Acórdão nº 293/13.3TMFAR-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução11 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora I – RELATÓRIO N…, por apenso a ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge convertido para divórcio por mútuo consentimento, propôs contra a ex-cônjuge, A…, nos termos do artigo 900.º, n.º 1, do CPC, e artigo 1793.º, n.º 3, do Código Civil, ação de alteração da atribuição da casa de morada de família, com fundamento na verificação da causa resolutiva, porquanto por acordo no âmbito do processo de divórcio, a Requerida ficou a residir na casa de morada de família (fração autónoma designada pela letra “EE” correspondente ao 1º piso, letra B do nº …, da Rua …, inscrita na matriz sob o art. … urbano, da Freguesia do Lumiar, Concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob a descrição nº …, com o valor patrimonial de €216.017,42), até à venda ou partilha.

Porém, a habitação constitui bem próprio do Requerente que a pretende vender com o intuito de adquirir casa própria, tendo a Requerida obstaculizado a entrada na fração de perito especializado a fim de realizar atos com vista à obtenção do Certificado Energético, necessário para o processo de venda do imóvel.

Formula, a final, os seguintes pedidos cumulativos:

  1. A verificação da condição resolutiva nos termos fixados no acordo relativo à utilização da casa de morada de família; b) A caducidade do seu direito de a habitar, por verificação da condição resolutiva e consequente entrega da fração livre de pessoas e bens; c) O comportamento da requerida como ilícito, desleal e em abuso de direito e consequentemente condenada em indemnização pelos danos causados ao requerido; d) E que a requerida seja condenada em sanção pecuniária compulsória não inferior a 200 € por cada dia em que não se disponibilizou a agendar a vistoria ao imóvel até à entrega do mesmo.

    A Requerida na oposição defendeu-se por exceção e por impugnação, invocando a falta de interesse em agir, a ineptidão da petição inicial e, ainda, que a casa de morada de família é bem comum.

    Ademais, alegou que o Requerente não invocou circunstâncias supervenientes que possam justificar a alteração do acordo quanto à casa de morada de família, podendo a Requerida permanecer na casa até que seja efetivada a venda, inexistindo no acordo qualquer condição resolutiva que opere com a intenção de venda.

    O Requerente respondeu às exceções.

    Em sede de despacho saneador, o tribunal a quo julgou verificada a exceção da ineptidão da petição inicial, com a consequente nulidade do processo, absolvendo a Requerida da instância.

    O Requerido interpôs recurso e por acórdão desta Relação de Évora proferido em 25/02/2021 foi decidido: «(…) revoga[r]-se a decisão recorrida relativamente à existência de uma ineptidão da petição inicial, devendo os autos prosseguir para a apreciação das demais matérias colocadas à apreciação do Tribunal «a quo» com reformulação do despacho saneador.» Regressados os autos à 1.ª instância foi, então, em 30-05-2021, proferido o seguinte despacho: «Em conformidade com o decidido pelo Tribunal da Relação de Évora (que revogou o despacho saneador proferido em 27/11/2020 na parte relativa à excepção da ineptidão da petição inicial e considerou transitada a apreciação dos pedidos referidos nas alíneas c) e d) da petição inicial, tendo sido decidido que ocorria incompatibilidade entre tais pedidos e os formulados nas alíneas a) e b) da petição inicial), cumpre proferir o seguinte despacho: Em conformidade com o disposto no art. 593º/2 c) e 596º/1 do CPC, fixa-se o seguinte:

  2. Objecto do litígio: Com a presente acção pretende o autor que seja verificada a condição resolutiva do acordo relativo à casa de morada de família e declarada a caducidade do direito da ré/requerida a habitá-la.

  3. Temas da prova: Discute-se na presente acção se a ré impediu a visita à casa de morada de família necessária à obtenção de certificado energético com vista à venda da casa (que o autor promoveu através de empresa de mediação imobiliária); se a ré possui condições para prover à sua habitação e sustento, dispondo de dois imóveis em Lisboa e de apoio familiar; se o autor tem condições financeiras superiores às da ré; se o autor tem a sua vida centrada na cidade de Faro.» (…) «No que concerne aos documentos que a ré pretende sejam juntos aos autos e que se encontram em poder de terceiros (ponto III da contestação), não se vislumbra a relevância de tais documentos para o objecto dos autos, nem que as partes, se o entenderem, não possam/devam requisitá-los junto de tais entidades, sendo que não compete ao Tribunal substituir-se às partes, a quem compete o ónus de alegação e prova dos factos. Donde, indefere-se o requerido nesta parte.» Inconformada, a Requerida interpôs recurso apresentando as seguintes CONCLUSÕES: 1º - O presente recurso vem interposto do douto despacho saneador de fls.___, datado de datado de 30-05-2021 (referência 120247069), e uma vez que a Requerida com ele não se conforma vem do mesmo interpor recurso de Apelação, nos termos dos artigos 627º, 629º nº 1, 631º nº 1, 637º, 638º, nº 1, 639º, nºs 1 e 2, 644º nº 2 alínea d), 645º nº 2, e 647º nº 1, todos do C.P.C., versando o mesmo sobre a sua parte decisória, designadamente a que rejeitou o requerimento probatório por si apresentado no seu articulado de oposição de fls.___, concretamente quanto aos pontos II e III do mesmo, tendo assim indeferido e restringido a realização dos meios de prova requeridos, nomeadamente a produção da pretendida prova documental (em poder da parte contrária e em poder de terceiros), decisão esta que é imediatamente recorrível.

    1. - Com relevância factual para a decisão do caso em apreço, devem ser considerados os pontos (i) a (iv) supra reproduzidos.

    2. - No final do articulado de oposição a Requerida apresentou o respectivo requerimento probatório, sendo aqui de evidenciar os seus pontos II (Documentos em poder da parte contrária) e III (Documentos em poder de terceiros), nomeadamente as suas alíneas a), d), e), f), g), h), i), j) e k), que aqui se dão por integralmente reproduzidas.

    3. - O Tribunal “a quo” fixou o seguinte objecto do litígio: “Com a presente acção pretende o autor que seja verificada a condição resolutiva do acordo relativo à casa de morada de família e declarada a caducidade do direito da ré/requerida a habitá-la”.

    4. - No que interessa analisar para efeitos do presente recurso foi também fixado, em sede de despacho saneador, o seguinte tema da prova: “se o autor tem condições financeiras superiores às da ré”.

    5. - O indeferimento questionado neste recurso cingiu-se, de forma expressa, ao ponto III da contestação, mas, por maioria de razão e uma vez que os meios probatórios são idênticos, tacitamente a decisão do Tribunal “a quo” acaba por também indeferir a prova quanto ao ponto II do requerimento probatório.

    6. - Nos termos do artigo 341º do Código Civil, as provas têm por função a demonstração da realidade fáctica objecto do processo.

    7. - Salvo as excepções previstas nos artigos 343º e 344º do Código Civil, quem invocar um direito incumbe a prova dos factos constitutivos do mesmo e à parte contrária a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que contra si é invocado (artigo 342º do Código Civil).

    8. - Cabe também ao Tribunal prover o processo, dentro dos limites legais e em ordem ao cumprimento do princípio do inquisitório (artigo 411º do C.P.C.), de todas as provas relevantes para o conhecimento da efectiva realidade fáctica. E devem ser atendidos não só os factos alegados como os que resultem da própria instrução.

    9. - Da leitura conjugada dos artigos 410º, 423º nº 1, 429º nº 2, 432º, e 443º, nº 1, do C.P.C., extrai-se que aos autos devem ser juntos os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa e que assim têm interesse para decisão da causa, tendo por referência que a estes fundamentos será aferida a pertinência ou necessidade da sua junção.

    10. - Os factos cujos documentos em causa visam provar não se encontram admitidos por acordo nem estão sujeitos a prova vinculada, pelo que, sendo relevantes carecem de instrução segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito.

    11. - A produção dos meios de prova não só pode, como deve, incidir não apenas sobre os factos essenciais que, directa e nuclearmente se reportem ao objecto do processo, entendido este tanto na perspectiva da acção como na da defesa, mas também sobre outros que, embora mediata ou indirectamente relacionados, são necessários ou instrumentais para a prova daqueles primeiros e para o apuramento da verdade material.

    12. - Ao Tribunal incumbe responder a factos e não a temas da prova.

    13. - As partes podem produzir provas ainda que sobre factos que não lhes incumba qualquer ónus da prova.

    14. - As provas devem ser produzidas quer sobre factos ocorridos (externos) quer sobre estados emocionais, psíquicos (internos), sejam reais ou hipotéticos.

    15. - São ainda considerados, para efeitos de instrução e prova, os factos referidos no artigo 5º, nº 2, do C.P.C., designadamente os complementares ou instrumentais, pois os mesmos permitem, mediante presunção, chegar à demonstração de factos principais - tendo, pois, uma função probatória que permitem ao Juiz, mesmo oficiosamente, considera-los para efeitos da instrução da causa.

    16. - A decisão sob recurso é, desde logo, contraditória, dado que a relevância dos documentos não se altera pelo circunstancialismo de o Tribunal ordenar a sua junção ou ser a própria parte a juntá-los.

    17. - Não é apontado, na decisão impugnada, qualquer fundamento ou motivo para não serem considerados relevantes os meios de prova requeridos pela Recorrente, no seu requerimento probatórios de fls.___.

    18. - A questão da admissibilidade dos requeridos meios de prova (alíneas a), d), e), f), g), h), i), j) e k), dos pontos II e III do requerimento probatório, em nada está relacionado com a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, pois de um lado temos a alegação e o ónus da prova e, de outro...

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