Acórdão nº 374/17.4T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução25 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório.

Radical Red Holdings, LLC e A… (AA) intentaram a presente ação declarativa, sob a forma do processo comum, contra Al… (R), pedindo: - seja declarada a caducidade da providência decretada no processo n.º 789/16.5T8FAR, que correu termos na Comarca de Faro - Faro - Instância Local - Secção Cível - J1; - seja ordenado o levantamento da suspensão da obra decretada na providência cautelar e, consequentemente, a não proceder à reconstrução das paredes e do telhado nos precisos termos em que se encontravam antes do início dos trabalhos de demolição; - o não reconhecimento da R como dona e legítima proprietária do prédio urbano sito em Montenegro, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, composto por casas de morada de um pavimento com três divisões assoalhadas, cozinha e casa de banho, com a área total de 517 m2, correspondendo a 126 m2 à área coberta e 390,90m2 à área descoberta, confrontando do Norte com lote 4, do Sul com lotes 1 e 2, Nascente com M… e do Poente com rua, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo … (anteriormente inscrito sob o artigo …, da freguesia de S. Pedro, concelho de Faro) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º …, adquirido por usucapião, no que se refere à configuração e limites; - se reconheça que a autora é dona e única proprietária e possuidora, com exclusão de outrem dos bens imóveis adquiridos nos termos do disposto no art.º 874.° e seguintes do Código Civil; - Prédio urbano, lote de terreno destinado a construção urbana, sito em Montenegro, Faro, denominado lote três, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, inscrito na respetiva matriz sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º …, da freguesia de Faro, Alvará de Loteamento de 30 de agosto de 2000; - Prédio urbano, lote de terreno destinado a construção urbana, sito em Montenegro, Faro, denominado lote quatro, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, inscrito na respetiva matriz sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.º …, da freguesia de Faro, Alvará de Loteamento de 30 de agosto de 2000; e que - a R seja condenada a abster-se de praticar quaisquer atos contra as propriedades da A supra descritas, com as devidas consequências legais.

Para fundamentar a sua pretensão invocam, em suma, que no âmbito do referido procedimento cautelar foi reconhecido o direito de propriedade da R sobre o prédio urbano descrito sob o n.º …, determinando-se a suspensão imediata da obra que levavam a efeito nos prédios que adquiriram no âmbito de processo de insolvência, bem como a reconstrução das paredes e telhado nos termos em que se encontravam antes dos trabalhos de demolição, decretando-se a inversão do contencioso, não pretendendo os autores que a decisão proferida se consolide como composição definitiva do litígio, na medida em que entendem não existir o direito de propriedade da ré sobre o identificado prédio urbano.

A R contestou, defendendo, em síntese, a aquisição por usucapião do direito de propriedade sobre o referido prédio urbano, concluindo pela manutenção da providência decretada.

Os AA apresentaram réplica, na qual se pronunciam pela improcedência do pedido reconvencional deduzido.

Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual foi declarada a inexistência de pedido reconvencional, considerando não escrita a resposta dos AA, proferido despacho saneador, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova, sem que tenha sido objeto de reclamação.

Foram habilitados como adquirentes do direito de propriedade da A T… e I….

Realizou-se a audiência final.

Na sentença a ação foi julgada improcedente, por não provada, e, em consequência, foi a R absolvida do pedido.

Os AA vieram recorrer da sentença, com as seguintes conclusões de recurso (transcrição): “I. Os prédios urbanos em causa nos autos, nomeadamente o prédio urbano, lote de terreno destinado a construção urbana, sito em Montenegro, Faro, denominado lote três, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, inscrito na respetiva matriz sob o artigo … “Lote 3”, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o número cinco mil trezentos e noventa e três e o prédio urbano, lote de terreno destinado a construção urbana, sito em Montenegro, Faro, denominado lote quatro, freguesia de Montenegro, concelho de Faro, inscrito na respetiva matriz sob o artigo …, “Lote 4”, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o número cinco mil trezentos e noventa e quatro, estão inseridos num loteamento urbano titulado pelo alvará n.º 5/2000, emitido pela Câmara Municipal de Faro.

  1. A constituição destes lotes e os correspondentes direitos sobre os mesmos adquiridos só poderiam ser anulados por meio de prévia revogação do alvará de loteamento ou pela anulação de tal ato administrativo.

  2. A existir qualquer vício do ato de licenciamento do loteamento, já há muito que se encontraria sanado pelo decurso do tempo, de acordo com o disposto nos art.ºs 58.º, 59.º e 168.º do CPA.

  3. A inscrição predial de um lote de terreno no âmbito da inscrição da constituição de um loteamento devidamente licenciado não pode ser cancelada sem que seja previamente cancelada a inscrição do loteamento que lhe deu origem.

  4. A ré nunca intentou qualquer ação nos tribunais administrativos para anulação do alvará de loteamento.

  5. Conclui-se que se verificou a caducidade do direito de ação da ré no que se refere ao pedido de revogação, anulação ou reconhecimento de nulidade do ato administrativo de licenciamento do loteamento, bem como da constituição dos lotes e das respetivas edificações, nos termos das supra citadas disposições legais.

  6. A anulação do alvará de loteamento seria da competência dos tribunais de jurisdição administrativa e nunca dos tribunais de jurisdição judicial, verificando-se incompetência absoluta dos tribunais judiciais para decidir de tal litígio.

  7. A determinação da competência do tribunal, em razão da matéria, deve ser fixada face ao teor da petição inicial e tomando em conta, por um lado, a pretensão formulada e, por outro, a relação jurídica ou situação factual descrita nessa peça processual.

  8. Face à identificação do objeto do litígio, à relação jurídica e situação factual descrita na petição inicial e às conclusões da senhora perita constantes dos Relatórios de Perícia e de Esclarecimentos de Perícia que o ato que alegadamente põe em causa o direito da recorrida é um ato administrativo.

  9. Nos termos do disposto nos artigos 96.º n.º 1 do CPC, os tribunais judiciais são totalmente incompetentes em razão de matéria do foro administrativo.

  10. De acordo com o art.º 4.º do ETAF, compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas a fiscalização da legalidade de atos administrativos praticados por quaisquer órgãos do Estado.

  11. Conclui-se que a constatação da ocorrência de infração às regras de competência material, consubstancia uma exceção dilatória típica, de conhecimento oficioso, determina a incompetência absoluta do tribunal, conforme arts. 96.º, al. a), 99.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, al. a), 576.º, n.º 2, 577.º, al. a), e 578.º, todos do CPC.

  12. O ato alegadamente ofensivo do direito invocado pela recorrida é um ato administrativo, emanado de entidade pública.

  13. Os processos intentados contra entidades públicas, a parte demandada deve ser a pessoa coletiva de direito público que pratica o ato, conforme estatui o art.º 10.º n.º2 do CPTA.

  14. Conclui-se que a recorrida instaurou procedimento cautelar contra os recorrentes que, atentos os fundamentos acima expostos, são parte ilegítima no referido procedimento, conforme disposto nos art.ºs 577.º e), 278.º n.º 1 d) e 279.º do CPC.

  15. Não existe compatibilidade entre o teor dos depoimentos das testemunhas, da prova documental e da prova pericial e os factos dados como provados XVII. Os depoimentos das testemunhas, arroladas pela ré, revelam-se contraditórios e nenhuma das destas testemunhas conseguiu indicar com exatidão o local onde, alegadamente, se situa o prédio de ré.

  16. Relativamente ao estado de conservação do prédio da ré à data dos factos, os depoimentos das várias testemunhas são contraditórios.

  17. Toda a prova testemunhal foi produzida por confrontação com o levantamento topográfico a fls. 355 dos autos, elaborado com base nas informações prestadas pela filha da ré, parte interessada na causa.

  18. O douto Relatório Pericial é totalmente omisso quanto aos documentos matriciais, registrais e cadastrais de todos os prédios, sem qualquer base científica, baseado unicamente no Levantamento Topográfico, a fls 355 dos autos, realizado pelos topógrafos J… e R….

  19. Conclui-se que face a prova testemunhal, prova documental e prova pericial produzida em sede de audiência de julgamento, impunha-se ao tribunal considerar como não provados os factos constantes dos pontos 3 a 13 e 27 a 29, da fundamentação de facto da douta sentença.

  20. Conclui-se que o douto tribunal a quo, atenta a prova produzida, deveria ter considerado provado que os lotes três e quatro, forma legalmente adquiridos pela autora Radical Red Holdings LLC, reconhecendo-se os autores T… e I… como legítimos proprietários dos referidos lotes, na sequência da aquisição dos mesmos por escritura pública de compra e venda à Radical Red Holdings, LLC.

  21. Conclui-se que o tribunal a quo não realizou convenientemente o exame critico das provas, conforme dispõe o art.º 607.º n.º 5 do CPC.

  22. Na douta sentença proferida, o tribunal a quo omitiu o conhecimento dos pedidos formulados pelos autores, ora recorrentes.

  23. Perante os pedidos formulados e a prova testemunhal e documental produzida, impunha-se ao tribunal a quo que se pronunciasse em concreto quanto ao direito de propriedade dos autores “Red Radical Holdings, LLC”, Irina Andreia Barbeiro Farinha e Telmo Edgar Custódio Sacramento, sobre os lotes 3 e 4.

  24. ...

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