Acórdão nº 2565/18.1T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelANA MARGARIDA LEITE
Data da Resolução23 de Abril de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: 1.

Relatório J… e mulher, M…, intentaram a presente ação declarativa, com processo comum, contra I…, S.A.

, pedindo se reconheça que são proprietários do prédio urbano que identificam.

Alegam, para o efeito, que a posse do prédio urbano correspondente ao lote 25 da Urbanização Solférias, sito na freguesia de Carvoeiro, concelho de Lagoa, descrito na Conservatória de Registo Predial de Carvoeiro sob o n.º … e inscrito na matriz sob o artigo …, atual …, lhes foi transmitida por A… pelo menos em 1974, sendo por esta detida desde pelo menos 1966, tendo-a adquirido de L…, cuja posse se iniciou pelo menos em 1964; acrescentam que, em 10-04-1964, a ré outorgou contrato de compromisso de compra e venda do aludido lote 25 com a citada L…, tendo permitido que esta fizesse as benfeitorias que entendesse e recebido o preço acordado, dando quitação; posteriormente, foi outorgado novo contrato-promessa entre L… e A…, através do qual aquela declarou prometer vender e esta declarou prometer comprar o aludido lote, tendo sido paga a totalidade do preço acordado; sustentam que o referido lote esteve na posse dos autores, por si e seus antecessores, durante mais de 50 anos, de forma ininterrupta, sem qualquer oposição por parte da ré ou de quem quer que seja, à vista de todos, de forma pública, pacífica e de boa fé, na convicção de que o mesmo lhes pertencia, designadamente, nele aparcando viaturas automóveis, procedendo à respetiva limpeza, suportando todos os encargos que gera, incluindo o pagamento de SISA, cuja liquidação a ré ordenou, e da contribuição autárquica, requerendo a avaliação do lote, sendo inclusivamente reconhecido junto da Fazenda Pública, através da inserção do respetivo nome como proprietário na caderneta predial, concluindo que, se por outro título não foi adquirido, sempre o adquiriram por usucapião, que expressamente invocam.

Mais alegam que os referidos factos foram reconhecidos por sentença, transitada em julgado, proferida no processo que correu termos sob o n.º 3687/10.2TBPTM no 1.º Juízo Cível do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, que declarou ineficaz e de nenhum efeito a escritura de justificação notarial efetivada a favor de J… e mulher, M… e ordenou o cancelamento da inscrição de aquisição a favor dos mesmos; acrescentam que consta da aludida sentença o seguinte: “Não sendo a sociedade imobiliária I… parte nesta acção terá de improceder o pedido dos autores, de reconhecimento de propriedade do imóvel. Contudo, o mesmo não se dirá ao reconhecimento da legítima posse, uma vez que no contrato promessa de compra e venda outorgado em 1964 e indicado em 4 dos factos provados, houve tradição da coisa. Assim, entendendo o Tribunal, que os autores assumem na qualidade de promitentes-compradores a posição contratual de L…, têm direito ao reconhecimento da posse que em 1964 foi transmitida a esta por via contratual pela sociedade imobiliária I…., preferindo a posse material e actual dos réus, porque titulada e mais antiga – artigo 1278.º, n.º 3, do Código Civil”.

Citada, a ré contestou, defendendo-se por exceção – arguindo o caso julgado, sustentando que os factos alegados e o pedido deduzido pelos autores já foram julgados e decididos no âmbito do processo n.º 3687/10.2TBPTM que correu termos no 1.º Juízo Cível de Portimão e do processo n.º 2622/15.6T8PTM do Juízo Central Cível de Portimão – e por impugnação, e invoca a litigância de má fé por parte dos autores.

Os autores apresentaram articulado, no qual se pronunciam no sentido da não verificação da exceção arguida na contestação e da invocada litigância de má fé.

Foi realizada audiência prévia.

Foi proferida decisão, na qual se julgou procedente a exceção de caso julgado, tendo a ré sido absolvida da instância e os autores condenados nas custas.

Inconformados, os autores interpuseram recurso desta decisão, pugnando para que seja revogada e substituída por decisão que considere improcedente a exceção de caso julgado e determine o prosseguimento dos autos, terminando as alegações com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem: «1.º Os aqui Recorrentes consideram que se encontram violadas as normas constantes dos artigos 2.º, 3.º, 527.º, 580.º, 581.º e 619.º, todos do C.P.C. e 1287.º e ss, do C.C.

  1. Os aqui Recorrentes invocaram, em síntese, que “são legítimos possuidores, com exclusão de outrem, do prédio urbano, correspondente ao Lote 25, com 363, 37 m2, de área, sito na Urbanização Solférias, freguesia de Carvoeiro, concelho de Lagoa, descrito na Conservatória de Registo Predial de Carvoeiro sob o n.º … e inscrito na matriz sob o número …, atual …, sendo que a posse de que são titulares foi-lhes transmitida por A…, pelo menos em 1974, sendo já detida por esta desde, pelo menos, 1966, que a adquiriu da L…, cuja posse se iniciou, pelo menos, em 1964.

  2. Mais alegaram que sempre o referente Lote, por si e seus antecessores, esteve na posse dos AA., durante mais de, pelo menos, 50 anos, de forma ininterrupta, sem qualquer oposição por parte da R. ou de quem quer que seja, à vista de todos, de forma pública, pacífica e de boa-fé, na intenção e convicção de que o mesmo lhes pertencia, designadamente, nele aparcando viaturas automóveis, procedendo à respetiva limpeza, suportando todos os encargos que gera, incluindo o pagamento de SISA, cuja liquidação a R. ordenou, e da contribuição autárquica e requerendo a avaliação do Lote, sendo que, inclusivamente reconhecido junto da Fazenda Pública, através da inserção do respetivo nome como proprietário na caderneta predial.

  3. Ademais, acrescentavam ainda que os referentes factos constitutivos foram reconhecidos por sentença transitada em julgado, nos Autos que correram termos no Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, 1.º Juízo Cível, sob o n.º 3687/10.2TBPTM, que declarou ineficaz e de nenhum efeito a escritura de justificação notarial, efetivada a favor de J… e mulher, M… e ordenou o cancelamento da inscrição de aquisição a favor dos mesmos, sendo que nessa sentença pode ler-se “Não sendo a sociedade imobiliária I… parte nesta ação terá de improceder o pedido dos autores, de reconhecimento de propriedade do imóvel. Contudo, o mesmo não se dirá ao reconhecimento da legítima posse, uma vez que no contrato promessa de compra e venda outorgado em 1964 e indicado em 4 dos factos provados, houve tradição da coisa. Assim, entendendo o Tribunal, que os autores assumem na qualidade de promitentes compradores a posição contratual de L…, “têm direito ao reconhecimento da posse que em 1964 foi transmitida a esta por via contratual pela sociedade imobiliária Grão Pará, preferindo a posse material e atual dos réus, porque titulada e mais antiga – artigo 1278.º, n.º 3, do Código Civil”.

  4. Assim, consideram os AA. que, se por outro título não foi o dito imóvel adquirido, sempre o adquiriram por usucapião, que aqui expressamente invocam.” 6.º Os Recorrentes consideram que o constante da sentença proferida no âmbito do processo 2622/15.6T8PTM – Juízo Central Cível de Portimão – Juiz 4, em que foi autora a aqui Recorrida I…, SA e R.R. os aqui Recorrentes J… e mulher, não permite concluir pela existência de caso julgado, porquanto este último processo respeitava à impugnação, por parte da aqui Recorrida, de uma escritura de justificação notarial, de 21 de janeiro de 2015, em que os aqui Recorrentes se apresentaram como adquirentes do imóvel, por via de justificação notarial.

  5. Considerou o Tribunal recorrido que nesta última sentença proferida e transitada em julgado não se deu como provado que “os réus sempre tivessem atuado com animus de donos (artigo 41.º da Contestação)”.

  6. Contudo, com o devido respeito, que é muito, tal conclusão não pode ser retirada da referida sentença, uma vez que tendo sido objeto de recurso de apelação, para Tribunal da Relação de Évora, tal matéria foi excluída dos factos não provados. Assim se podendo ler na página 29, ponto C) “Eliminar o acervo factual dado como não provado, nas supra referidas als. a) e b), sendo esta última al. b) “que os réus sempre tivessem atuado com animus de donos.” – Cf. Certidão junta com o requerimento de 29 de Novembro de 2018.

  7. Aliás, no referido Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 09 de Novembro de 2017, pode ler-se “Na justificação notarial os réus não invocaram aquisição do lote por via da prescrição aquisitiva e muito embora o viessem a fazer na reconvenção que apresentaram na presente ação, a mesma não foi admitida, pelo que esse fundamento de aquisição do direito de propriedade – usucapião – não está em apreciação no âmbito desta ação.” 10.º Com efeito, a existir caso julgado referente ao exercício da posse, conducente á aquisição do Lote 25, por usucapião, o mesmo é o que consta da sentença proferida no âmbito do processo 3687/10.2TBPTM, ante referida, que reconheceu a posse aos aqui Recorrentes.

  8. Nem se diga que não será oponível à aqui Recorrida, por não ter sido parte, pois que a verdade é que a mesma conhecia perfeitamente a pendência daqueles Autos e do motivo que esteve na génese dos mesmos, não se tendo oposto à escritura notarial de usucapião em benefício de C…, após ter sido notificado por carta registada com aviso de recepção (art.s 7.º e 8.º da P.I e 43.º da Contestação) – Cf. se pode ler no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, supra-referido.

  9. Com o devido respeito, entendem os aqui Recorrentes que o Tribunal recorrido erra ao afirmar que, na anterior ação, se deu como provado, que os aqui Recorrentes não atuaram com animus de possuidores.

  10. Ao contrário, dando por assente o constante do pontos 7, 8, 11, 27, 28, 33, 34 e facto aditado pelo Tribunal da Relação sob o nº. 38, dos factos provados sempre se deverá afirmar que os Recorrentes por deterem o “corpus”, se presume deterem igualmente o “animus”.

  11. Por ser difícil, se não impossível, fazer a prova da posse em nome próprio, que não seja coincidente com a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT