Acórdão nº PROCESSO N.º 260/14.0GEBNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Setembro de 2017

Data26 Setembro 2017

Acordam na Secção Criminal: 1.

No Processo Comum nº 260/14.0GEBNV, da Comarca de Santarém foi proferida sentença em que se decidiu absolver o arguido F da prática de um crime de difamação dos artigos 180.º, n.º 1 e 183.º, n.º 1, als. a) e b), do CP, e condená-lo como autor de: um crime de ofensa à integridade física simples do art. 143.º, n.º 1, do CP na pena de 70 (setenta) dias de multa à taxa diária de € 6,00 (seis euros); um crime de dano do art. 212.º, n.º 1 do CP, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à taxa diária de € 6,00 (seis euros); de um crime de injúria do art. 181.º, n.º 1 do CP, na pena de 60 (sessenta) dias de multa à taxa diária de € 6,00 (seis euros); e em cúmulo jurídico das penas referidas, na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa à taxa diária de € 6,00 (seis euros) o que perfaz a quantia de € 900,00 (novecentos euros).

Foi ainda julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante/assistente LP, e em consequência condenado o demandado/arguido F no pagamento da quantia de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) por danos não patrimoniais (acrescido de juros legais).

Inconformado com o decidido, recorreu o arguido, concluindo: “1. A testemunha AR é colaborador da assistente e reside com esta na mesma habitação há pelo menos 18 ou 19 anos com quem tem uma relação de grande proximidade.

  1. Aos costumes a testemunha AR referiu ter algo contra o arguido F.

  2. A testemunha AR teve vários conflitos com o arguido, nomeadamente, no que diz respeito ao dano de uma bicicleta, ameaças, injúrias, relatando no seu depoimento que esses factos se passaram consigo próprio testemunha.

  3. O depoimento da testemunha AR consubstanciou um relato dos factos com um nível de animosidade acentuado e vincando procurando insistentemente fazer ver que ele próprio teria sido vítima de certas atitudes do arguido. O que terá motivado a responder aos costumes que tinha algo contra o arguido.

  4. Pela forma agressiva como depôs tornou-se evidente que tinha interesse na condenação do arguido atendendo às situações consigo ocorridas demonstrando raiva, revolta e rancor relativamente ao arguido.

  5. O depoimento da testemunha foi “cirurgicamente certeiro”, de tal modo, que denota com clareza que vinha previamente preparado, caindo mesmo no exagero da precisão de certos factos e sobretudo datas ocorridas em 2014, cuja consequência deverá ser a falta de credibilidade e a não valoração do seu depoimento.

  6. Aquilo que parecia ser uma lição bem estudada acabou por demonstrar-se num avolumar de contradições graves (não apenas meras decorrências normais de um depoimento) mas sim contradições notórias, acentuadas e sobre factos essenciais, pelo que, não podia o tribunal ter-se socorrido deste depoimento para dar a matéria como provada. Como deu.

  7. O recorrente, não olvidando a convicção formada pelo tribunal à luz do princípio da livre apreciação da prova (art.º 127 CPP) critica e põe em causa que o Tribunal a quo, perante situações idênticas tenha tido dois pesos e duas medidas diferentes. Pois que: 9. Na pág. 7 e 8 da douta sentença a fls…. na qual o tribunal a quo analisa o depoimento da testemunha da defesa JL, conclui assim: “O seu depoimento mostrou-se parcial e interessado, na medida em que, de acordo com as suas declarações existia um litígio entre si e a assistente, relacionado não só com animais, mas também com a luz eléctrica e nessa medida não pode relevar”.

  8. Na pág. 8 da sentença a fls… na qual o tribunal a quo analisa o depoimento da testemunha da defesa MG, concluiu assim a Mma. Juiz: “O seu depoimento mostrou-se parcial e interessado, na medida em que, de acordo com as suas declarações existia um litígio entre si e a assistente, relacionado não só com animais, mas também com a luz eléctrica e nessa medida não pode relevar”.

  9. O argumento usado pela Mma. Juiz para descredibilizar estas duas testemunhas assenta no facto de existir um alegado litígio entre estas duas pessoas e a assistente.

  10. Todavia, a existência de vários litígios entre a testemunha da acusação AR com o arguido não seguiu a mesma regra e o mesmo critério para desvalorar o seu depoimento.

  11. Se o tribunal a quo se fundou e se baseou no argumento de que existia um litigio entre as testemunhas JL e MG com a assistente; então deveria ter usado a mesma bitola, o mesmo critério, para não valorar o depoimento da testemunha da assistente AR, pois que, a situação era exactamente igual.

  12. As premissas são as mesmas, porém a conclusão é diversa.

  13. Caso se entenda que deverá ser valorado o depoimento da testemunha AR, então também o mesmo deverá suceder quanto às testemunhas J e MG, evitando-se assim uma dualidade de critérios infundamentada e geradora de uma violação grave que extravasa o âmbito do art.º 127º do CPP ao valorar como prova fidedigna o depoimento parcial, impreciso, contraditório e sobretudo tendencioso da testemunha AR.

  14. O recorrente não ignora o princípio da livre apreciação da prova e da imediação, bem como, o papel que esses princípios assumem essencialmente na audiência de julgamento, nem pretende tão pouco um segundo julgamento da matéria de facto nesta sede. O que o recorrente pretende tão somente é que perante a mesma situação não haja dualidade de critérios que favoreçam uma das partes, neste caso a assistente.

  15. Na sentença não existe fundamentação que justifique esse duplo critério na valoração da prova, violando-se assim o dever de fundamentação, o que não permite controlar a razoabilidade da convicção dos factos dados como provados.

  16. As declarações prestadas pela assistente foram parciais e estão minadas de diversas contradições graves sobre os factos essenciais do objecto do litígio.

  17. Quanto às alegadas agressões, a assistente contradiz-se: Primeiro diz que foi apenas empurrada pelo arguido. Depois já diz que levou uma bofetada. E depois diz ainda que o arguido lhe “jogou a mão” ao telemóvel. Nunca tendo situado temporalmente os factos.

  18. Perante o mesmo facto entra em contradição. Além disso contradiz aquilo que foi dito pela testemunha AR.

  19. As alegadas ofensas terão ocorrido no dia 5 de Novembro de 2014, porém conforme consta a fls. 84 dos autos, a assistente terá ido ao hospital no dia 24 de Novembro de 2014.

  20. No dia em que foi ao hospital queixou-se do seguinte: “Refere dor cervical”.

  21. A assistente foi ao hospital 19 dias depois de uma alegada bofetada nas mãos e na cara e nem sequer se queixou dessa situação, queixou-se sim de dores na cervical. É sintomático e revelador da falta de verdade.

  22. É plausível que a situação na tenha passado de uma mera tentativa do arguido em retirar o telemóvel da cara da assistente.

  23. Relativamente ao alegado crime de dano diz que viu o arguido atirar os materiais de construção por cima do muro. Muro esse com dois metros de altura.

  24. Um pouco mais à frente no seu depoimento diz que afinal não foi o arguido mas sim uma terceira pessoa que o acompanhava.

  25. O arguido é uma pessoa com 78 anos de idade e com debilidades físicas, pelo que, é ilógico e difícil face às regras da experiencia comum atirar uma saca de cimentos de 25kg por cima de um muro de 2m de altura.

  26. A assistente disse ser casada porém existem nos autos documentos redigidos pela própria onde refere que está separada, situação esta que demonstra falsidade no seu depoimento.

  27. O depoimento da assistente está contaminado com várias contradições que não são meras discrepâncias mas sim situações capazes de abalar a sua credibilidade.

  28. As dúvidas criadas pelas várias versões contraditórias apresentadas pela assistente e pela testemunha AR, deveriam levado o tribunal a quo a pronunciar-se de forma favorável ao arguido, pois que, quando não existe certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa; como é o caso, o princípio do in dúbio pro reo deve prevalecer.

  29. A prova que serviu para dar como provados os constantes nos pontos 1 a 7, 15 a 18, 20 a 23 está inquinada e adveio de depoimentos parciais e interessados (assistente e AR) pelo que aqueles factos deverão ser dados como não provados.

  30. Pelo facto de a testemunha MJ ter a mesma morada do arguido o tribunal presumiu que fossem marido e mulher. 0m32s: Pelo facto de ser seu marido, eu presumi logo por causa da morada…” 33. A testemunha AR tem a mesma morada que a assistente e o tribunal nada presumiu.

  31. A testemunha JF e a senhora MG têm a mesma morada e o tribunal nada presumiu.

  32. O tribunal a quo, mais uma vez, usou dois pesos e duas medidas em situações exactamente iguais.

  33. O depoimento da testemunha MJ foi desvalorizado cuja fundamentação assentou única e exclusivamente no uso da palavra “de forma interessada” não existindo suporte fáctico que sustente essa conclusão (errada).

  34. O depoimento desta testemunha devia ter sido valorado relativamente aos factos ocorridos no dia 5 de Novembro de 2014, pois que, a testemunha relatou de forma clara, simples e objectiva que nesse dia a assistente estava de um lado do muro e o arguido do lado oposto, ao meio dos dois havia um muro e uma cerca com 2 metros de altura, sendo de todo impossível terem-se tocado.

  35. O ponto 3 dos factos provados deverá ser alterado passando a ter a seguinte redacção/resposta: “3. No dia 5 de Novembro de 2014, por volta das 17h, na propriedade já referida, houve um desentendimento entre o arguido e a Luísa por causa da ligação de energia”.

  36. Em sede julgamento foi junto pelo arguido um documento a fls. …. do qual se alcança o preço médio de mercado de cada tijolo, de sacas de cimento de 25kg e areia. O referido documento foi admitido.

  37. A assistente aceitou-o, não o impugnado. Pelo que deveria o conteúdo do mesmo ser levado à matéria assente.

  38. Do referido documento alcança-se que o preço médio de mercado dos tijolos é de 0.20€ e que o preço médio das sacas de cimento de 25kg é de 2,50€. Facto esse que devia ser dado com o provado.

  39. A única prova do preço dos materiais é o referido documento pelo que deverá alterar-se o ponto 5 dos factos...

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