Acórdão nº 1118/17.6T9EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelALBERTO BORGES
Data da Resolução12 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo de Instrução Criminal, correu termos o Proc. n.º 1118/17.6T9EVR, no qual foi decidido, por despacho de 10.07.2020, rejeitar, por inadmissibilidade legal, o requerimento de abertura de instrução apresentado pela assistente M…, nos autos melhor identificada (fol.ªs 474 a 475)

  1. Recorreu a assistente dessa decisão - que rejeitou o requerimento de abertura da instrução - concluindo a motivação do recurso com as seguintes conclusões: 1 - Nos autos de instrução criminal supra identificados, que correm termos na comarca da Évora, o Exm.º Juiz de Instrução, por despacho udicial de 10/07/2020, decidiu rejeitar o requerimento de abertura de instrução apresentado pela ora recorrente, por inadmissibilidade legal de instrução (por falta de objeto de instrução) – cfr. art.ºs 287 n.º 2 e 303 do CPP

    2 - Refere o douto despacho judicial recorrido que no requerimento de abertura de instrução formulado pela assistente “não é a feita a descrição factual com vista a satisfazer os requisitos legalmente exigidos, designadamente o elemento objetivo, o elemento volitivo do dolo (a vontade de praticar todos os elementos importantes do tipo criminal) e a culpa dolosa (a atuação forma livre, deliberada e consciente que a conduta em causa é prevista e punida por lei)”

    3 - E o douto despacho judicial refere ainda que “o requerimento não descreve os factos que legitimam uma aplicação de uma pena ao denunciado”

    4 - Contudo, não pode a ora recorrente concordar com tal juízo, em virtude do requerimento para abertura da instrução formulado pela ora recorrente, independentemente dos estilos, cumpre todos os requisitos legais, quer formais quer substantivos

    5 - Mais, o que nem por motivos esquemáticos foge ao quadro geral comum deste tipo de atos e, não obstante, estabelece a lei, no art.º 287 n.º 2 do CPP, que o requerimento para abertura da instrução não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como, sempre que disso for o caso, a indicação dos atos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e de outros, se espera provar, sendo ainda aplicável no requerimento do assistente o disposto nas al.ªs b) e c) do n.º 3 do art.º 283

    6 - E a realidade, é que o requerimento para abertura da instrução só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução, conforme estabelece o n.º 3 do art. 287.º do C.P.P., não ocorrendo no caso concreto nenhuma dessas situações

    7 - Nem sequer se pode concordar com a imputação das deficiências do requerimento para abertura de instrução, maxime a alegada falta de descrição factual com vista a satisfazer os requisitos legalmente exigidos, nem com a falta dos factos que legitimam uma aplicação de uma pena ao denunciado

    8 - Com efeito, o requerimento de abertura de instrução faz uma breve descrição dos factos, das diligências desenvolvidas em sede de inquérito, bem como das diligências que deverão ser realizadas em sede de instrução, face à inexistência das mesmas naquela sede

    9 - E sublinhe-se que as diligências requeridas no requerimento de abertura de instrução que para além de terem sido preteridas em sede de inquérito, constituem, de per si, autênticos atos de instrução, imprescindíveis para uma completa aferição da pronúncia ou não do denunciado. 10 - Pelo que descrição factual com vista a satisfazer os requisitos legalmente exigidos, bem como, os factos que legitimam uma aplicação de uma pena ao denunciado constam do requerimento de abertura de instrução, ao contrário, com o devido respeito, do sentido em que decidiu a Mm.º Juiz de Instrução

    11 - Pelo que jamais se pode concordar com a fundamentação do despacho ora recorrido e o qual rejeitou assim o requerimento formulado pela ora recorrente

    12 - E nestes termos, a decisão recorrida é ilegal, violando assim as disposições dos art.ºs 69 n.º 2 alínea a), 287 n.ºs 2 e 3 e 286, ambos do CPP, e bem assim o disposto no art.º 20 da Constituição da República Portuguesa

    13 - Por seu turno e por dever de patrocínio, atentos a que douto despacho judicial ainda pugna pela impossibilidade de prolação de despacho de aperfeiçoamento, atenta a jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça

    14 - Ora, de acordo com a Jurisprudência Uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça, prolatada nos acórdãos n.º 7/2005, de 12 maio, e n.º 1/2015, de 20 de novembro de 2014, e que veio preencher as lacunas de interpretação relativamente à possibilidade de utilização do mecanismo de aperfeiçoamento no art.º 287 do CPP, apenas se restringe tal possibilidade à "narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido" e à falta de descrição, na acusação, dos elementos subjetivos do crime

    15 - Assim, tal como explanado no douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto. de 13-01-2016, no Processo n.º 136/14, "Esta redação restritiva exclui todas as outras passiveis deficiências de que possa sofrer o requerimento de abertura de Instrução do assistente, não impedindo o convite ao aperfeiçoamento, quanto às mesmas"

    16 – E como ensina o Prof. Germano Marques da silva, “entre as causas de rejeição do requerimento para abertura de instrução previstas taxativamente no n.º 3 do art.º 287 conta-se a “inadmissibilidade legal da instrução”. Neste conceito cabem apenas as deficiências de conteúdo de tal requerimento, nomeadamente, quando dele resultar falta da tipicidade da conduta – e não as suas deficiências formais”

    17 - Como também no douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 24-10-2017, no Processo n.º 1383/16.6T9BJA.E1, é afirmado que “Tudo o mais são factos, relevantes mas não essenciais ao preenchimento do tipo (que se enquadram naqueles que devem ser narrados na acusação, e portanto também no RAI do assistente, se possível – al. b) do nº 3 do art. 283º do C.P.P.), cuja indagação e acrescento é possível (seja por via do convite ao aperfeiçoamento – que não é afastado nos casos como o presente pela jurisprudência fixada pelo AUJ nº 1/2015 -, seja oficiosamente, ao abrigo do disposto no art. 303º do C.P.P. e com observância do dever de comunicação estabelecido no seu nº 1), em virtude de não se traduzirem numa alteração substancial dos factos descritos no RAI (essa não permitida porque redundaria na transformação de factos inócuos em factos juridicamente relevantes, o que não sucede no caso, na medida em que aqueles que foram descritos, de per si, já se integram nesta última categoria)

    Em suma, pese embora as indesmentíveis deficiências do RAI apresentado pela ora recorrente, consideramos que elas não são de molde a inviabilizar a eventual prolação de um despacho de pronúncia e, por isso, também não constituem fundamento bastante para fundamentar a decisão de rejeição que foi proferida, a qual, por isso, não pode subsistir”

    18 – E em rigor, sendo que o requerimento de abertura de instrução é um articulado autónomo, não pode ser desentranhado do restante articulado processual

    19 - Por isso mesmo, a simples rejeição do requerimento pela alegada falta de descrição factual com vista a satisfazer os requisitos legalmente exigidos e da falta dos factos que legitimam uma aplicação de uma pena ao denunciado, traduz-se num formalismo exacerbado em detrimento da procura da justiça e verdade material, conduzindo a uma efetiva sonegação da justiça

    20 - E sendo certo que o requerimento de abertura de instrução contém todos os elementos necessários, para que ao denunciado possa vir a ser aplicada uma pena, resultando inequívoco o...

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