Acórdão nº 12/13.4SVLSB-J.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 04 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR ESTEVES
Data da Resolução04 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora 1.Relatório Nos autos de processo comum com intervenção de tribunal colectivo com o nº 12/13.4SVLSB, a correr termos na secção criminal – J1 da instância central de Setúbal da comarca de Setúbal, em que são arguidos, além de outros[1], G e N, devidamente identificados nos autos, foi proferido despacho que indeferiu a irregularidade por eles arguida e respeitante ao prazo que lhes foi concedido para se pronunciarem acerca da possibilidade de os autos virem a ser classificados como de excepcional complexidade.

Inconformados com este despacho, dele interpuseram recurso os arguidos, pretendendo que o mesmo seja revogado e substituído por outro que lhes conceda o prazo de 10 dias para se pronunciarem, declarando nulo o despacho que declarou os autos de excepcional complexidade e, em simultâneo, determine a sua libertação, por excesso de prazo de prisão preventiva, para o que apresentaram as seguintes conclusões: 1 - Os arguidos foram detidos à ordem dos presentes autos desde o dia 4/05/2015 após o que lhes foi judicialmente fixada a prisão preventiva, encontrando-se a cumprir tal medida de coacção até aos dia de hoje.

2 - A acusação pública foi exarada em 6/11/2015, no prazo legal de 6 meses sem que tenha surgido qualquer necessidade de declaração de especial complexidade a estes autos.

3 - Requerida a abertura da instrução, a mesma foi realizada sem incidentes tendo sido prolatada a subsequente PRONÚNCIA.

4 - Por despacho de 15/4/2016 foi marcada a audiência de discussão e julgamento para os dias 16 e 17 de Junho de 2016.

5 - Todavia, em virtude de este douto despacho não ter sido cumprido de imediato ou, pelo menos, em data razoável, não foram notificados todos os arguidos e mandatário em tempo útil e, em consequência, chegamos às datas de 16 e 17 de Junho, ainda na pendência de prazos de contestação e rol de testemunhas para alguns dos arguidos.

6 - Assim sendo, imputar aos arguidos e mandatários quaisquer responsabilidades na decisão de não se poderem iniciar os trabalhos naquelas datas, culpando estes últimos pelo atraso dos serviços do Tribunal e ainda concluindo que os mandatários pugnaram pela designação de nova data de Julgamento, constitui uma ENORME INVERDADE e preocupante injustiça.

7 - Com efeito como é possível que DOIS MESES (15-4-2016 a 16-6-2016) não tenham sido suficientes para cumprir as notificações a 12 arguidos e respetivos mandatários? 8 - Repare-se que alguns arguidos entre os quais figuram aqueles que se encontravam em prisão preventiva só tinham sido notificados da prisão, em 1 de Junho de 2016 (ou seja, UM MÊS E MEIO após a data do despacho judicial de 15-4-2016) 9 - Ficou o aludido Julgamento adiado “sine die” e, em 1/7/2016 surge novo despacho marcando-se para o efeito, as datas de 17-10-2016 e 18-10-2016.

10 - Ou seja, de 16-6-2016 e 17-6-2016 até 17-10-2016 e 18-10-2016 distam QUATRO MESES em que nem os arguidos presos nem os mandatários foram havidos nem achados.

11 - E surge o dia 17-10-2016 em que um dos arguidos presos não foi trazido ao Tribunal, (por razões que apenas competem aos serviços e obviamente NUNCA a este arguido), sendo óbvio a não disponibilidade dos mandatários em SUBVERTER O MAIS ELEMENTAR DIREITO DO ARGUIDO A ESTAR PRESENTE NO SEU JULGAMENTO.

12 - Todavia, os trabalhos iniciaram no dia seguinte – dia 18-10-2016 e continuaram no dia 31-10-2016 já tarde, após o que foram marcadas datas de 10-11-2016 3 18-11-2016 (ambos apenas da parte da tarde).

13 - O limite temporal máximo para as medidas de coacção, prisão preventiva, acontecem em 16 e 18 de Novembro de 2016.

14 - Facto que já era amplamente previsível.

15 - Sendo que, desde a data de 15/4/2016 em que foi marcada a data de inicio da audiência de discussão e Julgamento, até à data de 16/1/2016, distaram, nada mais nada menos, que SETE MESES.

16 - SETE MESES em que a Defesa dos arguidos repudia qualquer insinuação de culpabilidade.

17 - Não obstante, a 2/11/2016 surge o douto despacho judicial que concede, muito magnanimamente, o prazo de DOIS DIAS para se pronunciar o Ministério Público e defensores sobre a eventual declaração de espacial complexidade nos termos do artº nº 215º nº 4 do C.P.P.

18 - O processo criminal rege-se entre outro, pelos princípios de lealdade, transparência e boa fé, consensualmente ínsitos na C.R.P.

Daí que manifestamente incompreensível se assista ao lançar mão, pelo douto Tribunal, de um VERDADEIRO E ÓBVIO EXPEDIENTE PROCESSUAL para contornar a lei que restringe os prazos máximos da prisão preventiva.

19 - Isto é, durante UM ANO e SEIS MESES sobre a prisão preventiva dos arguidos, sem que DURANTE A INVESTIGAÇÃO NO INQUÉRITO (6 MESES) e INSTRUÇÃO (3 MESES) se tenha tornado evidente e necessária a atribuição de especial complexidade ao processo.

20 - E após 7 MESES sobre a data do recebimento pelo douto Tribunal do processo pronto para o Julgamento.....

Surge agora intempestivamente a REALIZAÇÃO, a COMPREENSÃO, a CONSTATAÇÃO de que este processo é um processo ESPECIAL, ANORMAL, SUI GENERIS, DIFÍCIL e mais não se sabe o quê.

21 - Como se só a agora tivesse sido atentado no número de arguidos e respetivos volumes e número de testemunhas.

Acresce que, só a menos de uma semana do limite máximo da prisão preventiva para três arguidos (quando os mesmos, humanamente expectantes no seu termo e consequente libertação) é que surge o balde de água fria consubstanciando no aludido despacho.

22 - Os arguidos não são monstros que mereçam a falta de consideração sobre sentimentos tão primários como a sua liberdade.

23 - Ainda assim e emoções à parte, entrando no objecto do presente recurso, acontece que o douto despacho, “a quo”, concede à defesa o prazo curto de DOIS DIAS para se pronunciar sobre a eventualidade, ex oficio, de nos encontrarmos todos perante um processo especial.

24 - DOIS DIAS.

Quando o que está sobre a mesa é a DELICADEZA de uma decisão sobre o excesso de limite máximo de uma prisão preventiva.

DELICADEZA e IMPORTÂNCIA que implica uma ELEVAÇÃO MÁXIMA DOS ARGUMENTOS A EXPENDER POR TODOS OS INTERVENIENTES PROCESSUAIS.

25 - ARGUMENTOS QUE TERÃO QUE SER FUNDAMENTADOS EM PESQUISA, DOUTRINAL, JURISPRUDENCIAL e PROCESSUAL (actos durante UM ANO e SEIS MESES).

Tudo isto a fazer em DOIS DIAS.

26 - Quando o prazo supletivo fixado na lei é de DEZ DIAS – artº 105º nº 1 do C.P.P.

27 - Os recorrentes arguiram tempestivamente a IRREGULARIDADE do aludido despacho que lhes restringe o PRAZO LEGAL para se pronunciarem.

E simultaneamente declararam NÃO RENUNCIAR ao prazo a que tem direito de DEZ DIAS.

28 - Mas, porque tal prazo legal iria implicar necessariamente, chegar-se a uma data posterior aquela em se atingiria o máximo de duração da prisão preventiva, SURGE o douto despacho que que ora se recorre e que lhes indeferiu a IRREGULARIDADE tempestivamente arguida.

29 - Aqui chegados, importa REPUDIAR E DEVOLVER qualquer imputação à Defesa, de que se está a lançar mão de EXPEDIENTE PROCESSUAL.

E que fique bem claro que, para a Defesa e salvo o devido respeito (que é e será sempre muito) QUEM LANÇOU MÃO DE EXPEDIENTE PROCESSUAL FOI O DOUTO TRIBUNAL e nunca a Defesa dos arguidos.

30 - Antes de mais realça-se que a DESCOBERTA de que nos encontramos perante um processo especial que tem como legal consequência UM ALARGAMENTO DE TODOS OS PRAZOS, o douto Tribunal, “ a quo”, inicia esse processo de ALARGAMENTO, precisamente com a RESTRIÇÃO DOS PRAZOS DA DEFESA.

O que é tão sintomático, como paradoxal.

31 - Em simultâneo com a decisão de indeferimento de irregularidade arguida, efectuou LOGO o douto Tribunal, a declaração de especial complexidade.

32 - Afirmou o Senhor Conselheiro Henriques Gaspar que os julgadores aplicam o direito, mas sempre com a atenção na administração da JUSTIÇA.

E a JUSTIÇA implica a boa fé na interpretação da lei.

33 - De nada valendo o conteúdo do Acordão citado no processo nº 07P3852 (www.dgsi.pt) de 11/10/2007, porquanto aquele apenas concluiu que a matéria “sub judice” se achava fora do alcance da providência extraordinária que é o Habeas Corpus e até remete para o recurso ordinário.

34 - Os prazos, para a Defesa, são todos peremptórios e a sua extemporaneidade implica o desentranhamento das peças judiciais apresentadas.

35 - Quando, como no caso vertente dos autos, nos encontramos perante o contraditório, anterior a decisão sobre a eventual excesso de tempo de prisão preventiva, NUNCA o prazo conferido por lei, PODE ser restringido a bel prazer do julgador.

36 - Nunca num ESTADO DE DIREITO.

O recurso foi admitido.

Na resposta, o MºPº pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, concluindo como segue: 1. Nos presentes autos, o Exmº juiz, por despacho de 2/11/2016, concedeu ao MºPº e à defesa, um prazo de 2 (dois) dias, a fim de se pronunciarem quanto à declaração de especial complexidade – nº4 do artº 215º do CPP.

  1. O MºPº em 4/11/2016, com os fundamentos invocados na promoção, pugnou pela declaração de especial complexidade por estarem reunidos os requisitos previstos no nº 3 daquele preceito e diploma legais, ou seja; a investigação de uma rede de tráfico de droga, com 12 arguidos, 3 deles sujeitos a prisão preventiva, fortemente indiciados pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, a que corresponde pena de 4 a 12 anos de prisão (artº 21º do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro); o processo contar com 24 volumes de processo principal a que acrescem variados apensos referentes a interceções telefónicas e 27 testemunhas arroladas, sendo que apenas foi possível ouvir 2 (duas), em duas sessões de julgamento, encontrando-se designadas duas sessões para continuação da audiência, nos dias 20 e 18 de Novembro de 2016.

  2. Por despacho de 11/11/2016, foi declarada a especial complexidade dos autos, nos termos do preceituado no artº 215º, nºs 1, al.c), 2, 3 e 4 do CPP, com os fundamentos ali aduzidos.

  3. É deste despacho que os arguidos agora vêm recorrer e agora, não só do prazo de defesa...

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