Acórdão nº 685/12.5TMFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Janeiro de 2017

Data26 Janeiro 2017

ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA E...

, instaurou contra L...

ação que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro (Faro – Instância Central – 1ª Secção Família e Menores – J1), pela qual pretende a regulação do exercício das responsabilidades parentais da filha menor de ambos, K...

, nascida a 21/05/2010, pedindo que fosse fixada a residência da criança junto de si, invocando que a mãe, na sequência de autorização concedida para deslocar a filha ao Brasil a fim de aí passar férias (pelo período de 3 meses), em Janeiro de 2012, não mais regressou com a criança.

*Citada, a requerida/progenitora não se pronunciou, nem compareceu na conferência de pais marcada para o dia 09/10/2012.

Os progenitores apresentaram alegações, tendo a requerida defendido além do mais, que devia ser fixada residência à menor junto de si no Brasil.

* Foram elaborados relatórios sociais sobre as condições dos progenitores (fls. 90 e 117).

Procedeu-se a realização de audiência de julgamento após o que foi proferida sentença cujo dispositivo reza: “Pelo exposto, decide-se fixar o seguinte regime quanto ao exercício das responsabilidades parentais relativas à criança K...: 1. Exercício das responsabilidades parentais

  1. Fixa-se a residência da criança junto do pai, a quem incumbirá o exercício das responsabilidades parentais, quer quanto aos actos da vida corrente, quer quanto às questões de particular importância para a vida do menor (v.g., intervenção cirúrgica programada, opção pelo ensino público ou privado, orientação religiosa), com excepção da fixação da residência da criança no estrangeiro, que dependerá de decisão conjunta dos progenitores; 2. Visitas a) A mãe deverá estabelecer contactos telefónicos com a criança (pelo menos uma vez por semana), cabendo ao pai favorecer tais contactos, mediante meios de contacto à distância, nomeadamente por telefone ou internet (v.g. Skype); b) A mãe poderá contactar e conviver com a filha sempre que se desloque ao local da sua residência (Portugal), conforme combinação com o progenitor; c) A mãe passará com a criança, em Portugal (salvo se o pai autorizar a deslocação da criança para fora do país), 30 dias de férias, no período das férias escolares de Verão.

    1. Alimentos

  2. A mãe contribuirá mensalmente com a prestação de € 150 para alimentos devidos à filha, quantia que deverá depositar na conta bancária do pai até ao dia 8 de cada mês e que será atualizada, anualmente em Janeiro (de acordo com o índice de variação de preços ao consumidor relativo ao ano anterior, conforme publicado pelo Instituto Nacional de Estatística).

  3. A mãe comparticipará em metade das despesas de saúde e educação da criança, mediante recibo/faura que a mãe lhe deverá enviar.

    Custas por ambos os progenitores, na proporção de ½ para cada um.

    ”* Desta decisão foi interposto, pela requerida, o presente recurso de apelação com vista à revogação da decisão, terminando por formular as seguintes «conclusões»[1], cujo teor se passa a transcrever: A - No caso sub Júdice verifica-se um situação de incompetência internacional dos Tribunais Portugueses.

    1. - A menor K… nasceu em Portugal, filha de mãe brasileira e pai chileno. Estando devidamente registada no Brasil, dispõe de nacionalidade brasileira, país em que reside desde 2012, onde frequenta o ensino público e convive com a família e amigos.

    2. - Ora, no quadro de aplicação da Convenção de Haia de 5 de Outubro de 1961, são internacionalmente competentes para julgar uma ação de alteração de regulação do exercício de responsabilidades parentais, e, por maioria de razão, as regulações novas, os tribunais do país da residência habitual do menor (artigos 1º e 13º da convenção); 3ª- In casu, a menor tem residência habitual no Brasil, lá fazendo a sua vida familiar, educação, encontrando-se perfeitamente ambientada, como aliás foi dado como provado na douta sentença recorrida.

    3. - Na verdade, a competência internacional do tribunal português resulta da regra atributiva de competência inserida no artigo 65.º do Código do Processo Civil, a qual estabelece diferentes elementos de conexão em face das circunstâncias que a mesma prevê.

    4. - Contudo, a aferição da competência internacional está sempre depende de um pressuposto prévio, que se traduz na existência de “…tratados, convenções, regulamentos e leis especiais…”, que determinem regras específicas sobre competência internacional, ou seja, caso existem regras convencionais prevalecentes sobre normas internas, serão aquelas as aplicáveis.

    5. - Tal deve-se ao facto de vigorar na ordem jurídica interna portuguesa, por força do artigo 8.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, o princípio da receção automática das normas de direito internacional, constante de tratados e acordos em que participe o Estado Português, as quais são diretamente aplicáveis pelos tribunais, estando a sua eficácia interna apenas dependente de publicação oficial na sequência da ratificação ou aprovação.

    6. - No caso, e em matéria de proteção de menores, Portugal assinou e ratificou a Convenção Relativa à Competência das Autoridades e à Lei Aplicável em Matéria de Proteção de Menores, concluída em Haia, em 5 de Outubro de 1961, designada, abreviadamente, por Convenção de Haia de 1961, conforme consta do Diário do Governo, 1.ª série, n.º 172, de 22 de Julho de 1968 (Decreto-Lei n.º 48 494), a qual passou a vigorar em 04.02.1969.

    7. - Por sua vez, também o Brasil assinou a dita convenção sendo parte contratante.

    8. - Nos termos do artigo 1.º da Convenção de Haia de 1961, “As autoridades, quer judiciais, quer administrativas, do Estado da residência habitual do menor, sob reserva das disposições dos artigos 3.º, 4.º e 5.º, alínea III, da presente Convenção, são competentes para decretar medidas visando a proteção da sua pessoas ou bens.” 10ª- Por outro lado, não nos podemos esquecer que é sempre no Superior Interesse do Menor que todas estas decisões são tomadas, conforme expressamente referem os 1905.º, n.º 2 do Código Civil e artigo 40º da Lei 141/2015 de 8 de Setembro.

    9. - Mas mesmo que se considerasse que a menor tinha a sua residência habitual em Portugal, atento o facto de ter nascido e vivido cerca de 2 anos neste país, não é menos certo que a mesma é cidadã brasileira, como a sua mãe, e nesse país desenvolve a sua vida e crescimento socio-afetivo e educacional.

    10. - Ora atentos os factos dados como provados não repugna que a justiça portuguesa entenda que a regulação das relações parentais deva ser feita no Brasil, dada a maior proximidade com a menor e por ser o País com que a vida da mesma apresenta maiores afinidades.

    11. - A presente situação poderia, aliás, ser enquadrada na exceção prevista no artigo 13 al. b) da Convenção de Haia, uma vez que existe o risco grave de a criança, no seu retorno, ficar numa situação intolerável, atendendo à rutura abrupta da relação com a Progenitora, ora Recorrente, sua figura primária de referência.

    12. - Na verdade, retirando abruptamente uma criança de seis anos de idade do seu ambiente familiar e social, de perto da sua primária de referência, mãe, para a colocar num outro país, no caso Portugal, que não conhece; a viver com pessoas com quem não tem qualquer laço de parentesco – companheira do pai e filhos desta – será violento, emocional, e psicologicamente, com reflexos gravosos ao nível físico mas também cognitivo, para qualquer pessoa e, por maioria de razão, para uma criança indefesa, de tenra idade.

    13. - A douta sentença recorrida viola as normas de competência internacional dos tribunais portugueses, nomeadamente a Convenção de Haia, aplicável por força do artigo 8º da CRP.

      B)- Mas mesmo que não se julgue procedente a exceção invocada sempre a douta sentença recorrida enferma de nulidade, prevista no artigo 615º, nº 1 c) do Código do Processo Civil.

    14. - Existe uma clara contradição dos factos considerados como provados e a motivação explanada, com a douta decisão proferida.

    15. - Atendendo aos factos considerados como provados, designadamente os descritos nos pontos 1. a 5. 18 a 26, 29, 30 e 32, bem como os Relatórios Sociais realizados aos progenitores, designadamente à progenitora junto aos autos a fls. 117, e ainda ao apuramento em concreto do que seja, para o Tribunal a quo, o Superior Interesse da menor K..., não se esperaria que a decisão final fosse separar a menor da mãe e entregá-la à guarda total e cuidados do pai.

    16. - A douta sentença deveria ter concluído, na verdade, em sentido diverso, fixando a residência da menor junto da mãe, e pela atribuição da guarda - atos da vida corrente da menor – e cuidados da menor à mesma. 19ª - Pelo que, deverá a douta sentença recorrida ser declarada nula, atendendo ao vício formal que padece, supra descrito e demonstrado, previsto no artigo 615º, nº 1 c) do Código do Processo Civil, e em consequência ser substituída por uma decisão que fixe a residência da menor junto da progenitora, sendo-lhe confiada a guarda e cuidados da menor K..., e a quem terá de zelar pelos atos da vida corrente da menor, e todos os atos de particular importância, deverão ser decididos em comum, pelos progenitores. E ainda, caso tal não seja possível, em situações de manifesta emergência (casos de saúde), a progenitora guardiã poderá agir sozinha, dando conta ao progenitor não guardião do sucedido, logo que possível.

    17. - Caso, assim não se entenda, o que não se concede, mas por mera cautela de patrocínio e atendendo ao Superior Interesse da Criança, sempre se dirá, que relativamente à matéria supra explanada, se considere que em causa está um vício substancial, ou seja um erro de juízo ou de julgamento, que incide sobre o litígio propriamente dito, sempre o mesmo só poderá ser corrigido mediante recurso, pelo que, pelo presente se recorre a V. Reverendos.

    18. - E isto porque, atendendo aos factos considerados como provados, e demais elementos que mereceram a consideração do Meritíssimo Tribunal a quo, outra decisão não se...

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