Acórdão nº 1754/16.8T9STR.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | ALBERTO BORGES |
Data da Resolução | 10 de Novembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo de Instrução Criminal de Santarém, Juiz 2, correu termos o Proc. n.º 1754/16.8T9STR, no qual, por despacho de 30.11.2019, e mediante promoção do Ministério Público, se decidiu condenar “cada um dos assistentes” – … e …, nos autos melhor identificados – “por uso anormal do processo, em multa processual no valor de seis unidades de conta”, nos termos do art.º 277 n.º 5 do CPP
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Inconformados com tal despacho, recorreram os assistentes - … e … - concluindo a motivação do recurso com as seguintes conclusões:
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Entendeu a Meritíssima Juiz de Instrução Criminal que os ora recorrentes e assistentes fizeram um uso abusivo do presente inquérito ao usar o mesmo evento fáctico para despoletar mais do que um processo quando o poderiam ter feito logo no primeiro se a queixa tivesse sido transparente, exaustiva e responsável, abrangendo toda situação que consideravam ilícita e violadora de direitos
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Mas a que factos se refere a douta decisão? Em que processos se encontram esses factos? C) Entendemos ser nula a decisão proferida, por insuficiente fundamentação de facto, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 379 n.º 1 alínea a) e 374 n.º 2 do CPP
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Os atos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão - diz o n.º 5 do artigo 97 do CPP
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O artigo 205 n.º 1 da CRP estabelece a obrigatoriedade da fundamentação dos atos decisórios, princípio geral que é extensível a todos os ramos do direito e com acuidade no Processo Penal
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Refere a decisão que os assistentes fizeram um uso abusivo do presente inquérito ao usar o mesmo evento fáctico para despoletar mais do que um processo. Refere-se a que evento fáctico? E despoletaram quais processos? G) Entendem os assistentes que a douta decisão proferida é nula, por falta de fundamentação de facto, violando o disposto nos artigos 97 n.º 5 e 374 n.º 2, ambos do CPP, e 205 n.º 1 da CRP
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Não se alcança como se coloca o assistente …, que apenas teve intervenção como assistente no Processo n.º …. e nos presentes autos, na mesma situação processual do assistente …
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Os processos intentados pelo assistente … e o presente processo nada têm nada a ver uns com os outros, tanto mais que os factos são diferentes, embora relacionados com a mesma situação, ocorreram em tempo diferente, tendo durante o lapso de tempo decorrido entre eles havido conhecimento de ocorrências que tornaram a situação do presente inquérito completamente diferente do anterior
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No Processo n.º … estava em causa a publicação do despacho n.º …, de …., do …, e relendo toda a queixa apresentada neste processo não vislumbramos onde constam factos iguais aos denunciados nos presentes autos
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No processo …a queixa respeitou a factos que, na versão dos assistentes, configurava um crime de difamação agravado, pelo facto dos denunciados, em especial o denunciado …, ter publicitado um despacho, na tese dos assistentes, difamatório da sua honra e bom nome. O que estava em causa era a publicitação que se fez do despacho e não qualquer facto relacionado com atas
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Da leitura atenta da denúncia não conseguimos concluir que se relate a falsidade das atas, situação que é denunciada noutro processo
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Como se pode constatar da análise ao Processo n.º …, o que foi apreciado no mesmo foi o conteúdo do despacho n.º …, de …., da autoria do arguido …, e não a questão em análise nos presentes autos. N) Em conclusão, no processo … não se fez qualquer participação sobre as atas do júri de seriação das candidaturas ao Mestrado em …. (…), sobre o incumprimento das determinações da Direção da … sobre a distribuição do serviço docente para o ano de 2014/2015 ou sobre a Alteração ao Mestrado em …
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No que respeita ao Processo n.º …, que apenas tem como denunciante …, a denúncia parte das participações disciplinares feitas por … contra aquele, nomeadamente, sobre a participação disciplinar que este fez sobre o júri do mestrado
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Contudo, o que se visou denunciar neste processo foi a difamação feita pelos arguidos ao participar disciplinarmente, instaurar o processo disciplinar e instruir/decidir o processo disciplinar contra aquele assistente
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Nos presentes autos a situação é muito diferente, pois o que está em causa é o facto do arguido …, apesar de já ter conhecimento da ata de …, em que esse impedimento é comunicado, usou o referido despacho … para participar disciplinarmente do assistente, assim como ter participado disciplinarmente por utilização do e-mail institucional numa atuação de litigância excessiva, pela publicidade contratada pelo Diretor da … à …
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Como dissemos, estamos a falar de situações diferentes, em que algumas têm em comum – apenas e só - o despacho …
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Por outro lado, estão em causa nestes autos as declarações proferidas pelos arguidos em sede de processo disciplinar, matéria que não foi objeto de apreciação em qualquer outro processo criminal
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O que o assistente denunciou nestes autos foi a participação disciplinar efetuada pelo arguido …, relativamente àqueles factos e declarações aí prestadas (em sede de processo disciplinar) e não o despacho …
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Repare-se que o arguido … fez várias participações disciplinares do assistente …, que deram origem a várias queixas crime, versando matérias diferentes
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Assim, os factos denunciados nos presentes autos são claramente diferentes dos denunciados nos Processos n.º … e ….
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Na verdade, o assistente sentiu-se ofendido e prejulgado pelo denunciado no relato que o mesmo apresentou, daí ter feito queixa nos termos que a lei lhe permite e ao queixar-se de expressões concretas, proferidas pelo denunciado, que são ofensivas e não correspondem a verdade - e que nada têm a ver com o Inquérito … ou … – o denunciante exerceu o direito de queixa de forma legal, sem qualquer uso abusivo do processo e sem qualquer intuito doloso ou negligente, pelo que não pode nem deve ser penalizado com uma condenação. X) Da leitura do artigo 277 n.º 5 do CPP podem retirar-se, de imediato, seguramente, duas conclusões: a primeira é a de que a utilização abusiva do processo é referida à denúncia e ao exercício do direito de queixa; é de um desses atos processuais que resultará a utilização abusiva
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Não será já no decurso do inquérito que a utilização abusiva se manifestará, o que bem se compreende, sabendo-se da condicionadíssima atividade que o denunciante ou queixoso pode...
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