Acórdão nº 304/19.9T8ABF-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | TOMÉ RAMIÃO |
Data da Resolução | 11 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam no Tribunal da Relação de Évora I- Relatório.
… Companhia de Seguros, S.A., com sede na …, Lisboa, intentou, em 13 de março de 2019, a presente ação declarativa comum de condenação contra A…, residente em …, Armação de Pera, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia total de €11.311,63, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Para o efeito alegou, em síntese, que suportou despesas e pagou determinadas quantias ao lesado C…, na sequência de um acidente de viação ocorrido em 23 de julho de 2015, no qual também interveio o Réu, sendo este o exclusivo culpado do acidente, conduzindo com uma taxa de álcool no sangue de 1,93/gl, pelo que vem exercer o seu direito de regresso ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º1 do art.º 27.º do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de agosto.
Citado, o réu veio invocar a prescrição do direito da Autora, quanto aos pagamentos efetuados ao lesado em 25/09/2015, no valor de €8.944,36 (art.º 57 da p. i); agosto e setembro de 2015, nos montantes de €73.50 e €214,75 (art.ºs 55 e 59 da p.i) e €1.950,48, em 28 de março de 2016 (art.º 58 da p.i), visto que foi citado em 12 de junho de 2019, pelo que já se mostra decorrido o prazo de prescrição de três anos desde 28 de março de 2019, nos termos do art.º 498.º/2 do C. Civil.
Mais alegou que a despesa de € 128,54, efetuada em 28 de março de 2018, invocada pela Autora no art.º 60.º da p.i, atenta a sua natureza, está excluída do direito de regresso.
Foi proferido o despacho saneador que julgou improcedente a invocada exceção de prescrição e relegou para a decisão final o conhecimento da despesa mencionada no art.º 60.º da p.i.
Desta decisão veio o Réu interpor o presente recurso, e após alegações formulou as seguintes conclusões:
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A apreciação da validade da despesa de 29/03/2018 deveria ter sido conhecida no saneador, porquanto se trata de despesa que, pela sua própria natureza, não constitui objeto do direito de regresso da A, o que se configura como facto impeditivo do direito da A.
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Pelo que se mostra violado o art.º 576.º n.º 3 e 595.º n.º 1 al. b), todos do CPC.
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Para além de que a referida despesa sempre integraria núcleo Indemnizatório autónomo e juridicamente diferenciado, face à indemnização alegadamente paga ao lesado em 2015 e 2016, na medida em que se trata de pagamento alegadamente efetuado a entidade distinta da vítima do sinistro, D) Com o que sempre se mostrariam prescritos os pagamentos alegadamente efetuados ao lesado em 25/09/2015 e 28/03/2016, tendo a decisão recorrida feita errada interpretação do disposto no art.º 498° n° 2 do CC.
o w E) Ainda que assim não fosse, ao ser relegada para final o conhecimento da despesa de 29/03/2018, sempre igual destino deveria ter merecido a exceção de prescrição, por se fundamentar na não consideração de tal despesa.
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A decisão recorrida violou, assim, o disposto no art.º 595.º n.º 1, al. b) do CPC.
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A decisão recorrida julgou improcedente a exceção de prescrição com fundamento no facto de ter considerado interrompido o prazo de prescrição no quinto dia seguinte à data da propositura da ação nos termos do art.º 323.º n° 2 do CC.
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O R. invocou a culpa da A. na não citação do R. nos 5 dias após a propositura da ação, concluindo pela não aplicação do art.º 323.º n. 2 do CC, antes se devendo considerar o R. citado na data da sua efetiva citação - 12/06/2019 - já após o decurso do prazo de prescrição.
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A sentença recorrida não se pronunciou sobre tal alegação do R., sendo que foram concretizados todos os factos, documentados nos autos, que consubstanciam a "causa imputável à A." prevista no referido art.º 323.º do CC., pelo que padece a decisão recorrida de nulidade - art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC.
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Ainda, a decisão recorrida violou e/ou fez errada interpretação do art.º 323.º n.º 2 do CC.
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A A. indicou, para efeitos de citação do R., morada que não correspondia já à efetiva morada do R., o que a A. bem sabia e tinha obrigação de conhecer - doc. 9 da p.i., L) Ao invés de ter fornecido ao Tribunal a morada constante da carta de condução, que era do conhecimento da A. (doc. 4 da p.i.), ou no mínimo, ter informado o Tribunal que desconhecia a atual morada do R.
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Com o que existiu culpa da A. no retardamento da citação do R, o que implica a não aplicação do art.º 323° n° 2 do CC e a consequente prescrição do direito de ação da A.
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O indeferimento da citação urgente requerida pela A. deveu-se a culpa da própria A., ao alegar que o prazo de prescrição se iniciava em 29/03/2018, sendo que a ação deu entrada em 13/03/2019, inexistindo, assim, fundamento para deferimento da mesma.
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O indeferimento da citação urgente não pode fundamentar a interrupção do prazo de prescrição prevista no art.º 323.º, n.º2 do CC, ademais nas circunstâncias acima referidas.
***Contra-alegou a Autora, sustentando a bondade da decisão recorrida e pugnando pela improcedência do recurso.
***O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, em separado e efeito devolutivo.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
***II – Âmbito do Recurso.
Perante o teor das conclusões formuladas pelo recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº3, 639.º/1, todos do C. P. Civil em vigor, constata-se que as questões a decidir consistem em saber se a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia; e se o prazo de prescrição de três anos previsto para o exercício do direito de regresso no n.º 2 do art.º 498.º do C. Civil se mostra decorrido.
***III – Fundamentação fáctico-jurídica.
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Matéria de facto.
Para responder às questões colocadas, para além do antecedente relatório, importa considerar a seguinte factualidade:
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A presente ação foi instaurada em 13 de março de 2019 com pedido de citação urgente do réu.
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Por despacho de 14/03/2019 foi indeferida a citação urgente, porque a Autora invocou que o prazo de prescrição começava a correr a partir da data do último pagamento que se efetuou em 29 de março de 2018.
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O Réu foi citado pessoalmente, por carta registada com A/R, em 12/06/2019.
***2. O Direito.
2.1.
Da nulidade por omissão de pronúncia.
Diz o recorrente que a decisão recorrida julgou improcedente a exceção de prescrição com fundamento no facto de ter considerado interrompido o prazo de prescrição no quinto dia seguinte à data da propositura da ação, nos termos do art.º 323.º, n. º 2 do C.C., sendo que invocou a culpa da A. na sua não citação nos 5 dias após a propositura da ação, mas a sentença recorrida não se pronunciou sobre tal alegação, sendo que foram concretizados todos os factos, documentados nos autos, que consubstanciam a "causa imputável” à A. prevista no referido art.º 323.º do C.C..
Em consequência, a decisão recorrida está ferida de nulidade - art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC.
Porém, sem razão.
Nos termos do art.º 615.º/1, al. d), do CPC, a sentença é nula quando deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, nulidade que só pode ser arguida perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário.
O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outra, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras – art.º 608.º/2 do C. P. Civil.
E a decisão padece do vício da nulidade quer no caso de a sentença deixar de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Tem sido entendimento pacífico da doutrina e na jurisprudência, que apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o “thema decidendum”, ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o...
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