Acórdão nº 1008/15.7T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO AA instaurou, em 4 de Junho de 2015, a presente ação declarativa de investigação e reconhecimento da paternidade contra BB, pedindo que se decrete que ela, autora, é filha do réu, e que este seja condenado a reconhecer a autora como sua filha, ordenando-se a retificação do respetivo assento de nascimento, com todas as consequências legais.

Alegou, em síntese, que nasceu em 8 de Novembro de 1980, e é filha de CC e no seu assento de nascimento não se encontra averbada a respetiva paternidade.

A mãe da autora era deficiente física e psíquica e vivia com a sua mãe.

Entre os anos de 1975 a 1982, o réu cuidou dos terrenos da mãe da autora, cultivando-os, limpando a terra e cuidando das culturas.

Em finais de 1979 e inícios de 1980, aproveitando a ausência da sua mulher que tinha ido para Lisboa fazer tratamentos médicos, dava bebidas alcoólicas à mãe da autora para que a mesma ficasse embriagada e depois mantinha relações sexuais de cópula completa com ela, na sequência das quais veio a ser gerada a autora, sendo que a sua mãe apenas manteve relações sexuais com o réu.

Em 1988 faleceu a mãe da autora e em Março de 2014, a autora conseguiu colher uma amostra e com ela realizar o teste de ADN, do qual resulta a possibilidade do réu ser o seu pai biológico de 99,99999998%.

O réu contestou, excecionando a caducidade do direito da autora e impugnou parte da factualidade alegada.

Foi ouvido o Ministério Público pelo interesse/posição acessória que possui nos autos, que se pronunciou no sentido de assistir razão ao réu, dado que à data da propositura da ação, já se mostrava decorrido o prazo de caducidade a que alude o artigo 1817º do Código Civil.

Observado o contraditório quanto ao apontamento do Ministério Público, veio a autora defender que não caducou o seu direito de intentar a presente, considerando que o reconhecimento da filiação é um direito pessoalíssimo, indisponível e imprescritível, assente no princípio da dignidade da pessoa humana plasmado no artigo 26º da CRP, convocando a esse propósito vários acórdãos nesse sentido, acrescentando que, de qualquer modo, o artigo 1817º, nº 3, do Código Civil, permite que a ação seja proposta nos 3 anos posteriores quando se verifiquem as situações enunciadas nas várias alíneas do preceito, designadamente a referida na alínea b), quando o investigante tenha tido conhecimento superveniente de factos ou circunstâncias que possibilitem e justifiquem a investigação, e portanto como apenas em Março de 2014 a autora conseguiu colher uma amostra de ADN do réu, e com ela realizado o teste de filiação biológica, não caducou o seu direito.

Foi de seguida proferida decisão que jugou procedente a exceção perentória de caducidade e absolveu o réu do pedido.

Inconformada, a autora apelou do assim decidido, finalizando a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem: «A.- Vem o presente recurso interposto da decisão que julgou improcedente a acção intentada pela recorrente, por considerar que o direito da autora em ver investigada a sua paternidade há muito que caducou e por outro lado, por falta de requisitos.

B.- Com o devido respeito, discordamos com tal douto entendimento.

Vejamos… C.- A A. nasceu no dia 8 de Novembro de 1980.

D.- Em Março de 2014, a A. conseguiu colher do R., uma amostra e com ela conseguiu realizar o teste de ADN, que foi junto com a p.i. e do qual Resulta de tal teste que a probabilidade do R. ser o pai da A. é de 99,99999998%.

E.- Desde logo porque defendemos a inconstitucionalidade do artigo 1817º nº 1 do C. Civil, uma vez que, o reconhecimento do estado de filiação constitui um direito pessoalíssimo, indisponível e imprescritível, que deve ser exercitado sem qualquer restrição, em face dos país ou seus herdeiros.

F.- O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, estabelecido no n.º 3 do dito art. 26º da CRP, está interligado com o próprio direito à identidade biológica e pessoal, sendo que o exercício desse direito não pode estar sujeito a qualquer limite temporal, sob pena de violação do direito à identidade pessoal verdadeira, consagrado no artigo 26º n.º 1 da CRP.

G.- Na verdade, o limitar do direito de conhecimento da origem genética consagrado no mesmo preceito constitucional constitui uma violação do princípio da...

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