Acórdão nº 108/19.9T8VRS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório.

M…, D… e H… vieram propor a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra a A… -Sucursal em Portugal e Federação Portuguesa de Atletismo, todos melhor identificados nos autos, peticionando a condenação solidária destas a pagarem-lhes a quantia de € 29.254,00 (vinte e nove mil, duzentos e cinquenta e quatro euros) a título de indemnização por morte de J… e pelas despesas de funeral, quantia essa acrescida dos juros de mora legais que se vencerem a contar da citação e até integral pagamento, sendo que, caso se entenda que a responsabilidade das duas rés não é solidária, e que apenas a ré/seguradora é responsável pelo pagamento da indemnização, deverá esta ser condenada a pagar-lhes todas as quantias atrás referidas.

A Federação contestou invocando a sua ilegitimidade por ter contratado um seguro válido junto da AIG.

A AIG contestou alegando que, nos termos da apólice contratada com a Federação não está coberta a “morte súbita” e impugna o valor probatório nos termos do art. 446º do CPC do Manual de Procedimentos apresentado onde está prevista a “morte súbita”, concluindo que esse manual não serve de suporte ao contrato de seguro.

Finalmente alega que a vitima não morreu devido a um acidente, mas a um enfarte.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento.

Foi então proferida sentença que: «Julgou a ação procedente e, por conseguinte, condeno a ré/seguradora, agora, "A…, sucursal em Portugal" no pagamento aos autores da quantia de € 29.254,00 (vinte e nove mil, duzentos e cinquenta e quatro euros), quantia essa acrescida dos juros de mora legais que se vencerem a contar da citação e até integral pagamento, absolvendo a ré FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE ATLETISMO do pedido que contra ela foi formulado.» Inconformada com a sentença, pela Ré foi interposto recurso contra a mesma, apresentando as seguintes as conclusões do recurso (transcrição): «Impetrando o Douto Suprimento de V. Exas., se formulam as seguintes conclusões, seguindo-se a ordem e a indicação dos capítulos que sistematizaram as alegações supra: 1. A douta sentença proferida pela 1.ª Instância incorreu em erros na apreciação das questões suscitadas nos presentes autos e na apreciação global da prova produzida, incluindo a testemunhal (cuja reapreciação neste recurso se suscita) violando, assim, normas de direito substantivo e processual; 2. A Recorrente entende que o Tribunal recorrido andou mal ao considerar como provado que a morte súbita é um evento coberto à luz do contrato de seguro referente ao programa nacional de marcha e corrida, integrando-se no conceito de ACIDENTE, e que o Manual de Procedimentos é parte integrante da apólice.

  1. Entende ainda a ora recorrente que o Tribunal recorrido julgou incorretamente como provados os factos 11) e 20) dos factos provados, pelo que requer ao abrigo do disposto no artigo 640º do CPC uma reapreciação da prova produzida e a consequente alteração da matéria de facto; 4. No que respeita ao facto provado 11) a Recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal recorrido ao considerar que o Manual de Procedimentos é respeitante e parte integrante do contrato de seguro aplicável ao programa nacional de marcha e corrida; 5. Outrossim, também não se conforma que tal facto tenha sido considerado provado em virtude do Depoimento da testemunha P…, do qual resultou que o mesmo não sabia tão-pouco os documentos que compunham a apólice (minutos 00:35:54 a 00:36:15); 6. A ora recorrente logrou demonstrar, nomeadamente com a junção do requerimento referência 35995270, que contrariamente a outras apólices, na aplicável ao programa nacional de marcha e corrida não se fazia menção ao Manual de Procedimentos; 7. Aliás, resultou também clarividente do depoimento da testemunha F… que a apólice é composta apenas por condições gerais, particulares e especiais, o que não inclui o referido Manual de Procedimentos (Minutos 00:04:00 a 00:05:48 e 00:06:11 a 00:07:59); 8. Termos em que se deverá considerar como provado, em substituição, que o Manual de Procedimentos não é respeitante à apólice de seguro de acidentes pessoais dos praticantes amadores e dos agentes desportivos contratada pela 2. ª ré junto da 1.ª ré - facto provado 11; 9. Relativamente ao facto provado 20), nomeadamente no que respeita à decisão do Tribunal recorrido em considerar como provado que o senhor João Viegas era uma pessoa saudável, também a ora recorrente não se pode conformar; 10. Da prova produzida nos autos, nomeadamente do relatório de autópsia, que faz prova plena, resulta inequívoco que o senhor J… era portador de uma doença (arteriosclerose coronária), ainda que pudesse não ter sido diagnosticada, que esteve na origem do enfarte do miocárdio causa da sua morte; 11. Assim, apesar de ser uma pessoa que se preocupava com a sua saúde, procurando ter um estilo de vida saudável, jamais se poderá inferir que o mesmo era saudável; 12. Considerando desde logo que as patologias referidas no relatório de autópsia, especificamente a arteriosclerose coronária, tem um longo período de gestação silenciosa; 13. Termos em que se deverá considerar como provado, em substituição, que o senhor J… não era uma pessoa saudável, sendo portador de uma doença coronária pré-existente; 14. Outrossim, também não pode a ora Recorrente conformar-se com a decisão do Tribunal a quo que considerou que a morte súbita estava coberta pelo contrato de seguro em causa, por ter sido um evento "súbito" e "inesperado"; 15. Da prova produzida resultou clarividente que a apólice só cobria o evento "morte" resultante de "ACIDENTE" (artigo 2º "coberturas'), tal como definido nas condições gerais do referido documento; 16. A Recorrente logrou provar que a morte do senhor J… não preenche os requisitos previstos no referido conceito de ACIDENTE, na medida em que não resultou de um acidente, mas de doença; 17. Caso tal não bastasse, importa referir que caso a extensão de cobertura da morte súbita estivesse coberta pela apólice, a mesma teria de resultar expressamente daquele clausulado, tal como resulta no das apólices juntas com o requerimento referência 35995270; 18. Neste sentido depôs a testemunha Fernando Lourenço, a qual referiu que esta extensão não foi contratada nem considerada para efeitos de determinação do prémio (minutos 00:08:38 a 00:09:09 e 00:09:41 a 00:10:39), o qual foi corroborado pelo depoimento da testemunha P… (minutos 00:04:00 a 00:05:48 e 00:24:52 a 00:26:18); 19. Termos em que jamais se poderá considerar que o evento que vitimou o senhor J… é enquadrável na cobertura morte resultante de ACIDENTE, tal como definido na apólice; 20. Por outro lado, sempre se diga que a decisão do Meritíssimo Tribunal recorrido em considerar o Manual de procedimentos parte integrante da apólice viola desde logo o disposto no artigo 37º da Lei do Contrato de seguro, nos termos do qual se determina que esta é composta por condições gerais, especiais e particulares; 21. Além disso, resultou ainda provado que o Manual de Procedimentos não tem qualquer correspondência com os requisitos mínimos legalmente exigidos pelo artigo 32º nº 1 daquela lei, como aqueles que devem constar imperativamente na apólice; 22. No mesmo sentido, logrou a Recorrente provar, por via de prova documental e testemunhal (Testemunha F…, minutos 00:04:00 a 00:05:48) que a apólice é composta, apenas pelas referidas condições, nas quais não se inclui o Manual de Procedimentos.

  2. Termos em que quer à luz do clausulado da apólice quer à luz da lei do contrato de seguro, deverá considerar-se que o referido Manual de Procedimentos não é parte integrante da apólice; 24. Por mera cautela, o que só por mera hipótese de raciocínio se admite, caso se viesse a considerar que a apólice não cumpre as coberturas mínimas exigidas pelo artigo 5º do Decreto-Lei nº 10/2009 de 12 de Janeiro (que regula o regime jurídico do seguro desportivo obrigatório), tal facto jamais permitiria a condenação da Recorrente; 25. Isto porque, do artigo 2º e 20º do referido Diploma resulta que no caso de o contrato de seguro não contemplar as coberturas mínimas legalmente exigidas, é a Tomadora a...

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