julgada a ação procedente e, em consequência, ser a ré condenada a pagar-lhe o montante global de € 9 815,48 (nove mil, oitocentos e quinze euros e quarenta e oito cêntimos) e juros vincendos à taxa legal, até integral pagamento das quantias em dívida, sendo: - Trabalho suplementar e abonos de refeição referentes aos contratos de trabalho a termo certo que vigoraram nos anos de 2015 e 2016, bem como os juros legais que se venceram até à presente data, quantias essas que correspondem ao valor total de € 8 815,48 (oito mil, oitocentos e quinze euros e quarenta e oito cêntimos); e - Indemnização por danos não patrimoniais, na quantia de € 1 000 (mil ouros).
Alegou, em suma, que celebrou dois contratos a termo com a ré. Em ambos prestou trabalho suplementar, que não lhe foi pago. No final, de ambos, a ré forçou-o a assinar uma remissão abdicativa (que deve ser anulada – cf. artigo 52.º da petição inicial). Com a sua conduta, a ré provou danos na saúde do autor.
Citada a ré e frustrado o acordo em audiência de partes, por falta de comparência da ré, foi apresentada contestação (fls. 763 e ss.) onde esta veio dizer que os créditos emergentes da relação de trabalho que cessou em 2015 estão prescritos; o autor assinou remissão abdicativa, que é válida; sempre foram pagos valores superiores aos devidos pelo trabalho suplementar. De resto, impugna os factos.
O autor respondeu a fls. 789 e ss., reduzindo o pedido para o valor global de € 7 993,93, sendo € 6 933,93 de trabalho suplementar e juros e € 1 000 de compensação por danos não patrimoniais.
Desse articulado resulta (cf. artigo 189.º) que da relação laboral de 2016 o autor reduz o pedido para a quantia de € 3 130,40 a título de trabalho suplementar, acrescido de juros de € 163,40.
Designou-se data para a realização de audiência prévia, à qual a ré não compareceu, onde ficou conhecida a exceção da prescrição, julga-a procedente.
Dispensou-se a elaboração dos factos assentes e da base instrutória, prosseguindo os autos para conhecimento do restante pedido (relativo à relação laboral de 2016).
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento como consta da respetiva ata.
A resposta à matéria de facto, com os factos provados, não provados e motivação, foi proferida em audiência designada para esse efeito.
De seguida foi proferida sentença com a decisão seguinte: Nestes termos e por tudo o exposto, julgando a ação procedente, decide-se anular a declaração designada de remissão abdicativa datada de 2/12/2016 e condenar a ré B... a pagar ao autor J... a quantia de € 3130,40 (três mil, cento e trinta euros e quarenta cêntimos) acrescida de juros vencidos e vincendos contados à taxa legal desde 30/11/2016 e até integral pagamento e a quantia de € 1 000 (mil euros) acrescida de juros vencidos e vincendos e contados à taxa legal desde a citação.
Custas, nesta parte, pela ré em função do respetivo decaimento.
Fixa-se o valor da ação em € 9 815,48.
Registe e notifique.
Tendo presente o disposto, nomeadamente, nos artigos: - 4.º n.º 3, alíneas a) e b) e 14.º n.º 2, alínea d) e n.º 3, alínea e), do D.L. 237/2007, de 19 de junho (falta de entrega ao trabalhador, no âmbito deste processo, de cópia do livrete individual de controlo); - 215.º e 216.º do Código de Trabalho e artigo 2.º da Portaria 983/2007, de 27 de agosto (falta de mapa de horário de trabalho); - 231.º n.ºs 1 e 9 do Código de Trabalho (falta de registo do trabalho suplementar); - 229.º n.ºs 1, 3, 4 e 7 do Código de Trabalho (falta de descanso compensatório); Após trânsito comunique, com cópia, à ACT para os efeitos tidos por convenientes.
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Inconformada, veio a ré interpor recurso de apelação que motivou e com as conclusões que se seguem: 1. A sentença é nula nos termos do art.º 615.º n.º 1, alíneas b) c) e d) do CPC.
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A atual redação do processo civil determina a unificação do julgamento da matéria de facto com a sentença, que têm que incluir a fundamentação da matéria de facto.
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Da sentença recorrida não consta qualquer fundamentação para os factos provados, nem é feita qualquer análise crítica à prova produzida e aos meios de prova considerados.
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Tal omissão constitui a nulidade da sentença prevista na alínea b), do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.
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A recorrente é condenada num determinado montante global a título de trabalho suplementar, de trabalho noturno e alimentação.
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A sentença recorrida – no ponto 13 dos factos provados – dá como assente o horário praticado pelo recorrido.
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Porém, é totalmente omissa, na parte da fundamentação de direito e na decisão, quanto ao número de horas consideradas, com a especificação dos respetivos acréscimos remuneratórios e dos dias a que se reporta.
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Do mesmo modo, é condenada a pagar um montante – não determinado individualmente, a título de refeição sem qualquer referência a quantidades e dias.
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Da sentença não é possível apurar a origem dos montantes concretos e relativamente a cada rubrica em que a recorrente foi condenada.
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Verifica-se, assim, ambiguidade e obscuridade na sentença quanto ao objeto desta condenação, o que gera a sua nulidade nos termos da alínea c), n.º 1 do art.º 615.º do CPC.
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A sentença é, igualmente, nula por omissão de pronúncia sobre determinados factos essenciais para a boa decisão da causa.
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A sentença recorrida não contém, em violação do art.º 607.º n.º 4 do CPC, a enumeração dos factos não provados.
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A falta do elenco do factos não provados constitui uma nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, na medida em que o Tribunal a quo não se pronuncia sobre tal matéria, como era obrigação, impedindo uma total apreciação da bondade dos factos considerados e do sentido da sua decisão.
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A recorrente alegou, a título de exceção, a existência de um acordo remuneratório substitutivo da convenção coletiva, nomeadamente, em compensação do trabalho suplementar, trabalho noturno e alimentação, cujos pedidos estavam em causa nos presentes autos e que constituíam o objeto da ação.
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O tribunal considerou tal matéria factual como “conclusiva e de direito”, não a colocando nos elencos dos factos provados ou não provados.
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Essa matéria era uma das questões dos autos, constituindo um tema de prova sobre o qual o tribunal tinha que se pronunciar nos termos do art.º 608.º n.º 2 do CPC.
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Há uma total omissão de pronúncia sobre o facto relacionado com esse acordo retributivo e com os seus eventuais efeitos, correspondente à nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.
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O tribunal deu como provados factos constantes da resposta à contestação que excedem o âmbito previsto para a mesma, nos termos do art.º 60.º do Código de Processo do Trabalho, como considerou, de forma ilegítima, os documentos juntos para prova dos mesmos.
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Aconteceu assim com os factos provados no ponto 13 da matéria assente que resultam da alegação dos artigos 101.º a 199.º da resposta à contestação e os quais não tinham cabimento processual nesse articulado.
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Esses factos têm que ser considerados como não escritos e o Tribunal a quo não se podia servir deles para a decisão da causa, sob pena de violação do art.º 60.º do Código de Processo do Trabalho.
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Ao fazê-lo verifica-se a nulidade da sentença nos termos da alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.
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Na definição legal as presunções são ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido (art.º 349.º do Código Civil), sendo certo que as presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (art.º 351.º do mesmo diploma legal).
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É verdade que a remissão abdicativa foi integralmente redigida pela ré, como acontece em todas as situações deste tipo.
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É verdade que o referido documento foi entregue para que fosse assinado pelo autor como condição para que lhe fosse entregue o cheque que, ao contrário do que o tribunal a quo refere, não titulava só o pagamento do último salário, mas também, ajudas de custo, a compensação pecuniária global e o subsídio de Natal, tudo conforme doc. n.º 48 junto com a petição inicial (recibo de vencimento do mês de novembro de 2016).
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Precisamente porque o cheque englobava várias rúbricas é que foi pedido ao autor que assinasse a respetiva declaração, atendendo a que era o último recebimento e visto que no mesmo estava incluída a referida compensação de natureza global, relativamente à qual já se extraía a interpretação de que todos os créditos devidos pela execução e cessação do contrato de trabalho estavam incluídos e, por isso, a serem totalmente liquidados.
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Não pode a recorrente sufragar o sentido que o Tribunal a quo pretende retirar deste facto, uma vez que é o próprio autor quem confessa que aquela assinatura foi por si feita (art.º 51.º da PI) e, se decidiu fazê-la de uma forma diferente, não se pode daí retirar a ilação de que assinou o documento “contrariado”.
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O facto é que assinou o documento pelo seu próprio punho, conforme provado, e, como tal, com os efeitos previstos no artigo 374.º do Código Civil.
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O autor, no limite, poderia sempre recusar-se a assinar o documento.
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O A. era perfeitamente livre de aceitar ou repudiar as condições avançadas, não se configurando, no contexto sujeito, o invocado cenário da coação moral, desenhado – na definição legal constante do art.º 255.º n.º 1 do Cód. Civil – para as situações em que a declaração negocial é determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração.
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É do senso comum que “um trabalhador que ganha um salário como aquele que a ré acordou pagar ao autor é porque necessita dele para...
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