Acórdão nº 1427/15.9T8PTG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Fevereiro de 2017

Data23 Fevereiro 2017

Proc. nº 1427/15.9T8PTG.E1-2ª (2017) Apelação-1ª (2013 – NCPC) (Acto processado e revisto pelo relator signatário: artº 131º, nº 5 – NCPC) * ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I – RELATÓRIO: Na presente acção de processo comum, a correr termos na Secção Cível da Instância Local de Portalegre da Comarca de Portalegre, instaurada por (…) e mulher, (…), contra (…) e mulher, (…), foi pelos AA. alegado serem proprietários de determinado prédio urbano sito na cidade de Portalegre, de que o R. foi arrendatário, e em relação ao qual correu acção de despejo, que terminou com transacção homologada por sentença, nos termos da qual os RR. se obrigaram a entregar aos AA. aquele prédio em determinado prazo, o que ainda não fizeram, impedindo estes de dispor do mesmo e de o arrendarem por renda mensal não inferior a 500,00 €, e nele causando deterioração e degradação pelo não uso – e, nessa base, pediram os AA. a condenação dos RR. nos seguintes termos: a) a pagar-lhes a quantia de 26.000,00 €, correspondente ao valor de 500,00 € mensais, que obteriam com o arrendamento do prédio em causa, durante o período de 52 meses, decorrido entre Julho de 2011 (quando aquele deveria ter sido entregue) e a propositura da acção, acrescida de 500,00 e por mês até à entrega do prédio; e, b) a pagar-lhes quantia correspondente aos danos decorrentes da aludida deterioração e degradação do prédio, a liquidar em execução de sentença.

Na contestação, os RR. impugnaram os pedidos e alegaram, no essencial, que a transacção celebrada entre as partes – que previa a entrega do prédio e o pagamento, após a desocupação efectiva do locado, das quantias de 12.500,00 € e de até 41.000,00 €, a primeira a título de participação de despesas realizadas com obras no locado pelos RR. e a segunda para pagamento de indemnizações aos trabalhadores da empresa dos RR. que funcionava no locado (e que teve de cessar a sua actividade comercial por efeito do despejo) – tem de ser interpretada de acordo com a vontade presumida das partes e com equidade, o que implica que a entrega do prédio e o pagamento da quantia de 12.500,00 € devem ocorrer em simultâneo, tendo já os RR. manifestado aos AA. a sua disponibilidade para a entrega, sem que estes ainda se tenham disposto a aceitá-la e a pagar aquela quantia, com o que tem aumentado o estado de degradação do prédio, que é assim imputável aos AA. – pelo que, nessa base, sustentam os RR. que lhes assiste o direito a invocar a exceptio prevista no artº 428º do C.Civil, não tendo de suportar indemnizações por danos que não causaram ou decorrentes de mora, assim improcedendo a acção.

Após convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, em despacho saneador inscrito em acta de audiência prévia (datada de 21/1/2016 – cfr. fls. 63-66), na qual também se operou a efectiva entrega do locado (mas com a reserva dos RR. de que não abdicam da sua tese no sentido de que a entrega e o pagamento referidos deveriam ser concomitantes, a apreciar oportunamente pelo tribunal), foi concretizado novo pedido dos AA. (cfr. fls. 68-70), depois rectificado por erro de cálculo em novo requerimento (cfr. fls. 89-90), pelo qual (na nova versão) pediram os AA. a condenação dos RR. a pagar-lhes a quantia de 23.866,68 €, a título de indemnização pelos danos decorrentes da não utilização do prédio em causa, correspondente ao dobro do que receberiam em cada mês se os RR. tivessem pago a renda em vigor (202,26 €), desde Março de 2011 a Janeiro de 2016 (59 meses). Os RR. formularam nova oposição ao novo pedido dos AA..

Depois de várias vicissitudes processuais (que incluíram: a formulação de desistência pelos AA. do pedido de condenação dos RR. em quantia a liquidar em execução de sentença, homologada por sentença – cfr. fls. 89-90 e 91; e a prolação de despacho a considerar reduzido o pedido dos AA. do valor de 26.000,00 € para o novo valor de 23.866,68 €), foi realizado o julgamento, na sequência do qual foi lavrada sentença em que se decidiu julgar parcialmente procedente a acção (e improcedente na parte restante do pedido), condenando os RR. a pagar aos AA. a quantia de 23.462,16 €, acrescida de juros à taxa legal de 4%, desde a citação até integral pagamento.

Para fundamentar a sua decisão, argumentou o Tribunal, essencialmente, o seguinte: discute-se nos autos a interpretação do conteúdo e sentido da transacção judicial celebrada pelas partes, divergindo as partes quanto ao momento do cumprimento das obrigações por cada uma assumida; sustentam os RR. que a entrega do imóvel só seria feita mediante a entrega em simultâneo da indemnização acordada, mas esse sentido não é dedutível do teor da transacção; a expressão aí utilizada de “desocupação efectiva” só pode ser lida com o sentido de “entrega” e o uso da expressão “após”, em vez de “mediante”, só pode implicar uma precedência e não uma simultaneidade; daqui se extrai que os RR. não podiam invocar a exceptio do artº 428º do C.Civil, na medida em que, como decorre da lei e da doutrina, esta implica que, em caso de prestações de carácter bilateral com vencimentos não simultâneos, não possa a mesma ser oposta pelo contraente que devia cumprir primeiro, e in casu os RR., com o uso da expressão “após” no teor da transacção, obrigaram-se a cumprir a sua obrigação antes da outra parte; provou-se que os AA. interpelaram os RR., em 18/5/2011, para entregarem o imóvel no prazo de 8 dias, o que só cumpriram em 21/1/2016, em sede de audiência prévia, sendo aplicável o artº 1045º do C.Civil, que prevê indemnização pelo dobro do valor da renda em caso de atraso na restituição da coisa locada; sendo assim, é devido pelos RR. o valor de renda de 202,26 €, em dobro, desde Maio de 2011 a Janeiro de 2016, ou seja durante 57 meses (e não 59, como peticionado pelos AA.), o que perfaz a quantia de 23.462,16 €, a que acrescem os juros legais.

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram os RR. o presente recurso de apelação, no qual incluíram um segmento (que nas respectivas conclusões das alegações identificaram sob a al. A)) respeitante ao despacho de aperfeiçoamento proferido nos autos pelo tribunal a quo (por uma pretensa ilegalidade decorrente de ter permitido uma alteração da causa de pedir e do pedido, alegadamente não consentida pelo artº 265º do NCPC, e que se traduziria numa nulidade processual). Porém, quanto a esse segmento do recuso, foi o mesmo rejeitado pelo tribunal a quo (cfr. despacho de fls. 267), sem que de tal decisão tivesse havido reclamação dos RR., nos termos do artº 643º do NCPC, pelo que se tornou definitiva a não-admissão do recurso nessa parte. Sendo assim, não poderá já este Tribunal pronunciar-se sobre tal matéria, dispensando-se a reprodução das conclusões das alegações de recurso a ela respeitantes, pelo que se passa a transcrever tais conclusões apenas quanto aos demais segmentos do recurso, identificados sob as als. B) e C): «(…) B. Reapreciação da prova gravada: 10. Ouvido em declarações de parte, nos termos do artº 466º do C. P. Civil, e confrontado com a questão de saber qual a ideia com que ficou ao celebrar a transacção, quanto à relação de reciprocidade entre a entrega do espaço locado e o pagamento, o Autor (…) respondeu que o pagamento era feito na altura em que recebesse as chaves. Disse mais que considerava isso normal, como em qualquer outro contrato de pagar e receber (audiência de 3-5-2016, iniciada ao minuto 10.20.05, com depoimento prestado do minuto 18.53 ao minuto 20.49).

  1. Embora não podendo ser tida como confissão escrita, porque não foi registada na acta, a declaração feita tem de valer como confissão verbal válida para ajudar à interpretação da transacção celebrada.

  2. Deve, por isso, para poder ser considerada na fundamentação da sentença, registar-se tal declaração, como facto instrumental, a acrescer aos tidos por assentes, com conteúdo que se sugere seja o seguinte: “Apresentando-se, a seu pedido, o Autor (…), a prestar declarações de parte, tendo-lhe sido posta questão de saber qual a ideia com que ficou, ao celebrar a transacção, quanto à relação de simultaneidade ou não entre a entrega do espaço locado e o pagamento, respondeu que o pagamento era feito na mesma altura em que recebia as chaves. Disse mais que quando lhe dessem a chave liquidava, e que considerava isso normal, como em qualquer outro contrato de pagar e receber”.

  3. Para clarificação da posição dos recorrentes ao procederem à entrega da chave na audiência prévia, deve aditar-se ao facto 6 a reserva por eles então expressa e exarada na acta.

    1. A insustentabilidade da decisão: 14. No pé em que ficaram as posições das partes...

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