Acórdão nº 65/14.8TBCVD.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Março de 2017
Magistrado Responsável | MANUEL BARGADO |
Data da Resolução | 23 de Março de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO MP instaurou a presente ação, sob a forma de processo comum, contra Companhia de Seguros ..., S.A.
e Banco ..., S.A.
, pedindo que: a) o Tribunal declare que a autora é portadora de doença crónica, permanente, definitiva e irreversível, com uma incapacidade de 83,3%, que a impede de exercer atividade laboral por conta de outrem ou por conta própria, em consequência direta e necessária das patologias que sofre, necessitando de apoio permanente de terceira pessoa para efetuar os atos normais da vida corrente e as tarefas básicas; b) as rés sejam condenadas a reconhecer o estado de saúde da autora, concretamente que integra o conceito de invalidez absoluta e definitiva nos termos da cláusula 2.2. das condições gerais dos seguros por si contratados: c) a 1ª ré seja condenada a pagar à 2ª ré todas as quantias devidas pela autora a esta última, todas elas relacionadas com os contratos de mútuo identificados, libertando-a desse encargo que estima ser no valor de € 115.000,00.
Fundamentou o pedido alegando que por escrituras públicas de compra e venda com mútuo e hipoteca, o Banco réu (doravante 2º réu) concedeu à autora e marido financiamentos para aquisição e reconstrução de habitação nos valores de 33.828,48, € 50.000 e € 30.000, tendo a ré seguradora (doravante 1ª ré) celebrado com a autora, na qualidade de pessoa segura, e com o 2º réu, na qualidade de tomador e beneficiário, contratos de seguro de vida, relativos aos valores dos mútuos contratados Em 2008 a autora contraiu doença do foro oncológico, a qual é definitiva e irreversível, tendo o Instituto de Segurança Social atribuído à autora a pensão por invalidez relativa.
Em anterior ação que correu termos no Tribunal Judicial de Castelo de Vide, a autora deduziu pretensão semelhante à dos presentes autos, com base em atestado médico “incapacidade multiuso”, datado de 12.01.2009, o qual declarava ter a autora incapacidade permanente global de 79%, suscetível de variações futuras, pelo que deveria ser reavaliada ao fim de 5 anos, ação essa que foi julgada improcedente por se ter concluído que não resultou provado que a autora padecesse de doença que a impossibilitasse de exercer qualquer atividade remunerada e que necessitasse de apoio permanente de terceira pessoa para efetuar os atos normais da vida corrente e tarefas básicas.
Em Janeiro/Fevereiro de 2014 foi a situação da autora reavaliada, tendo-lhe sido conferida no atestado médico de incapacidade multiuso incapacidade permanente global de 83,3 %.
A autora tem atualmente 39 anos de idade e é portadora de lesões e doenças física e do foro psicológico, nomeadamente depressão, que a impedem de utilizar o membro superior direito, além de correr o risco de apanhar infeções em resultado de qualquer pequena ferida que tenha.
Considerando as suas limitações, está a autora incapacitada de realizar tarefas da lide doméstica, como varrer, cozinhar ou passar a ferro, ou cuidar dos filhos, sem a ajuda de terceira pessoa e, em consequência do seu estado de saúde, deixou de exercer qualquer atividade profissional, sendo incapaz de o fazer, assumindo o seu marido a realização das tarefas domésticas e cuidar dos filhos.
Contestou apenas a 1ª ré, excecionando e impugnado.
Por exceção invocou o caso julgado formado pela decisão proferida na ação a que aludem os autores e a inexigibilidade do pagamento das quantias em causa, alegando que a autora não depende de forma permanente de terceira pessoa para os atos normais de vida e tarefas básicas, sendo que o atestado junto com a petição inicial não atribui à autora invalidez, mas incapacidade, sendo que tal dependência é exigida na apólice de seguro para que que seja devido o pagamento peticionado.
Por impugnação, referiu desconhecer os demais factos alegados.
Concluiu pela improcedência da ação.
Foi apresentado articulado superveniente, em que a autora alegou factos novos, ocorridos após a interposição da ação, relativos a cirurgia médica a que foi sujeita e suas consequências.
A 1ª ré sustentou a inadmissibilidade de tal articulado.
Procedeu-se à realização de audiência prévia, tendo sido admitido o articulado superveniente apresentado pela autora, e foi proferido despacho saneador, onde se julgou improcedente a exceção de caso julgado e se relegou para final o conhecimento da matéria de exceção de inexigibilidade por falta dos requisitos da cobertura dos contratos de seguro, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença a julgar a ação improcedente e a absolver os réus do pedido.
Inconformada, apelou a autora, tendo finalizado a respetiva alegação com 40 extensas conclusões[1], ao longo de 15 páginas, as quais não satisfazem minimamente a enunciação sintética ou abreviada dos fundamentos do recurso, tal como exige o disposto no art. 639º, nº 1, do CPC, e, por isso, não serão aqui transcritas.
Das mesmas conclusões resulta que a questão essencial colocada à apreciação deste Tribunal da Relação, tem a ver com a impugnação da matéria de facto.
A 1ª ré contra-alegou, defendendo a manutenção do julgado.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), a questão essencial a decidir, como se viu supra, é a de saber se deve ser alterada a matéria de facto e, em caso afirmativo, se se mostram verificados os requisitos contratuais para a atribuição da cobertura de invalidez absoluta definitiva da autora.
III – FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Na decisão recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1 - Por escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca e fiança outorgada em 21.12.2001, no Cartório Notarial de Nisa, e competente documento de entrega complementar que a integra, o Banco Réu concedeu à Autora e marido, C… com fiança de J… e M…, um financiamento para aquisição no valor de 33.828,48 €, o qual tomou na respectiva escritura o n°. 20209999 - 165 - 003; 2 - Por escritura pública de mútuo com hipoteca e fiança outorgada em 06.08.2004, no Cartório Notarial de Portalegre, e competente documento complementar que integra, o Banco Réu concedeu à Autora e marido, C… com fiança de J… e M…, um financiamento no valor de 50.000,00€, o qual tomou na respectiva escritura o n°. 2020999 -165 - 005; 3 - Por escritura pública de mútuo com hipoteca e fiança outorgada em 05.08.2005, no Cartório Notarial de Castelo de Vide, e competente documento complementar que integra, o Banco Réu concedeu à Autora e marido, C… com fiança de J… e M…, um financiamento no valor de 30.000,00 €, o qual tomou na respectiva escritura o n°. 2020999 - 165 - 006; 4 - Os empréstimos acima descritos foram contraídos pela Autora e pelo seu marido, C…, para sustentar a aquisição e reconstrução da sua casa de morada de família, sita na Rua …, implementada no prédio misto, inscrita a parte rústica sob o Artigo … Secção A, a parte urbana, inscrita sob o Artigo …, da freguesia de …, Concelho de Marvão, descrito na CRP de Marvão sob o n°. … / 270586; 5 - Todos os empréstimos foram integralmente utilizados com o propósito acima mencionado; 6 – A 1ª Ré na prossecução da sua actividade comercial, celebrou com o 2°. Réu, este como tomador e beneficiário e a Autora como pessoa segura, um contrato de seguro de vida, denominado "Seguro Grupo Vida", titulado pela apólice, inicialmente com o n°. 5318 / 800500/580174, e depois da migração de dados, passou a contrato de seguro n°. 100547133, adesão 2 da Autora, com data de início em 21.10.2003, correspondente aos empréstimos nºs. 2020999 - 165 - 001 e 2020999 - 165 ¬002 e os capitais de 7.000.000$00 e 5.000.000$00, respectivamente, passando a 2020999 - 165 - 003, com o capital de 12 .000.000$00; 7 - Foi ainda celebrado o contrato de seguro inicialmente com o n°. 5318 / 800500 / 597422 e depois migrado para o n°. 100563359, adesão 2 da Autora, com data inicial em 06.08.2004, correspondente aos empréstimos nºs. 2020999 - 165 - 005, com capital de 50.000,00 €; 8 - Foi ainda celebrado o contrato de seguro inicialmente com o n°. 5318 / 800500 /614243 e depois migrado para o n°. 100578682, adesão...
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