Acórdão nº 2340/20.3T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelTOMÉ RAMIÃO
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I- Relatório: P…, residente na residente na Av. …, Abrantes, veio instaurar, em cumulação, procedimento cautelar especificado de arbitramento de reparação provisória e procedimento cautelar comum contra SEGURADORAS…, S.A.

, com sede na …, Lisboa, atualmente com a denominação de G…, S.A.

, pedindo que se condene a requerida: 1.

A assumir e a pagar todos os custos necessários à recuperação do estado de saúde do requerente, designadamente tratamentos médicos, exames, consultas, cirurgias, internamentos hospitalares, próteses, medicamentos e transportes.

  1. A assumir e a pagar todas as despesas inerentes à continuação dos tratamentos que o requerente iniciou, e que vai necessitar para o futuro, nas várias especialidades médicas do Hospital da Luz, em Lisboa.

  2. A assumir e a pagar todos os tratamentos urgentes necessários à recuperação física e psicológica do requerente, nomeadamente reconstrução da face, colocação de próteses dentárias e colocação de prótese no braço amputado.

  3. A pagar ao requerente a referida quantia de 35.000,00 € por forma a que possa realizar o tratamento cirúrgico descrito no artigo 90.º do requerimento inicial.

  4. A pagar ao requerente a quantia mensal de 1 300,0 €, a título de reparação provisória do dano.

    Alegou, em síntese, que no dia 6 de setembro de 2019, pelas 6:30 h, circulava, na Auto Estrada A23, no sentido Torres Novas – Abrantes, como passageiro transportado no veículo de passageiros de matrícula 37- 05-UP, seguro na Ré, conduzido por J… e pertencente a sua mãe A…, o qual perdeu o controlo do veículo, entrou em despiste, indo embater, sucessivamente, no separador central, na proteção metálica lateral direita e, novamente, no separador central, ficando imobilizado no eixo da faixa de rodagem. Após o acidente, o requerente foi encontrado caído na faixa de rodagem, à distância aproximada de 1,30m do lado direito do veículo acidentado.

    Em consequência do acidente sofreu graves danos físicos e morais e necessita de retomar os tratamentos de forma urgente, os quais são necessários à sua recuperação física e psicológica, nomeadamente reconstrução da face, colocação de próteses dentárias e colocação de prótese no braço amputado e, porque ficou sem quaisquer rendimentos, necessita de uma quantia mensal para fazer face às suas despesas.

    Por despacho de 16/10/2020 foi admitida a cumulação das requeridas providências e determinada a sua tramitação nos termos do procedimento cautelar comum e não como procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória.

    Citada, a Ré deduziu oposição, aceitando a maioria dos alegados danos sofridos, mas impugnando os factos relativos ao condutor do veículo, aduzindo que quem conduzia o veículo de passageiros de matrícula 37… era, não J…, mas o requerente, e concluiu pela improcedência do procedimento cautelar.

    Realizado o julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto, julgo parcialmente procedente, por parcialmente provado, o presente procedimento cautelar intentado pelo requerente P…, e, em consequência condeno a requerida G…, S.A.

    :

    1. No pagamento de todos os custos urgentes e necessários à recuperação do estado de saúde física e psicológica do requerente, designadamente tratamentos médicos, exames, consultas, cirurgias, internamentos hospitalares, próteses, medicamentos e transportes e de todas as despesas inerentes à continuação dos tratamentos que o requerente iniciou, e que vai necessitar para o futuro, nas várias especialidades médicas do Hospital da Luz, em Lisboa e que sejam causa direta do acidente objeto destes autos.

    2. A pagar ao requerente a renda mensal de 750,00 (setecentos e cinquenta euros) até à decisão final da ação principal, absolvendo a requerida do demais peticionado.

      Inconformada com esta decisão, veio a requerida interpor o presente recurso, apresentando, após o corpo alegatório, as seguintes conclusões: 1.

      O presente recurso versa sobre a Sentença do Tribunal a quo que deferiu a pretensão do Requerente e em consequência determinou que o condutor do veículo no momento do acidente era J… e não o Requerente, conforme a Recorrente defende, e como tal condenou a Recorrente: “

    3. No pagamento de todos os custos urgentes e necessários à recuperação do estado de saúde física e psicológica do requerente, designadamente tratamentos médicos, exames, consultas, cirurgias, internamentos hospitalares, próteses, medicamentos e transportes e de todas as despesas inerentes à continuação dos tratamentos que o requerente iniciou, e que vai necessitar para o futuro, nas várias especialidades médicas do Hospital da Luz, em Lisboa e que sejam causa direta do acidente objeto destes autos. b) A pagar ao requerente a renda mensal de 750,00 (setecentos e cinquenta euros) até à decisão final da ação principal, absolvendo a requerida do demais peticionado.” 2.

      A razão de ser do presente recurso prende-se com a discordância quanto à identificação do condutor no momento do acidente e caso se entenda que o Requerente não era o condutor, a ponderação das circunstâncias do acidente para a atribuição da culpa do lesado e consequente exclusão ou redução da percentagem de responsabilidade da Recorrente.

  5. Face à questão a decidir supra exposta, e após produção de prova, deu o Tribunal como provados os factos 5 a 8 e 79 a 81 que importam para o objeto do presente recurso.

  6. Por outro lado, o Tribunal deu como não provado os factos 2, 3 e 4, que importam para o objeto do presente recurso.

  7. No entender do Tribunal o facto da testemunha H…, militar da GNR (cabo), ter afirmado que o J… se identificou como condutor e foi a ele que fez o teste de alcoolemia é revelador que seria este o condutor.

  8. Com efeito, importa reanalisar as declarações prestadas pela testemunha H…, militar da GNR (cabo), na audiência do dia 14/01/2021, entre as 09:57:57 e as 10:45:44.

  9. Resulta do depoimento desta testemunha, nomeadamente entre os minutos [00:07:29.12] e [00:09:22.26] entre os minutos [00:20:32.23] e [00:23:42.24], entre os minutos [00:39:11.29] e [00:46:00.07], que o J… se encontrava com um comportamento alterado, quer pela taxa de alcoolémia, quer pelo choque decorrente do acidente.

  10. Resultou evidente das declarações do GNR que o J… teve de ser convencido a dar os seus dados e a fazer o teste de álcool o que só demonstra que não estaria tão certo de que era o condutor, conforme o Tribunal entendeu.

  11. Também resulta claro do depoimento do GNR que este identificou o J… por se ter dirigido ao veículo e este se encontrar dentro do mesmo, tendo levado o GNR a questioná-lo se era o condutor.

  12. Por todas estas razões, a Recorrente entende que o Tribunal fez uma incorreta valoração do depoimento do GNR e que deste testemunho não resulta claro e evidente que o condutor do veículo no momento do acidente seria o J….

  13. Outro aspeto que o Tribunal também valorou para determinar a forma como o acidente ocorreu e daí retirar a conclusão que o condutor seria o J…, foi a descrição que o GNR fez do acidente.

  14. A Recorrente está de acordo que a descrição está de acordo com o croqui, até porque foi elaborado pela testemunha, pelo que não seria de esperar contradições, também está de acordo que os danos no veículo são compatíveis com a dinâmica apresentada, mas importa igualmente referir que de acordo com o que foi explicado, quer pela Testemunha C… entre os minutos [00:14:41.27] e [00:19:40.19], quer pela testemunha R… entre os minutos [00:21:06.20] e [00:33:31.22], qualquer dinâmica com múltiplos embates apresentaria compatibilidade com os danos no veículo.

  15. A testemunha H… esclareceu entre os minutos [00:09:55.07] e [00:12:26.23], entre os minutos [00:20:32.23] e [00:21:47.18] e entre os minutos [00:24:35.19] e [00:34:01.15], que: (i) o primeiro embate foi fraco e que o segundo embate é que foi mais forte e violento (ii) o braço foi dissecado no segundo embate, no lado direito da estrada, apesar de ter aparecido no meio do separador central junto ao local do terceiro embate, no lado esquerdo da estrada; (iii) que a parte superior do corpo do Pedro andou arrastada no alcatrão enquanto as pernas e os pés estavam dentro do carro, entre o segundo e o terceiro embate.

  16. Em primeiro lugar, nos autos, nomeadamente no croqui, não existe nenhum indício de travagem, pelo que, podemos excluir a hipótese, de o veículo estar em travagem no momento dos embates.

  17. Por outro lado, o primeiro embate é sempre e por natureza aquele que tem mais violência, pois o veículo está animado de velocidade e só após um primeiro embate, que absorve parte dessa energia, é que o veículo passa a circular a uma velocidade mais reduzida. Para que, um segundo embate seja mais violento conforme o GNR referiu, - e o Tribunal acatou sem duvidar, - era necessário existir uma aceleração do veículo, após o primeiro embate, o que no caso em concreto não temos elementos para presumir que tivesse acontecido.

  18. Assim, sendo resulta evidente que para além do que a testemunha acha que aconteceu, não existe nenhum facto no processo, que permita concluir que o segundo embate foi o mais violento, antes pelo contrário, as leis da física, só evidenciam que o primeiro embate é que terá sido o mais violento.

  19. A Recorrente também não pode concordar com o entendimento que o braço terá sido dissecado no segundo embate, pois o GNR não recolheu indícios nenhuns no local que permitam afirmar tal facto.

  20. Acresce que, no entender da Recorrente a localização do braço junto do terceiro embate é suficientemente indiciador que terá sido neste local que o braço terá sido dissecado. No entender da Recorrente não é credível que o braço tenha sido dissecado junto ao segundo embate e que tivesse sido projetado para o local do terceiro embate, isto é, a 7,40m.

  21. As leis da física não permitem explicar como é que o Requerente andou arrastado no pavimento conforme foi dito pelo GNR, pois, se o Requerente fosse no lugar do pendura e com o cinto nunca teria sido projetado...

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