Acórdão nº 1218/18.5T8MMN-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelMATA RIBEIRO
Data da Resolução28 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA M… deduziu embargos à execução que lhes move Banco …, S.A.

, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Évora (Juízo de Execução de Montemor-o-Novo), em que o título executivo é uma livrança, peticionando que pela procedência dos embargos se julgue extinta a execução alegando, em síntese: - A responsabilidade pelo pagamento à exequente do valor mutuado foi transferida para a seguradora Companhia de Seguros …, S. A., tendo em consideração o contrato de seguro de vida celebrado em nome do cônjuge da embargante, aquando da outorga do contrato de mútuo, cujo não pagamento total e consequente resolução do contrato, originou o preenchimento da livrança dada à execução, pelo que atenta a circunstância do cônjuge da embargante ter falecido, tal determinou o acionamento daquele contrato de seguro, descartando a responsabilidade da executada no pagamento de qualquer quantia originária no contrato de mútuo que tinha o contrato de seguro conexo.

Na petição requereu, também, a embargante a intervenção principal da aludida seguradora, intervenção que não viria a ser admitida por despacho de 11/08/2019.

Notificado do teor da petição o embargado/exequente, veio contestar, pondo em causa a versão da embargante, quanto ao declinar da responsabilidade, concluindo pela improcedência dos embargos.

Em 06/02/2020 foi proferido saneador sentença tendo-se decidido julgar procedentes os embargos e determinar a extinção da execução. * Irresignado, veio o embargado interpor recurso de apelação tendo apresentado as respetivas alegações, terminando por formular as seguintes «conclusões»[1] que se transcrevem: “1. Vem o presente recurso da não conformação do exequente/embargado, Banco … S.A., ora recorrente, com a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, que decidiu julgar totalmente procedentes os embargos de executado apresentados pela Embargante.

  1. Estribou a douta sentença a sua fundamentação na inexequibilidade da pretensão exequenda com os seguintes - sumariados – fundamentos: O banco financiador, que negociou com o seu cliente o empréstimo, impõe concomitantemente, a celebração de um seguro de vida, garantindo desse modo eventuais vicissitude previstas no contrato de seguro, pelo que, nesta senda, fica vinculado, segundo a boa fé contratual de, na vigência de tal contrato, atentar devidamente nos interesses do seu cliente, na qualidade de pessoa segura, de modo a assegurar que, tendo o Banco conhecimento que aquele faleceu e que esta realidade está a coberto do seguro, por tal ter sido comunicado pelo cliente, lhe sejam fornecidas todas as necessárias informações tendo em vista o efetivo funcionamento do seguro – v. neste sentido ac. RC de 18.12.2013 e ac. STJ de 03.02.2009, ambos disponíveis in “www.dgsi.pt”.

    Deste modo, pode atestar-se que J… celebrou um contrato de seguro de vida em caso de morte, que tinha por objeto assegurar e garantir em caso da sua morte o pagamento do montante em dívida de capital, relativo ao empréstimo acordado entre ele, a embargante e o banco exequente.

    Face a esta união de ambos os contratos, considera-se que o garante ou co-obrigado apenas poderão ser demandados para o cumprimento do contrato de crédito depois de o banco ter esgotado a possibilidade de satisfação do seu crédito por via do funcionamento do contrato de seguro.

  2. Acontece, porém, que, salvo mais douto entendimento, mal andou o Tribunal a quo, em decidir como decidiu, não se encontrando a decisão final proferida congruente com a prova documental carreada aos autos, encontrando-se assim pontos de facto incorretamente julgados.

  3. Na nossa modesta opinião, a sentença recorrida enferma de um lapso basilar ao desconsiderar a prova produzida no que diz respeito à atuação do Embargado junto da Embargante e da respetiva Companhia de Seguros, no âmbito do acionamento do procedimento indemnizatório, nomeadamente de intermediação, acionamento e acompanhamento pelo Embargado junto da Embargante e da respetiva Companhia de Seguros.

  4. Face à factualidade dada como provada, resulta manifesto que entre a Embargante e o falecido J… por uma lado e o Embargado, Banco …, S.A., foi celebrado um contrato de crédito pessoal n.º 009485155830003.

  5. Ora o contrato de mútuo vem definido no artigo 1143.º do Código Civil, como sendo o contrato através do qual o mutuante empresta certa coisa a outra, mutuários, sendo tal objeto emprestado em dinheiro ficando o mutuário obrigado a restituir outro tanto do mesmo género ou qualidade.

  6. Da matéria de facto provada resulta ainda que, associado ao contrato de crédito pessoal, foi celebrado um contrato de seguro destinado a assegurar o pagamento das prestações em dívida do mútuo em caso de falecimento do mutuário.

  7. O mutuário faleceu no dia 14.02.2017 conforme facto provado número 7.

  8. Pretendeu a Embargante, que por força do seguro de vida contratado no âmbito do referido contrato de crédito pessoal que a responsabilidade pelo pagamento dos valores em divida se achasse automaticamente transferida para a Companhia de Seguros, o que significa no seu entendimento que decorrido o sinistro estaria desvinculada da obrigação exequenda face à existência daquele seguro, respondendo assim a Seguradora pela dívida.

  9. O Tribunal a quo julgou tal defesa totalmente procedente, estribando-se a fundamentação da douta sentença com base na alegada inexequibilidade da pretensão exequenda, não por o Exequente ter diligenciado pelo pagamento em primeiro lugar junto da Companhia de seguros, mas antes fundamentando que não esgotou o Exequente a possibilidade de satisfação do seu crédito por via do funcionamento do contrato de seguro… Ora, não poderá o recorrente deixar de discordar com tal entendimento.

  10. Primeiramente, o facto de existir a contratação de um seguro de vida entre a Companhia de Seguros …, S.A. e o Mutuário falecido, em nada desresponsabiliza a devedora do pagamento para com o Embargado, pois não há transmissão automática e sem reservas da obrigação para a Seguradora.

  11. No mais, os contratos de seguro constituem um verdadeiro contrato comercial nos termos dos artigos 425.º e 455.º do Código Comercial, de onde emerge a solidariedade existente entre a Pessoa Segura e a Seguradora na obrigação do pagamento das prestações em dívida para com o exequente.

  12. Na denominada Lei do Contrato de Seguro (cfr. DL nº 72/2008, de 16.8), o contrato de seguro rege-se pelo princípio da liberdade contratual, com os limites indicados na lei, aplicando-se subsidiariamente as disposições da lei comercial e da lei civil.

  13. Assim sendo, e em qualquer dos quadros normativos, nas obrigações comerciais os co-obrigados respondem solidariamente, salvo estipulação em contrário (artigo 100.º do Código Comercial), dispondo o credor da faculdade de exigir o cumprimento de qualquer dos devedores solidários (artigo 519º do Código Civil).

  14. No caso dos autos, e porque se trata de uma obrigação solidária, cada um dos devedores responde pela prestação integral e a satisfação desta a todos libera, dado que o seguro surge em associação ao contrato de mútuo, enquanto reforço da garantia prestada pelos respetivos mutuários.

  15. Neste âmbito e contrariamente ao entendimento adotado pelo douto Tribunal a quo, o entendimento proferido em douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27.10.2009, por referência a um contrato de mútuo garantido por hipoteca e acionamento de seguro de vida, donde se refere o seguinte: «…, a nosso ver, a resposta só poderá ser negativa. É que o seguro de vida, tendo o carácter de (mero) reforço da hipoteca, não pode neutralizar a garantia resultante da hipoteca, o que sucederia se se concluísse pela não exigibilidade da dívida inserida no título executivo (pese embora ela não tivesse solvida). Não é possível, assim, concluir-se que o banco mutuante só do segurador pode exigir a prestação. Com o contrato de seguro ficou outro património adstrito à satisfação das obrigações contraídas pelos mutuários. Mas não ocorreu a substituição do património dos mutuários pelo património do segurador. As obrigações do segurador foram colocadas ao lado das do mutuário e não em sua substituição. (…). A garantia resultante da hipoteca subsiste, tendo o exequente buscado (precisamente) nessa segurança, o cumprimento da obrigação. Assim sendo, a validade (ou não) do seguro é questão sem interesse para o presente caso. Mesmo que o seguro estivesse activo e subsistisse, isso não seria impeditivo de o Banco exequente, com base no documento que titula a dívida, propusesse a execução, com vista ao pagamento, desencadeando e tornando efectiva (se necessária) a garantia resultante da hipoteca. Claro que isto não quer dizer que satisfeita a obrigação e entendendo-se que o seguro se encontrava válido à data do sinistro (morte do mutuário), não possa a executada demandar a seguradora exigindo dela a indemnização correspondente. Antes pelo contrário, somos em crer, (…), que satisfeita a...

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