Acórdão nº 41/08.0TBSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | ELISABETE VALENTE |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório.
D…, veio por apenso à execução deduzir Embargos de Executada, contra “Caixa …”, Exequente, requerendo a extinção da execução.
Alegou, em suma, que a obrigação não é exigível quanto a si pois que nunca foi interpelada para pagar a dívida; que o vencimento antecipado da obrigação não teve fundamento legal; que a citação não supre a falta de interpelação; que o requerimento executivo é inepto pois não alega que facto fundamentou o pretenso vencimento antecipado das prestações em dívida e, por isso, padece de ininteligibilidade; que metade do imóvel já foi vendido e não foi reflectido no valor da quantia exequenda, sendo a penhora feita na execução excessiva; que a venda do imóvel à sua revelia impediu-a de se sub-rogar nos direitos do credor; que deve ser liberada da sua obrigação, quanto mais não seja, pelo princípio da boa-fé.
Recebidos os embargos e notificada a embargada, veio esta contestar alegando, em suma, que interpelou a Embargante para pagar a dívida; que o contrato previa a resolução com base no incumprimento de qualquer das obrigações assumidas; que a citação sempre se consubstancia numa interpelação judicial para pagamento; que o requerimento executivo não é inepto; que a dívida actual é de € 29.773,44; que inexiste uma actuação sua em abuso de direito.
Teve lugar a audiência prévia e foi proferido despacho saneador, que indeferiu a excepção de ineptidão do requerimento executivo e definiu o objecto do litígio e temas de prova.
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento Foi proferida sentença que julgou improcedente a oposição à execução mediante embargos da Executada e, em consequência, determinou o ulterior prosseguimento da execução.
Inconformada com tal decisão, veio a embargante interpor recurso contra a mesma, apresentando as seguintes as conclusões do recurso (transcrição): «1. Não pode a Embargante, ora Apelante, acompanhar a sentença ora impugnada, nem conformar-se com a mesma, pelo que dela vem interpor o presente Recurso de Apelação, invocando a nulidade da mesma, por existir uma clara oposição dos fundamentos invocados com a decisão proferida e por omissão de pronúncia relativamente às exceções de inexigibilidade da obrigação por falta de interpelação válida para efeitos de perda do benefício do prazo e do Abuso de Direito, invocadas em sede de Embargos de Executada, o que faz com os seguintes fundamentos 2. A Embargada/Exequente instaurou a ação executiva janeiro de 2014, contra os Executados J… e C…, na qualidade de compradores/mutuários e contra a Embargante, ora Apelante, na qualidade de fiadora, reclamando o pagamento da quantia exequenda no valor total de € 101.462,82 (cento e um mil, quatrocentos e sessenta e dois euros e oitenta e dois cêntimos) correspondente ao capital mutuado acrescido de juros à taxa remuneratória e moratória calculados desde 11.01.2013, mais despesas.
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A Embargante, ora Apelante, a contrario dos restantes Executados, só foi citada em julho de 2019, ou seja, mais de cinco anos e meio depois da entrada em juízo da ação executiva, para pagar a totalidade da quantia exequenda constante do Requerimento inicial apresentado em 08.01.2014, tendo sido ordenada a penhora de 1/3 da sua pensão de reforma até ao limite de € 106.535,96, correspondente à totalidade da quantia exequenda peticionada em 2014, acrescida de despesas prováveis no valor de € 5.073,14.
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Em sede de Embargos de executado a Embargante invocou que a quantia exequenda era manifestamente excessiva, ilegal e infundada, uma vez que o proveito da venda do imóvel hipotecado não tinha sido abatido ao valor da divida.
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Por sua vez, na Contestação aos embargos, a Embargada/Exequente confessou assistir total razão à Embargante, por, efetivamente, não ter sido deduzido à quantia exequenda o valor da venda do imóvel, confessando estar em dívida apenas a quantia de € 29.773,44.
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Face à confissão da Embargada, a Mma. Juiz a quo decidiu em conformidade e reduziu o valor da quantia exequenda, para o valor de € 29.773,44 (vinte e nove mil, setecentos e setenta e três euros e quarenta e quatro euros).
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Donde se conclui que, pelo menos nesta parte, os Embargos de Executado procederam integralmente, pelo que a decisão de não procedência total dos embargos está em oposição com os fundamentos da Sentença ora impugnada, pelo que é nula nos termos do disposto na al.c) do n.º 1 do art.º 615º do C.P.C. na atual redação, nulidade que ora se invoca.
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Ademais, em consequência da procedência nesta parte dos embargos, com fixação do novo valor da quantia exequenda, deveria a Mma. Juiz a quo ter condenado as partes em custas na proporção do decaimento, e não apenas a cargo da Embargante, como erradamente fez, pelo que se impõe uma alteração na condenação em custas, o que também se requer.
I – Da nulidade nos termos do artigo 615º n.º 1 al. d) por omissão de pronúncia sobre a invocada exceção de inexigibilidade da obrigação exequenda relativamente à Embargante/Fiadora por falta de interpelação válida relativamente à perda do benefício do prazo 9. Em sede de Embargos de Executado, a Embargante, ora Apelante, alegou que a Fiadora não foi interpelada pela Exequente do alegado incumprimento do contrato por parte dos mutuários, não lhe tendo sido dada a oportunidade de se substituir aos mutuários no cumprimento das obrigações que os mesmos assumiram no contrato.
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Pelo que, in casu, o alegado vencimento antecipado das obrigações assumidas pelas partes contratantes, relativamente à Embargante/Fiadora, ora Apelante, não tem qualquer fundamento legal ou contratual.
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Mais alegou que, ainda que a Exequente tivesse procedido à interpelação dos Executados/mutuários, com a advertência de que o não pagamento originaria o consequente vencimento das prestações restantes e a resolução do contrato, tal perda do benefício do prazo não produziria quaisquer efeitos relativamente à Fiadora/Embargante, ora Apelante, uma vez que, nos termos do disposto no art.º 782º do C.C. “A perda do benefício do prazo não se estende aos co-obrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia.” 12.Pelo exposto, ainda que relativamente aos Executados/Mutuários a falta do pagamento de uma prestação pudesse, sem conceder, implicar o vencimento imediato das restantes (art.º 781º do C.C.) relativamente à Executada/Fiadora não operaria ope legis a perda do benefício do prazo, sem que a mesma fosse interpelada, pela Exequente, para assumir a posição do devedor principal, pagando as prestações vencidas e as que se fossem vencendo no decurso do tempo, obstando à perda do benefício do prazo.
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Mais alegou ainda que, contrariamente ao que a Mma. Juiz a quo pretende fazer crer, a citação para a ação executiva não supre a falta de tal interpelação, uma vez que, através dela, não foi dada a oportunidade à Fiadora/Embargante, de pagar as prestações vencidas, evitando assim a exigibilidade das vincendas e usufruindo das condições e garantias assumidas no contrato de mútuo.
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Tendo concluído pela inexigibilidade da obrigação exequenda relativamente à Embargante/Fiadora, invocando essa exceção nos termos da al.e) do art.º 729º do C.P.C. uma vez que, face à ausência de interpelação válida para esse efeito concreto, nunca a perda do benefício do prazo seria extensível à Fiadora/Embargante, ora Apelante.
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Acontece que, sobre esta invocada exceção, a Mma. Juiz não se pronunciou.
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Efetivamente, salvo o devido respeito, a Mma. Juiz a quo, não apreendeu o alcance da exceção invocada pela Embargante, confundindo a falta de interpelação para efeitos da perda do benefício do prazo com a falta de interpelação para efeitos da própria resolução do contrato.
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Porém, é jurisprudência pacífica que, para que a interpelação de um fiador produza o efeito de lhe estender a perda do benefício do prazo, não basta ser-lhe dirigida, pois tem de inequivocamente o informar de que “… encontrando-se determinadas quantias em falta, lhe é dado um determinado prazo para cumprir, sob pena de vencimento das restantes prestações…” (cfr., entre outros, o Acórdão do TRC 16.10.2018).
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Assim, uma vez que a Fiadora/Embargante, ora Apelante, foi citada para a ação executiva, em julho de 2019, mais de cinco anos depois da entrada do requerimento executivo e já depois de se encontrar esgotada a garantia real hipotecária, tal citação não supre a falta de interpelação para os referidos efeitos de perda do benefício do prazo ou sub-rogação, pois como é bom de ver, já não é de todo possível à Fiadora usufruir dos seus direitos legítimos de, na qualidade de fiadora, se substituir aos principais devedores (obstando ao vencimento antecipado das prestações vincendas e ao pagamento de juros remuneratórios e moratórios) nem de se sub-rogar nos direitos dos principais devedores.
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Donde se conclui que, também por omissão de pronúncia sobre a invocada exceção de inexigibilidade da obrigação exequenda relativamente à Embargante/Fiadora (al. e) do art.º 729º do C.P.C.), a Sentença ora impugnada é nula nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 615º do C.P.C. na atual redação, nulidade que também se invoca.
II – Da nulidade nos termos do artigo 615º n.º 1 al. d) por omissão de pronúncia sobre a invocada exceção do Abuso de Direito / Liberação por impossibilidade de sub-rogação 20.Na Sentença ora impugnada, foi dado como provado que a presente ação executiva foi instaurada em 15.01.2014 contra os principais mutuários e contra a fiadora/Embargante, ora Apelante (Ponto 1. da Fundamentação).
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Mais resultou provado que a Fiadora/Embargante, ora Apelante, apenas foi citada em 2019, já depois da adjudicação do imóvel hipotecado (Ponto 12. da Fundamentação).
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Em sede de Embargos de executada, a Embargante, ora Apelante, invocou a exceção do Abuso de Direito e alegou que, face à citação tardia, se viu coartada de defender na plenitude os seus direitos, nomeadamente e entre...
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