Acórdão nº 2929/15.2T8STR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelANA MARGARIDA LEITE
Data da Resolução26 de Outubro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 2929/15.2T8STR-A.E1 Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: 1.

Relatório Na ação declarativa, com processo comum, que AA intentou contra BB, CC e mulher, DD, todos melhor identificados nos autos, o autor pede a condenação dos réus a restituírem-lhe a quantia de € 297 000, acrescida de juros de mora vencidos, no montante de € 1236,82, e vincendos até efetivo pagamento, calculados à taxa legal.

A justificar o pedido, alega, em síntese, que, no decurso de negociações com o réu BB e com vista à aquisição de dois bens imóveis por intermédio do réu CC, na sua qualidade de agente de execução, entregou ao 1.º réu dois cheques que titulavam o montante global de € 297 000, emitidos à ordem do 2.º réu marido, em cuja conta bancária foram depositados, não tendo os imóveis sido transmitidos para o autor, nem a mencionada quantia restituída, não obstante ter a restituição sido solicitada pelo autor aos réus BB e CC; acrescenta que os 2.º e 3.ª réus são casados sob o regime da comunhão de adquiridos e que a dívida em causa foi contraída no exercício da atividade comercial do réu marido, em proveito comum do casal ou com a expectativa dum benefício para ambos, como tudo melhor consta da petição inicial.

O réu BB contestou, invocando a existência de questão prejudicial e defendendo-se por impugnação.

Os réus CC e DD contestaram, invocando a existência de questão prejudicial e defendendo-se por exceção – arguindo a ilegitimidade do réu marido e da ré mulher –, bem como por impugnação.

Em sede de audiência prévia, cumprido o contraditório quanto à matéria da questão prejudicial suscitada e das exceções de ilegitimidade passiva arguidas, foi proferido despacho saneador, no qual, além do mais, se considerou verificada a ilegitimidade passiva da ré DD e se absolveu esta ré da instância, nos termos seguintes: A R. DD invoca a sua ilegitimidade alegando ser alheia às negociações, não tendo o A. referido qualquer actuação sua relativamente aos negócios que fundamentam a acção, mas apenas o facto de ser casada com o R. CC e que a dívida lhe é comunicável, por provir da actividade comercial do 2º R. como agente de execução.

(…) Importa, assim, analisar qual é a posição relativa da R. DD, face à relação material controvertida, tal como a configura o A. na petição inicial.

O A. invoca que os RR. Pedro e DD são casados no regime da comunhão de adquiridos e que a dívida foi contraída no exercício da actividade comercial do 2º R., em proveito comum do casal, ou com a expectativa de um benefício para ambos.

Importa analisar qual é a posição relativa da R. DD, face à relação material controvertida, tal como a configura o A. na petição inicial.

Na petição inicial, o A. demanda genericamente os RR. para que lhe restituam o montante entregue destinado à aquisição de duas fracções, que nunca lhe foram transmitidas. A causa de pedir na acção refere as negociações com o R. BB e a relação com o R. CC, pessoa que efectuaria a transmissão do imóvel, no âmbito da sua actividade de agente de execução. Nesta óptica, nenhuma referência à feita ao cônjuge do R. CC.

Contudo, o A. justifica a demanda da R. DD, por força da comunicabilidade da dívida, por ter sido contraída no exercício da actividade comercial do 2º R., e em proveito comum do casal.

Nos termos do artº 1691º, nº 1, alíneas c) e d), CC, são da responsabilidade de ambos os cônjuges, as dívidas contraídas na constância do matrimónio pelo cônjuge administrador, em proveito comum do casal e nos limites do seu poder de administração e as dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio, salvo se se provar que não foram construídas em proveito comum do casal.

Dispõe o artº 2º do Código Comercial que serão considerados actos de comércio todos aqueles que se acharem especialmente regulados neste Código, e, além deles, todos os contratos e obrigações dos comerciantes, que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do próprio acto não resultar.

Temos, por um lado, a actividade do R. CC, que é uma actividade liberal, e como tal, não pode considerar-se uma actividade comercial, nem os actos praticados podem ser individualizados como actos comerciais e, por outro lado, o proveito comum do casal é uma questão de direito que há-de resultar de factos donde se extraia, sendo ainda necessário apurar que o R. marido é o cônjuge administrador e que actuou dentro dos poderes de administração.

Como refere Antunes Varela, Manual de Processo Civil, pg. 410, o proveito comum do casal constitui matéria de direito nos casos em que tal alegação sirva precisamente para estender ao cônjuge não outorgante a responsabilidade pela dívida contraída pelo outro (cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Almedina, I vol., pg. 180).

Nessa conformidade, e invocando o teor do acórdão do S.T.J., de 94.02.22, o credor, para responsabilizar ambos os cônjuges tem de articular factos que determinem a existência de proveito comum, já que, na lição de Alberto dos Reis, C.P.C. Anotado, vol. III, pg. 210, «determinar se uma dívida foi aplicada em proveito comum dos cônjuges, não é decidir uma questão de facto; é emitir um juízo de valor sobre certos factos materiais (…) quer dizer, quando o tribunal diz - a dívida foi aplicada em proveito comum do casal - julga nitidamente uma questão de direito».

Por outro lado, não foram alegados factos que permitam concluir que o R. fosse o cônjuge administrador e que tenha actuado dentro dos seus poderes de administração, sendo certo que não se pode excluir a situação de um dos cônjuges não deter qualquer poder...

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