Acórdão nº 879/17.7T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | ELISABETE VALENTE |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1- Relatório.
P…, divorciado, empresário, com domicílio na Rua …, Évora intentou acção de condenação sob a forma de processo comum contra SEGURADORA…, S.A. com sede na …, Lisboa, pedindo que a acção seja julgada procedente por provada e, em consequência condenar-se a Ré a pagar ao Autor: a) a quantia de € 3.624,51 (três mil seiscentos e vinte e quatro euros e cinquenta e um cêntimo) a título de indemnização pelo dano no veículo; b) a quantia de € 115,20 (cento e quinze euros e vinte cêntimos) por dia - desde 24 de Julho de 2015 até à data em que o veículo danificado se encontrar em condições de circulação a título indemnizatório pela privação do uso; c) a quantia de € 10,00 (dez euros) por dia, acrescido de IVA pelo parqueamento na oficina do veículo em causa; d) tudo acrescido de juros de mora à taxa legal aplicável desde a citação até integral pagamento.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento da causa.
Foi então proferida sentença, onde a ação foi julgada parcialmente procedente por provada e em consequência a Ré SEGURADORA…, S.A. foi condenada a pagar ao Autor P… a quantia de € 3.624,51 (três mil seiscentos e vinte e quatro euros e cinquenta e um cêntimos) acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento.
Inconformado com a sentença o A interpôs recurso contra a mesma, formulando as seguintes conclusões (transcrição): «
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O Tribunal a quo decidiu, e bem, que a Ré devia indemnizar o Autor pelos danos sofridos, em consequência do acidente ocorrido, computando-se tais danos patrimoniais (reparação do veículo automóvel) em € 3.624,51.
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O Auto peticionava, ainda uma indemnização pela privação do uso do veículo acidentado, desde 24 de Julho de 2015, até à data em que o veiculo se encontrasse em condições de circulação.
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Neste ponto, o Tribunal não deu provimento ao peticionado, por entender que o tempo estimado de reparação era de 4 dias, tendo resultado das declarações do Autor que o veículo já se encontra a circular, não tendo este feito prova de quanto tempo para além daqueles 4 dias previsíveis para a reparação, esteve privado do uso do veiculo, nem tão pouco provou até quando esteve privado do uso do mesmo, pelas suas declarações o veiculo ao fim de dois meses já estava a funcionar e durante aquele período utilizou um veiculo também de sua propriedade. (…).
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O recorrente entende que devia ter sido arbitrada indemnização pelo dano autónomo de privação do uso do veículo.
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Com efeito, conforme tem sido decidido pelos Tribunais superiores, F) Quanto à ressarcibilidade do dano da privação do uso dir-se-á, em primeiro lugar, que a jurisprudência que a recorrente cita em sentido contrário (de 2008) à que foi adotada pelas instâncias foi larga e consistentemente ultrapassada por jurisprudência posterior, designadamente da emanada deste Supremo, que passou a reconhecer, sem qualquer espécie de hesitação, o direito de indemnização relativamente a situações, como a dos autos, em que o veículo é usado habitualmente para deslocações, sem necessidade de o lesado alegar e provar que a falta do veículo sinistrado foi causa de despesas acrescidas.
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Outra tese ainda mais benévola para o lesado é defensável e encontra também na jurisprudência bastas adesões no sentido de fazer corresponder à privação do uso uma indemnização autónoma, independentemente da prova de uma utilização quotidiana do veículo, ainda que com recurso à equidade e ponderação das precisas circunstâncias que rodeiam cada situação.
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Ora, no caso concreto e como resulta do facto provado 12) o lesado (aqui recorrente) não concordou com o valor assumido pela Ré, e não estava obrigado aceitar esse montante que, na sua óptica, apenas ressarciria em parte os danos por ele sofridos (cfr. art.º 763.º n.º 1 do Código Civil).
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E, por isso, mantem-se, durante todo esse período, o direito a indemnização por dano de privação do uso de veículo. Na verdade, segundo o art.º 813.º do Código Civil o credor incorre em mora quando, sem motivo justificado, não aceita a prestação que lhe é oferecida nos termos legais. Para que haja mora do credor, será necessário que este não tenha motivo justificado para a não aceitar.
Um dos casos em que existe esse motivo justificado ocorre, justamente, quando o devedor oferece apenas uma parte da prestação, com violação do disposto no art.º 763.º do Código Civil (neste sentido, cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, II, p, 84).
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O Tribunal recorrido considerou que não era possível determinar qual o período de tempo em que o autor esteve privado do veículo.
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Do facto provado 17) retira-se que o veículo deu entrada na oficina no dia 24.7.2015; do documento junto aos autos pela interveniente acidental A…, com a referência Citius 2139501, retira-se que o veículo esteve imobilizado naquela oficina entre 24/07/2015 e 24/04/2017, sendo certo que, nesta última data o veículo encontrava-se reparado, embora tal reparação não estivesse paga.
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Das declarações do autor a, que o Tribunal conferiu credibilidade, resulta que o veículo, ao fim de dois meses, estaria já reparado.
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Todavia, como se vê do documento 2139501, na data de 24/07/2017 a reparação não estava paga e não estava paga porque a Ré jamais assumiu o pagamento integral da reparação, posição que, aliás, continuou a manter até ao fim do julgamento em primeira instância, conforme artigo 41º da contestação deduzida nos autos.
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Imperativo é concluir que a privação do uso decorre durante todo o período em que a Ré se recusou a assumir o pagamento da reparação do montante a que veio a ser condenada; e ao Autor não cabia qualquer obrigação em aceitar esse valor ou proceder ao pagamento da reparação in tottum a suas expensas, nos termos do disposto nos artigos 763º e 813º do Código Civil.
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E, foi por via dessa recusa em cumprir a obrigação a que se encontrava adstrita que a Ré deu azo à privação de uso do veículo por parte do Autor. Note-se que o veículo só saiu da oficina, por falta de espaço na mesma, sendo que o reparador ainda não tinha sido pago pelo seu trabalho, pelo que o Autor não tinha qualquer legitimidade para proceder ao seu levantamento.
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Por outro lado e, pela mesma linha de argumentação, a Ré é responsável pela tarifa relativa ao parqueamento do automóvel na oficina, todo o período em questão.
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O Tribunal fez assim uma errónea apreciação da prova documental que consta nos autos, no sentido que não era possível determinar o período durante o qual o Autor esteve privado do veículo, o que levou à decisão de não arbitrar indemnização pelo dano autónomo de privação do veículo.
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Assim, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado, alterando-se a sentença recorrida e condenando-se a Ré a pagar ao Autor: A título de indemnização por privação de uso de veículo, a quantia de € 115,20/diax619=71,308,80€ (24/07/2015 a 24/04/2017) ou outro valor que Vossas Excelências entendam ponderar, com recurso à equidade; A titulo de parqueamento do veículo na oficina, o valor de 10,00/dia, pelo mesmo período, o que totaliza o montante de € 6.190,00.
ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!» Em contra-alegações, diz a R conclui da seguinte forma (transcrição): «1.ª - No seguimento das Alegações de Recurso apresentadas pelo Autor e ora Recorrente, que não merecem provimento, vem a Ré apresentar as suas alegações de recurso subordinado, com reapreciação da matéria de facto e de direito; 2.ª - Face à prova produzida, considera a aqui Apelante, sempre com todo o respeito e consideração, que incorreu o Tribunal a quo num erro de julgamento ao decidir como decidiu, fazendo uma errada valoração da prova produzida, com isso inquinando a decisão final proferida; 3.ª - Tal erro de julgamento sobre concretos pontos de facto implica uma decisão diversa quanto à matéria de facto e de direito; 4.ª - Termos em que deve ser modificada parcialmente a factualidade provada, maxime os factos considerados como não provados nos pontos n.ºs 2 e 3.º, que deverão ser aditados à matéria provada, ficando tal factualidade de acordo e em consonância com a prova testemunhal e documental, designadamente a testemunha F… e o DOC. 3 junto com a Contestação (documento cuja versão mais legível foi apresentada e admitida em sede de julgamento); 5.ª - Para a decisão da matéria de facto, melhor referida no parágrafo anterior, o...
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