Acórdão nº 1810/18.8STR-D.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Abril de 2020
Magistrado Responsável | FRANCISCO MATOS |
Data da Resolução | 23 de Abril de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Proc. nº 1810/18.8STR-D.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório 1. Por apenso à insolvência de (…) – Unipessoal, Lda., o Administrador da insolvência apresentou alegações propondo a qualificação da insolvência como culposa e indicou o sócio-gerente (…) e mulher, (…) para serem afetados pela qualificação.
Alegou, em síntese, que a insolvente dispôs de bens que constituíam o seu ativo em proveito do gerente e mulher ou de pessoas com eles especialmente relacionadas, celebrou contratos que implicaram a transmissão de bens sem qualquer contrapartida para a insolvente, onerou bens do seu património, com prejuízo para os credores e que se apresentou à insolvência muito tempo depois de haver decorrido o prazo de três meses sobre o incumprimento generalizado das suas obrigações.
O Ministério Público formulou parecer concordante com as alegações do Administrador da insolvência.
Citados os indigitados afetados pela qualificação, não deduziram oposição.
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Foi proferido despacho que julgou confessados os factos alegados pelo Administrador da insolvência e pelo Ministério Público e depois foi proferida sentença, em cujo dispositivo designadamente se consignou: “Pelo exposto, e ao abrigo do disposto nos arts. 185.º, 186.º e 189.º, todos do CIRE, decido: 1) Qualificar a insolvência da sociedade (…), Unipessoal, Lda. como culposa – artigo 189.º, n.º 1, do CIRE; 2) Declarar afetados pela qualificação da insolvência como culposa o administrador (…) e a mulher (…), ambos residentes na Urbanização Quinta do (…), lote 43, n.º 88, 2100-042 Coruche – artigo 189.º, n.º 2, alínea a), do CIRE; 3) Decretar a inibição das pessoas mencionadas em 2) para administrarem patrimónios de terceiros pelo período de 5 (cinco) anos – artigo 189.º, n.º 2, alínea b), do CIRE; 4) Declarar que, pelo mesmo período de 5 (cinco) anos, ficam os mesmos inibidos para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa – artigo 189.º, n.º 2, alínea c), do CIRE; 5) Condenar solidariamente as pessoas mencionadas em 2) a indemnizarem os credores da insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças dos respetivos patrimónios.” 3. (…) e a mulher (…), afetados pela qualificação, recorrem da sentença e concluem assim a motivação do recurso: “1. Há uma violação do disposto nos artº 231º, nº 1, do CPC, 186º e 189º do CIRE, princípios que norteiam o direito e jurisprudência: Acórdãos da Relação de Guimarães de 14.06.2006, in CJ, Ano XXXI, Tomo II, pág. 288, da Relação do Porto de 20.10.2007, in CJ, Ano XXXII, Tomo IV, pág. 189 e da Relação de Coimbra de 24.03.2009, in www.dgsi.pt, Acórdãos do TRP de 07/12/2016 no processo n.º 262/15.9T8AMT-D.P1 e do TRC de 11/10/2016, no processo n.º 339/10.7TBCTB-A.C1, in www.dgsi.pt.
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Relativamente à citação, esta apenas é efetuada por oficial de justiça, como foi o caso, quando o autor declare na petição, que assim pretende ou quando não haja agente de execução inscrito em qualquer das Comarcas pertencentes á área de competência do tribunal – vide artº 231º, nº 9, do CPC, ora, no caso, nem foi requerida a citação através de funcionário judicial pelo AI, nem existe falta de inscrição de agente de execução na Comarca.
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O que constitui, nos termos do disposto no artº 190º, nº 1, do CPC, uma nulidade da citação por falta de observância de formalidades prescritas na lei e a nulidade da citação deve ser arguida com a primeira intervenção do processo em qualquer estado do processo, enquanto não deva considerar-se sanada (artigos 189º e 198º do CPC) e importa a renovação do ato nulo (artigo 202º CPC, a contrario).
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Devendo, consequentemente, serem observadas as legais formalidades e os Recorrentes citados por agente de execução para os presentes autos 5. Acresce que a matéria de facto dada como assente também carece de revisão, porquanto, desde logo, não há matéria de facto que possa ser dada como assente face a ora arguida nulidade da citação.
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Mais, toda a matéria de facto dada como assente carece de oposição, contraditório e prova, e na sua maioria os factos não correspondem à verdade material.
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Desde logo, não é verdade que, quer o mútuo efetuado pelos pais do recorrente marido, quer a compra de veículos pesados pela sociedade (…) de que a Recorrente mulher é hoje gerente, não tenham dado entrada/sido realizados.
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Em qualquer dos casos foram efetuados pagamentos pelos pais do recorrente e pela (…) aos credores da Insolvente (efetuaram pagamentos por conta da insolvente) contribuindo para a redução do valor dos créditos dos credores.
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Tanto assim que, o Administrador de insolvência da (…) – Unipessoal, Lda., resolveu os contratos de compra e venda com a (…) dos seguintes veículos: f) Semi Reboque de matrícula SE-(…), da marca (…).
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Semi Reboque de matrícula C-(…), da marca (…).
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Semi Reboque de matrícula C-(…), da marca (…).
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Camião Trator de matrícula 06-(…)-29, de marca (…).
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Camião Trator de matrícula 12-36-(…), de marca (…).
Alegando que: h) O contrato de compra e venda foi verbal.
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A (…) não pagou qualquer preço.
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O Administrador de insolvência só em 5/11/2018 tomou conhecimento que tais veículos se encontravam registados a favor da impugnante.
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A (…) foi constituída a 2/5/25016 tendo até 11/12/2017 como única sócia e gerente (…).
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De 11/12/2017 até hoje a única sócia é (…) e a gerente continua a ser (…).
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(…) é mulher do então gerente da (…) e (…) deste.
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O negócio prejudica os interesses dos credores por, alegadamente, não ter sido objeto de pagamento.
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E, uma vez citado da impugnação da resolução do negócio, o AI nada disse, pelo que ficaram provados os factos arguidos e carreados pela (…), ou seja: I. A (…) foi formada anos antes do pedido de insolvência da (…).
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A (…) comprou à (…) os seguintes bens móveis: f) Semi Reboque de matrícula SE-(…), da marca (…).
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Semi Reboque de matrícula C-(…), da marca (…).
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Semi Reboque de matrícula C-(…), da marca (…).
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Camião Tractor de matrícula 06-(…)-29, de marca (…).
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Camião Tractor de matrícula 12-36-(…), de marca (…).
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Tratava-se de veículos usados e a necessitar de oficina face o desgaste dos mesmos.
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Os negócios não foram gratuitos, foram antes onerosos.
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A (…) pagou o valor dos veículos identificados em II.
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Procedendo a pagamentos em nome da (…), procedia ao pagamento indireto de faturas da (…), ou seja, a (…) efetuava pagamentos devidos pela (…) aos fornecedores desta última.
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Os veículos já identificados em II foram vendidos à (…) pelo preço total de € 38.745,00 (trinta e oito mil, setecentos e quarenta e cinco euros) e deram origem às faturas (…), de 31/12/2017 e (…), de 30/11/2017.
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Entre 2016 e 2017 efetuou pagamentos no valor de € 26.246,42 e o ano de 2018 a (…) efetuou pagamentos por conta da (…) no valor de € 12.578,70.
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(…) pagou por conta da (…) € 38.825,12, pagou mais € 80,12 do que contratado na compra e venda.
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O preço dos veículos foi integralmente pago e destinou-se aos credores da (…).
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(…) apenas pretendeu auxiliar a (…) e efetuou pagamentos por conta em nome desta.
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Se não fosse a relação familiar e a boa fé da (…) e sua gerente, a (…) não tinha pago vários fornecedores/credores e teria na massa insolvente veículos com absoluta necessidade de oficina que seriam leiloados a valores reduzidos, seguramente inferiores àqueles pelos quais foram vendidos à (…).
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Na data de celebração de negócio, em 2017, a (…) e até (…) não vislumbrava a hipótese de insolvência desta última.
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Tudo era feito em prol da “recuperação” da (…) pois, face a crise que assolou o país, a (…) ressentiu-se, como muitas empresas em Portugal, mas sempre convicta da sua “recuperação”.
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Não se tratou de um mau negócio para a massa insolvente, antes pelo contrário.
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Há assim uma manifesta contradição entre os factos que foram dados como assentes no presente apenso e sentença (números 20 a 30) e os dados como provados no apenso I do mesmo processo.
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