Acórdão nº 8083/18.0T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | FRANCISCO XAVIER |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I – Relatório1.
O Ministério Público instaurou Processo de Promoção e Protecção a favor da criança R…, nascida a 23/02/2018, filha de P… e de G…, actualmente acolhida na Fundação …, Pinhal Novo.
2.
No decurso da instrução, foram ouvidos os progenitores da criança e a EMAT de Setúbal apresentou relatório social.
Encerrada a instrução, realizou-se conferência para a obtenção de acordo de promoção e protecção, o que foi conseguido, tendo sido aplicada a medida de acolhimento residencial a favor da criança.
Foram realizadas perícias sobre a personalidade dos progenitores pela Delegação do Sul do Instituto Nacional de Medicina Legal, e a EMAT de Setúbal apresentou relatórios sociais sobre as condições de vida dos progenitores e a situação da criança, e foi ainda elaborado relatório pela instituição de acolhimento.
3.
Atenta a proposta de substituição da medida aplicada, pela de confiança a instituição com vista à adopção, não sendo viável a obtenção de acordo para a alteração da medida, nos termos propostos, determinou-se o prosseguimento dos autos com vista à realização do debate judicial, previsto no artigo 114º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP), aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro.
Notificados os progenitores e o Ministério Público, nos termos previstos no artigo 114º, n.º1, da LPCJP, o Ministério Público apresentou alegações, tendo requerido a aplicação da medida de confiança a instituição com vista à futura adopção da criança.
4.
Procedeu-se a debate judicial, com intervenção de Juízes Sociais, com observância do formalismo legal, após o que veio a ser proferida sentença, na qual se decidiu, nos termos dos artigos 35º n.º 1, al. g), 38º-A e 62°-A, todos da Lei n.º 147/99 de 01/09: a) Aplicar a favor da criança a medida de confiança à instituição Fundação …, no Pinhal Novo, com vista a futura adopção.
b) Nomear curador provisório da menor o Exmo. Director da referida instituição (art.º 62.º-A n.º 3 da LPCJP).
c) Determinar a cessação das visitas da família biológica da menor (art.º 62º-A n.º 6 da LPCJP) 5.
Inconformados com esta decisão interpuseram os progenitores o presente recurso, pedindo a revogação da sentença e a substituição da medida adoptada pela de apoio junto dos pais, nos termos e com os fundamentos seguintes [segue transcrição das conclusões do recurso]: 1.ª No dia 14 de Julho de 2020, no final da diligência da leitura do acórdão recorrido, não foi efectuada a notificação da defensora nomeada nos termos do artigo 122.º-A da Lei de promoção e protecção de crianças e jovens em perigo, porquanto faltava a assinatura de uma das juízes sociais.
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A signatária deslocou-se ontem, 27-07-2020, à secretaria do 1.º juízo, onde por cortesia recebeu uma cópia do referido acórdão, uma vez que lhe foi recusada a possibilidade ser notificada do acórdão e/ou abrir uma cota para a notificação.
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A signatária não está notificada do acórdão, nos termos do disposto no artigo 122.º-A do referido diploma, não estando a correr o prazo para, querendo, recorrer da decisão.
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Ontem, a signatária requereu junto do Tribunal a notificação do acórdão, aguardando-se o despacho.
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À cautela e por dever de patrocínio interpõe o presente recurso.
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O objecto do recurso é o douto acórdão que proferiu decisão que determina a aplicação à menor R… a aplicação da medida de confiança à instituição Fundação …, no Pinhal Novo, com vista à futura adopção.
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O Tribunal a quo não podia ter proferido tal decisão atendendo à prova produzida em sede de audiência de julgamento e bem assim a prova documental e pericial que consta dos autos.
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O recurso viola as regras da experiência e da livre apreciação da prova, pelo que se impugna a matéria de facto ínsita nos pontos 10,11,16,17,18,21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29, 31, 32, 33, 34, 35 36, da factualidade dada como assente no acórdão recorrido.
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Em matéria de direito e na decorrência da impugnação da matéria de facto, o acórdão recorrido que aplicou a medida de confiança a instituição com vista à adopção, viola os princípios orientadores da intervenção, previstos no artigo 4.º, alíneas a), e), f), g), h), i) e j) da Lei de protecção de crianças e jovens em perigo, do princípio da legalidade e da garantia de acesso aos tribunais.
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Foi dado como provado que a recorrente “não reconhece a sua patologia”, quando a prova documental junta aos autos demonstra que desde Julho de 2019, apresenta “critica parcial para a sua situação mórbida”, conforme relatório do departamento de psiquiatria e saúde mental do Centro Hospital de Setúbal, E.P.E., datado de 11 de Julho de 2019, junto aos autos e não impugnado.
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Os únicos três internamentos ocorridos entre o ano de 2012 e 2015, ficaram associados à retirada dos filhos mais velhos (2012) da recorrente, e a uma situação de contexto de violência doméstica infligida pelo seu anterior companheiro.
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Em termos abstractos as pessoas que padecem de doenças apresentam alguma resistência em aceitar e reconhecer a sua condição de debilidade, nomeadamente, os, esquizofrénicos, adictos, bipolares, como é o caso do recorrente, entre outros.
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Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo as condições habitacionais foram substancialmente melhoradas, no decurso do processo judicial, sendo que na actualidade a casa reúne as condições exigidas pela EMAT e CAFAP, conforme relatórios da EMAT datado de 13-03-2020 e do CFAP, datado de 06-03-2020.
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Os recorrentes criaram um espaço próprio e adequado para receber a R… desde Outubro de 2019, conforme relatório da EMAT datado de 13-03-2020.
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O acórdão proferido viola a garantia de acesso aos tribunais no sentido em que está obrigado a proferir decisão actual, proporcional, garantido o efeito útil e exequibilidade da mesma.
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O argumento do “passado” da recorrente como único obstáculo ao exercício das responsabilidades parentais, a par da doença psiquiátrica, é completamente desajustado, uma vez que, não é actual, pois a recorrente tem um agregado familiar estável e a doença encontra-se remitida há mais de cinco anos.
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O Tribunal a quo não pode impor aos recorrentes condições não exigíveis ao homem médio, vejamos: a. o argumento Escassez de recursos financeiros é pernicioso, pois associa e faz depender as competências parentais da capacidade económica dos pais.
b. A exigência da verificação de um emprego efectivo não é compatível com a realidade laboral do país e do mundo.
c. As condições habitacionais dadas como provadas no acórdão recorrido não são actuais, conforme relatórios da EMAT e CAFAP.
d. A apontada ausência de estratégias educativas por parte dos recorrentes não é verdadeira, pois a recorrente, por iniciativa própria tentou obter informação sobre equipamentos de infância próximos da sua zona de residência, bem como, os valores das mensalidades, conforme relatório do CAFAP datado de 6 de Março de 2020 e não impugnado.
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A recorrente acompanha o percurso escolar dos seus enteados.
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A equipa técnica do C…, coordenadora e educadora de infância, não dispõem dos meios e instrumentos técnicos para avaliar e concluir sobre as competências parentais dos ora recorrentes, não podendo ser dados como provados os factos dos pontos 21 e 22 do acórdão recorrido.
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Este agregado familiar tem à sua guarda duas crianças de 8 e 10 anos, com medida de promoção e protecção aplicada, medida de apoio junto dos pais, no caso, junto do pai, de cujos relatórios não resulta que a ausência de cuidados de higiene corporal e/ou com a roupa seja uma constante na rotina das crianças.
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A família ao longo dos 2 anos de institucionalização da sua filha cumpriu todas as exigências estipuladas por parte da EMAT e CAFAP como provado no ponto 24.
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A família nunca recebeu apoio com vista à reorganização familiar.
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A periodicidade das visitas à menor nunca foi aumentada.
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Contrariando a indicação do CAFAP, conforme relatório de avaliação datado de 6-03-2020, cujo conteúdo se transcreve: “quanto à vinculação com a bebé Rafaela, a equipa reforça a importância dos cuidadores terem mais oportunidades para poderem interagir e conviver com a filha em contexto institucional, uma vez que os primeiros anos de vida são cruciais para o estabelecimento de uma vinculação segura, afectiva e de segurança.” 25.ª O Tribunal a quo omitiu dos factos provados em que sustenta a sua decisão todas as potencialidades apontadas pelos serviços que acompanham a família, apenas salientado as suas vulnerabilidades, conforme relatórios do CAFAP e Agrupamento de Escolas de Palmela, EB Algeruz/Lau, datados respectivamente de 06-03-2020 e 09-12-2019.
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O Tribunal a quo ignorou que a conclusão do CAFAP é que “quanto à vinculação com a bebé R…, a equipa reforça a importância dos cuidadores terem mais oportunidades para poderem interagir e conviver com a filha em contexto institucional, uma vez que os primeiros anos de vida são cruciais para o estabelecimento de uma vinculação segura, afectiva e de segurança.” 27.ª Em face dos resultados da perícia médica realizada à recorrente, facto dado como provado no ponto 27, conjugado com os relatórios do CAFAP, o Tribunal a quo devia ter decidido substituir a medida de acolhimento residencial por uma medida de apoio junto dos pais, com a supervisão por parte do CAFAP.
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Medida prevista no art.º 60.º da Lei de promoção e protecção de crianças e jovens em perigo, aplicável até aos 21 anos de idade da R…. Tese sustentada pelo CAFAP, conforme relatório datado de 06-03-2020: “a equipa considera pertinente que a família possa continuar a beneficiar de um apoio e suporte ao nível do fortalecimento da capacidade parental e do funcionamento familiar. Desta forma, informamos que continuamos disponíveis para dar continuidade ao trabalho com a família, assim como para prestar quaisquer informações adicionais. “ 29.ª O acórdão recorrido viola por isso os seguintes princípios orientadores da intervenção, Interesse superior da criança e do jovem...
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