Acórdão nº 7362/18.1T8STB.-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | TOMÉ RAMIÃO |
Data da Resolução | 28 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam no Tribunal da Relação de Évora I- Relatório.
Por apenso à execução sumária para pagamento de quantia certa instaurada por C …, CRL, contra S…, Unipessoal, Lda., e J…, este veio deduzir oposição à execução, alegando: - Constando da livrança dada à execução que a mesma deve ser paga a “C… ou à sua ordem”, mas sendo a denominação da exequente “C…, CRL”, a referida livrança não identifica a exequente como sendo a pessoa a quem ou à ordem de quem a quantia deve ser paga, faltando por isso um dos elementos essenciais para que o título produza efeito como livrança; - Apenas a mutuária se obrigou ao pagamento dos juros moratórios referidos no artigo 7º do requerimento executivo, não o avalista, ora embargante; - A primeira prestação, vencida em 26.01.2019, foi paga em 06.02.2018, tal como resulta do doc. n.º 6 junto com o requerimento executivo; - A carta a que respeita o doc. n.º 5 foi enviada para destino que já não correspondia à morada dele, embargante, sendo que a exequente conhecia a morada correta (a indicada no doc. n.º 1); - Uma vez que a perda do benefício do prazo em relação ao mutuário não se estende aos coobrigados do devedor nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia, ele, embargante, continua a poder cumprir as prestações convencionadas dentro dos prazos contratualmente acordados, pelo que a obrigação é inexigível; - Considerando que a exequente não o interpelou a ele, embargante, não lhe podem ser exigidos os juros moratórios a partir da data de vencimento da livrança, mas apenas a partir da citação, à taxa de 4% ao ano, não à taxa indicada pela exequente.
Concluiu pedindo que se julguem os embargos procedentes, extinguindo-se a execução.
A exequente contestou alegando, em síntese, o seguinte: - a livrança identifica como local de pagamento/domiciliação Alcobaça, C…CRL, indica como local Alcobaça, como data de emissão 26.02.2018, como valor € 321.329,08, como data de vencimento 04.10.2018, e contém a menção “Recebido por empréstimo nos termos e condições do contrato de mútuo com aval nº 56064203921”, bem como a menção de que “no seu vencimento pagaremos por esta única via de livrança” a “C…, ou à sua ordem a quantia de trezentos e vinte e um mil trezentos e vinte e nove euros e oito cêntimos”; - Apesar de no documento não haver espaço para se escrever o nome completo “C… CRL”, mas apenas o nome abreviado “C…”, só por má-fé pode o embargante alegar que a livrança dada à execução não identifica a exequente como a pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga a livrança; - A livrança de que o embargante é avalista foi preenchida face ao incumprimento da prestação vencida em 26.02.2018, com respeito pelo pacto de preenchimento; - Apesar de ter sido informado da situação de incumprimento, por telefone e por e-mail, o avalista não tinha que ser interpelado para pagamento da dívida, previamente ao preenchimento do título; - Enquanto avalista, o embargante está obrigado a pagar todos os valores devidos pela subscritora, incluindo os juros moratórios; - Embora tenha sido efetuado o pagamento, em 06.02.2018, da prestação vencida em 26.01.2018, a prestação vencida em 26.02.2018 não foi paga; - Os juros são devidos a partir da data de vencimento da livrança, à taxa de 5,50 %, acrescida da sobretaxa de 3%.
Pugnou pela improcedência dos embargos.
Foi proferido saneador sentença que julgou “os embargos parcialmente procedentes e determinou o prosseguimento da execução para pagamento da quantia constante da livrança, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, contados a partir da citação”.
Desta sentença veio o embargante/executado interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1) A Exequente e Embargada tem a denominação social de “C…, CRL”, e é uma caixa de crédito agrícola mútuo; 2) A expressão “Caixa de Crédito Agrícola” ou “CaixaCréditoAgrícola”, não é o nome abreviado da Embargada, mas sim a designação genérica que se aplica a todas as instituições de crédito, sob a forma de cooperativa, correspondentes, precisamente, a caixas de crédito agrícola mútuo, como é o caso da Embargada; 3) A livrança dada à execução não identifica a Exequente como sendo a pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga, na medida em que a expressão “Caixa de Crédito Agrícola” ou “CaixaCréditoAgrícola”, nela aposta, é de cariz genérico e faz parte da denominação social das oitenta instituições de crédito correspondentes a caixas de crédito agrícola, entre as quais se inclui a Exequente; 4) A expressão “Caixa de Crédito Agrícola” ou “CaixaCréditoAgrícola”, aposta na livrança dada à execução, no local destinado à identificação da pessoa a quem ou à ordem de quem a livrança deve ser paga, só por si não distingue a Exequente das demais 79 instituições de crédito que integram na sua denominação social essa mesma expressão; 5) A livrança dada à execução não identifica, pois, a pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga, nomeadamente, não identifica a Exequente como sendo essa pessoa, pelo que lhe falta o elemento essencial previsto no art.º 75.º, n.º 5, da LULL, o que, nos termos previstos no art.º 76.º da mesma Lei Uniforme, determina que tal documento não produza efeito como livrança; 6) O que significa que tal documento não se encontra revestido de força executiva, não constituindo, por isso, título executivo, pois não corresponde a um título de crédito, à luz do disposto no art.º 703.º, n.º 1, alínea c), do CPC; 7) A sentença recorrida violou as normas constantes dos art.ºs 75.º, n.º 5 e 76.º, ambos da LULL, e do art.º 703.º, n.º 1, alínea c), do CPC; 8) A sentença recorrida deveria ter aplicado as normas constantes dos art.ºs 75.º, n.º 5 e 76.º, ambos da LULL, e do art.º 703.º, n.º 1, alínea c), do CPC e, consequentemente, deveria ter decidido que o título dado à execução não produz efeito como livrança e não se encontra revestido de força executiva; 9) O co Executado, ora Embargante, foi demandado na qualidade de avalista e garante da obrigação exequenda; 10) A Exequente preencheu a livrança ora dada à execução, nela indicando, como importância em dívida a de € 321.329,08, que abrange a totalidade do capital considerado vencido, acrescido de juros remuneratórios, juros moratórios, imposto de selo sobre os juros e comissão, e cujo pagamento veio exigir à devedora S… e ao co- Executado, ora embargante; 11) A Exequente considerou imediatamente vencidas todas as prestações para reembolso de capital e juros; 12) A perda do benefício do prazo, determinada por força do estabelecido no art.º 781.º do Código Civil e na cláusula 6.ª, n.º 1, do “Contrato de Mútuo com Aval e Hipoteca Autónoma” junto como doc. n.º 1 ao requerimento executivo, não se estende aos coobrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia, por força do disposto no art.º 782.º do Código Civil; 13) A perda do benefício do prazo não se estende ao garante hipotecário e avalista, ora co Executado e Embargante, pelo que o mesmo continua a poder cumprir as prestações convencionadas entre a Exequente e a devedor S…, nos seus exatos termos, dentro dos prazos contratualmente acordados; 14) O que significa que a obrigação exequenda é, para o ora co Executado e Embargante, inexigível, pois carece do requisito da exigibilidade previsto no art.º 713.º do CPC; 15) Não sendo a obrigação exequenda exigível, nos termos previstos no art.º 713.º do CPC, a mesma não pode ser objeto da ação executiva, que deveria, por isso, ter sido declarada extinta, nos termos do art.º 732.º, n.º 4, do mesmo Código; 16) A sentença recorrida violou as normas constantes dos art.ºs 782.º do Código Civil e 713.º do CPC; 17) A sentença recorrida deveria ter aplicado as referidas normas e, consequentemente, deveria ter julgado que a perda do benefício do prazo não se estende ao garante hipotecário e avalista, ora co Executado e Embargante, e que a obrigação exequenda é inexigível, pois carece do requisito da inexigibilidade previsto no art.º 713.º do CPC.
Termos em que deve o presente recurso de apelação ser julgado procedente, devendo, consequentemente, a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por douto Acórdão que julgue os embargos de executado totalmente procedentes e declare extinta a execução.
***Não foram juntas contra-alegações.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
***II – Âmbito do Recurso.
Perante o teor das conclusões formuladas pelo recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº3, 639.º/1, todos do C. P. Civil em vigor, constata-se que as questões essenciais a decidir são as seguintes:
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Se a livrança dada à execução constitui título executivo.
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Se a obrigação exequenda é, para o ora co Executado e Embargante, inexigível.
***III – Fundamentação fáctico-jurídica.
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Matéria de facto.
1.1.
A matéria de facto considerada pela 1.ª instância, não impugnada, é a seguinte: 1. A exequente é portadora de uma livrança na qual figura como subscritora a executada S…, Unipessoal, Lda.
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O embargante apôs a sua assinatura na face posterior da livrança a que se alude no ponto anterior, surgindo a referida assinatura encimada pela menção “Dou o meu aval à firma subscritora desta livrança”.
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A referida livrança foi emitida pela importância de € 321.329,08, e preenchida com as datas de 2018.02.26 e de 2018.10.04 como sendo as datas de emissão e de vencimento, respetivamente.
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Constam da livrança as seguintes menções: - “Alcobaça (…), CCAM … CRL”, como local de pagamento/domiciliação; - “Recebido por empréstimo nos termos e condições do contrato de mútuo com aval nº 56064203921”; - “CaixaCréditoAgrícola ou à sua ordem, a quantia de trezentos e vinte e um mil trezentos e vinte e nove euros e oito cêntimos”...
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