Acórdão nº 687/16.2T8PTG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelTOMÉ DE CARVALHO
Data da Resolução28 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 687/16.2T8PTG Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre – Instância Central – Juízo de Competência cível e Criminal – J1 * ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: * I – Relatório: Na presente acção declarativa de condenação proposta por (…) contra (…), a Autora não se conformou com o teor da sentença declarativa proferida.

* A Autora pediu que a acção fosse julgada procedente, condenando-se o Réu à transferência da titularidade do direito de propriedade sobre a fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo e primeiro andar, para habitação, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa do (…), número um, e, Rua (…), nº 2, em Ponte de Sor, descrito na Conservatória de Registo Predial de Ponte de Sor, sob o número (…), inscrito na matriz respectiva sob o art.º (…) da Freguesia de Ponte de Sor (actualmente … da União de Freguesias de Ponte de Sor, Tramaga e Vale de Açor), para a esfera jurídica da autora, reconhecendo assim o seu direito sobre a mesma.

* Para o efeito, alega, em síntese, que Autora e Réu mantiveram uma relação de namoro, este adquiriu um imóvel com dinheiro pertencente à primeira, tendo declarado que procederia à transmissão da titularidade do direito de propriedade sobre a referida fracção autónoma a favor da citada (…) logo que para isso fosse interpelado.

* A parte contrária contestou, impugnando a versão dos factos apresentada pela Autora, concluindo pela defesa da absolvição do pedido.

* A sentença proferida absolveu o Réu do pedido por a parte activa não ter feito prova constitutiva do direito invocado.

* Inconformada com tal decisão, a recorrente apresentou recurso e as suas alegações continham as seguintes conclusões: 1 – Todas as testemunhas ouvidas em sede de discussão e julgamento afirmaram cabalmente terem, por diversas vezes, ouvido (…) que queria dar o imóvel à autora.

2 – O ora réu não pagou o preço estipulado, sendo que não é possível falar em verdadeira compra e venda mas antes doação.

3 – Resulta claro, quer do que vem dito pela autora, quer do que foi alegado por (…) na póstuma acção 504/12.2TBPSR, quais os motivos por que veio a intervir o ora réu, sozinho, como comprador do imóvel, e o porquê da escolha daquele tipo contratual (compra e venda) e não doação.

4 – Resulta também que a referida autora não pode (não quis) intervir em tal contrato por ter dívidas que poderiam vir a onerar o imóvel.

5 – Todos estes factos resultam provados atenta a Petição Inicial apresentada por (…), naquela outra acção.

6 – Estamos presença constitui um verdadeiro negócio fiduciário “cum amico”, com vista à protecção e administração do património, tomando o ora réu a posição de fiduciário, (…), fiduciante, e a ora autora terceira beneficiária.

7 – A validade e admissibilidade do negócio fiduciário é comumente aceite no nosso ordenamento jurídico, ao abrigo da liberdade e autonomia contratual consagradas no artº 405º, nº 1, do CC e da natureza meramente obrigacional das restrições decorrentes de negócios jurídicos ao direito de propriedade conforme prescreve o artigo 1306º, nº 1, do CC.

8 – Não está pois sujeito a qualquer forma, valendo para este o princípio da consensualidade.

9 – Porquanto também não tem o mesmo de resultar de documento escrito, sendo aceite a figura do pacto fiduciário tácito, veja-se a este propósito Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 05/02/2013, Proc. 4867/06.0TBVLG.P1.

10 – Ao decidir como decidiu incorreu o Tribunal recorrido em erro de apreciação da prova.

Assim, nestes termos, deve a douta sentença, ser revogada, sendo substituída por outra que dê como provado a existência de pacto fiduciário tácito entre a Autora, o Réu e (…), tomando o ora réu a posição de fiduciário, (…), fiduciante, e a ora autora terceira beneficiária, condenado o réu à transferência da titularidade do direito de propriedade sobre fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo e primeiro andar, para habitação, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa do (…), número um, e, Rua (…), nº 2, em Ponte de Sor, descrito na Conservatória de Registo Predial de Ponte de Sor, sob o número (…), inscrito na matriz respectiva sob o art.º (…) da Freguesia de Ponte de Sor (actualmente … da União de Freguesias de Ponte de Sor, Tramaga e Vale de Açor, para a esfera jurídica da Autora, reconhecendo assim o seu direito sobre a mesma.

* A parte contrária contra-alegou, defendendo que não foram cumpridos os requisitos legais impostos para proceder à modificação da matéria de facto provada e que a pretensão apresentada é manifestamente improcedente. * Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do NCPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do NCPC). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.

Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de: i) erro na apreciação matéria de facto.

ii) erro na aplicação do direito.

* III – Dos factos apurados: 3.1 – Factos provados: Discutida a causa, provaram-se os seguintes factos: 1 – Autora e Réu mantiveram uma relação de namoro desde pelo menos o ano de 2005.

2 – Por volta do ano de 2010, em data não determinada, no âmbito da actividade de voluntariado desenvolvida no Centro de Convívio dos Reformados e Pensionistas de (…), sito na Rua de (…), nº 20, daquela localidade, a Autora conheceu o utente (…).

3 – (…) tinha, segundo o próprio, uma relação conflituosa com a sua única filha, tendo cortado qualquer relação com a mesma.

4 – Face a esta ruptura, o utente (…) apregoava com frequência, perante vários utentes desse mesmo Centro, dentro e fora deste, que não queria deixar quaisquer bens à sua filha...

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