Acórdão nº 2856/16.6T8FAR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelMÁRIO COELHO
Data da Resolução28 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: 1. A jurisdição comum não é competente para apreciar uma providência cautelar na qual se pretende a manutenção da posse sobre uma construção pertencente ao requerente, quando o que está em causa é impor à Administração a abstenção de executar o acto administrativo que determinou a demolição dessa construção.

  1. Compete aos tribunais administrativos revogar ou suspender a execução de um acto administrativo que determina a demolição de uma construção por esta localizar-se em domínio público hídrico, em espaço edificado a renaturalizar.

Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo Local Cível de Faro, (…) intentou procedimento cautelar não especificado contra o Estado Português, o Município de Faro e Polis Litoral Ria Formosa – Sociedade Para a Requalificação e Valorização da Ria Formosa, S.A., afirmando ter adquirido por usucapião uma casa sita no Núcleo do Farol, Ilha da Culatra e ter recebido uma carta da 3.ª Requerida notificando-a que iria proceder à demolição da referida casa, pelo que formula pedido no sentido de ser mantida na posse da mesma, abstendo-se os Requeridos da prática de qualquer acto que a possa perturbar, até decisão definitiva que julgue o seu pedido de reconhecimento do direito de propriedade.

Foi, porém, proferido despacho de indeferimento liminar por incompetência em razão da matéria, pelo que a Requerente apresenta recurso e conclui:

  1. A Autora intentou uma providência cautelar, apensa aos autos principais, onde alegou para o efeito, à semelhança do que fez nos Autos principais, que é possuidora do imóvel que identifica, sito na Rua da (…), na Ilha do Farol, Culatra, 8005 Faro, tendo recepcionado missiva datada de 13.01.2017 da requerida Polis a comunicar que a mesma tomará posse administrativa do imóvel no dia 23.02.2017, e que procederá à execução coerciva da demolição da construção, intimando a desocupá-la, totalmente livre e desembaraçada de bens e pessoas, impreterivelmente, até ao próximo dia 22 de Fevereiro de 2017, tendo, justificadamente, alegado no âmbito da referida providência ter fundado receio, nos termos que circunstancia, na concretização pela Polis do comunicado, causando à Requerente lesão grave e dificilmente reparável do direito que a mesma quer ver reconhecido na acção principal – direito de propriedade – pois que a concretizar a requerida a tomada de posse e a demolição da casa da requerente, antes do Tribunal se pronunciar em sede de acção principal sobre a questão da propriedade tornaria inútil a decisão que viesse a ser proferida, devendo a providência ser decretada sem audição prévia, não vislumbrando prejuízo considerável para a requerida Polis, sendo os danos por demais evidentes para a requerente.

  2. Contudo, o tribunal ‘a quo’ olvidou a razão de ser e o pedido formulado na providência cautelar pela autora, ao se debruçar, única e exclusivamente sobre o tipo de sociedade comercial em questão, sobre as suas atribuições e sobre um acto administrativo, cuja suspensão ou nulidade não foi sequer mencionada ou requerida pela Autora, c) Efectivamente a ora recorrente, “qualifica de perturbadores da sua posse, ou mesmo esbulhadores”, a demolição da sua casa e a ausência de objecto, para decisão do processo que se encontra pendente, agindo a POLIS SA em completo desrespeito moral pela ordem jurisdicional ao demolir imóveis sobre os quais pendem processos judicias.

  3. O douto Tribunal não conseguiu apreender o pedido formulado pela autora, o qual deve ser apreciado, em termos meramente civilísticos, ao ter considerado que “a competência para apreciar a matéria sub judice cabe aos Tribunais Administrativos, estando, por isso, excluída da jurisdição comum.

    (…) Atento o exposto, o Tribunal julga verificada a excepção dilatória de incompetência material e em consequência indefere liminarmente o procedimento cautelar.

  4. CONTUDO: A matéria em causa é eminentemente civilística e a forma de processo adoptada é a correcta, porquanto se invoca posse e direito de propriedade, sendo que a posse e a propriedade são admissíveis no domínio privado do estado, sendo que a requerente não pede no âmbito da referida providência cautelar, a qualquer suspensão de acto administrativo ou equivalente, ao contrário do que se extrai da douta sentença proferida, mas apenas o reconhecimento, a manutenção, de um direito de propriedade que pode ser reconhecido, ou seja, o tribunal ‘a quo’ não pode declarar-se incompetente em razão da matéria porque as questões são do foro civilístico: posse e direito de propriedade.

  5. A providência cautelar proposta tem a ver com a MANUTENÇAO DA POSSE, e com a defesa da propriedade e da posse, tal qual é colocada nos autos principais, aos quais a presente providência é apensada.

  6. No âmbito do presente processo, e da sentença que ora se recorre, a intenção da entidade administrativa é secundária, pelo que não se vislumbra incompetência material, mas a eminente demolição do prédio dos autos, pelo que a requerente, repita-se não pretende a suspensão de um acto administrativo: o que se pretende é o reconhecimento de um direito de propriedade sobre o...

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