Acórdão nº 2172/17.6T8LLE-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2021
Magistrado Responsável | MANUEL BARGADO |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO S… instaurou a presente ação executiva, com processo sumário, contra Aymana Holdings Limited e Urbaniágara - Investimentos Imobiliários, Lda.
, para haver delas o pagamento da quantia de € 960.000,00, acrescida de juros vencidos no montante de € 53.970,41 e vincendos, dando à execução as sentenças proferidas nos processos nºs 499/14.8TBLLE do Juízo Central Cível de Faro-J2 e 2380/16.7T8FAR do Juízo Central Cível de Faro- J3.
Por despacho proferido em 25.10.2020 foi oficiosamente suscitada a questão da ilegitimidade da executada Urbaniágara, Lda.
Cumprido o contraditório, a exequente pronunciou-se no sentido de que foi judicialmente reconhecido o direito de retenção da exequente, estando vedado ao Tribunal o conhecimento oficioso de tal questão, por se mostrar assente a existência daquele direito, acrescendo que o crédito garantido pelo direito de retenção corresponde ao crédito exequendo.
Subsequentemente foi proferida decisão, que, com fundamento na ilegitimidade da executada Urbaniágara, Lda., por não estar demonstrado o invocado direito real de garantia oponível a essa executada, rejeitou a execução quanto à mesma.
Inconformada, a exequente apelou do assim decidido, tendo finalizado a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem: «48. O argumento da Apelante é, em suma, o seguinte: a. A sentença do Proc. 499/14.8TBLLE foi proferida entre as mesmas partes desta execução, ou seja, a Exequente e a Executada Urbaniágara.
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Nessa sentença foi reconhecido, em decisão de mérito, o direito de retenção da Exequente sobre o imóvel da Executada Urbaniágara que foi penhorado nestes autos, para garantia do crédito exequendo sobre a também Executada Aymana.
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O reconhecimento do direito de retenção foi o antecedente lógico necessário da decisão de indeferir o pedido de entrega do referido imóvel, que a Executada Urbaniágara formulou no Proc. 499/14.8TBLLE.
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Assim sendo, essa decisão de reconhecimento do direito de retenção faz caso julgado entre as partes - isto é, entre a Exequente e a Executada Urbaniágara - não podendo a questão voltar a ser discutida entre ambas.
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Está, pois, vedado à Executada Urbaniágara opor-se ao exercício do direito de retenção por parte da Exequente, e a Exequente não precisa de mais nenhuma decisão judicial para obrigar a Executada Urbaniágara a respeitar o seu exercício do direito de retenção.
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Este efeito de caso julgado, relativamente à imposição de reconhecimento do direito de retenção, faz com que essa sentença seja título executivo, nos termos do art. 703º, n.º 1, al. a) do Cód. Proc. Civil, para que a Exequente possa aqui exercer aquele direito, em face da Executada Urbaniágara.
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Esse exercício engloba de forma indissociável não só a retenção, propriamente dita, do imóvel, cuja manifestação típica é a recusa da sua entrega à Executada Urbaniágara enquanto o crédito que detém sobre a Executada Aymana não for pago, mas também a sua execução para satisfação desse mesmo crédito.
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Esta dupla funcionalidade do direito de retenção resulta expressamente da lei. [art. 759, n.º 1 do Cód. Civil] i. Ao fazer penhorar o imóvel objeto do direito de retenção, a Exequente mais não faz do que exercer o direito que lhe foi reconhecido judicialmente, e ao qual a Executada Urbaniágara está definitivamente obrigada.
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A douta sentença recorrida, ao negar este direito, e ao pretender que a Exequente demande novamente a Executada Urbaniágara sobre a mesma questão, está a negar aplicação à sentença do Proc. 499/14.8TBLLE, o que lhe está vedado pelas regras do art. 619º, n.º 1 e do art. 625º do Cód. Proc. Civil.
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No entender da Apelante, a douta decisão violou as regras legais mencionadas no corpo das presentes alegações, nomeadamente os arts. 54º, n.º 2, 91º, n.º 2, 619°, n.° 1 e 625º do Cód. Proc. Civil, e 759º, n.º 1 do Cód. Civil.
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Por tudo o exposto, requer-se a V. Exas. reformem a douta decisão recorrida, aceitando que a Apelante dispõe de título executivo sobre a Apelada Urbaniágara, mandando prosseguir a execução.» Não foram apresentadas contra-alegações.
Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), a questão essencial decidenda é a de saber se a executada Urbaniágara é ou não parte legítima na execução.
III – FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Na decisão recorrida foi dada como provada a seguinte factualidade: 1 -A exequente apresenta como títulos executivos nesta ação duas sentenças: a proferida no processo n.º 499/14.8TBLLE do Juízo Central Cível de Faro-J2 e a proferida no processo n.º 2380/16.7T8FAR do Juízo Central Cível de Faro- J3.
2 - No referido processo n.º 499/14.8TBLLE do Juízo Central Cível de Faro-J2, em que foi Autora Urbaniágara - Investimentos Imobiliários, Lda. e Ré Sabina Margaret Kerr, foi proferida a sentença datada de 7/10/2015 onde foi decidido julgar parcialmente procedente a ação e, em consequência: -“Reconhecer a Autora Urbaniágara - Investimentos Imobiliários, Lda. como proprietária da fração autônoma designada pela letra E, correspondente ao rés-do-chão e 1° andar (Duplex), destinado a habitação, tipo Ti com um estacionamento e arrumo ao nível da cave e logradouro, sita na …, descrita na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o número … e inscrita na respetiva matriz predial urbana sob o artigo … da freguesia de Almancil; -Absolver a Ré S… do demais peticionado.” (cfr. sentença junta com o requerimento executivo e que aqui se dá por integralmente reproduzida).
3 - Consta no relatório da sentença acima referida: «Regularmente cilada, a Ré deduziu contestação e reconvenção, invocando que é, na qualidade de única herdeira do seu pai, promitente-compradora com traditio do imóvel em causa nos autos, já tendo sido pago 80% do valor acordado, ou seja, € 480.000,00, tendo celebrado contrato com a anterior proprietária da fração, não sabendo se a Autora assumiu a sua posição contratual.
Contudo, quer pela venda do imóvel à Autora, quer pela interpelação admonitória que fez à Autora, o contrato-promessa encontra-se definitivamente incumprido, sendo devido o sinal em dobro, no valor de € 960.000,00, pelo que goza do direito de retenção sobre o imóvel em causa.
Relativamente ao pedido reconvencional, a Ré requereu a intervenção principal provocada de terceiros (Banif - Banco internacional do Funchal SA, Aymana Holdings Liinlted, Pine Estates-Gestão c Administração de Imóveis, Lda., P… e Pe…), pretendendo que o Tribunal reconheça o incumprimento definitivo de um contrato-promessa de compra e venda do imóvel em causa nos autos alegadamente celebrado pelo seu falecido pai, de quem é a única...
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