Acórdão nº 1515/18.0T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelCRISTINA DÁ MESQUITA
Data da Resolução16 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 1515/18.0T8EVR.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1.

EDP-Distribuição Energia, SA, ré na ação declarativa de condenação que lhe foi movida pela sociedade (…)-Sociedade Agrícola do (…), Lda., interpôs recurso da sentença proferida pelo Juízo Local Cível de Évora, Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Évora, o qual julgou a ação procedente e, consequentemente, condenou a ré EDP-Distribuição Energia, SA a pagar à autora (…)-Sociedade Agrícola do (…), Lda. a quantia de € 36.231,63, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, vencidos desde a data da citação, ocorrida em 04.09.2018 e vincendos até integral pagamento, à taxa supletiva legal prevista para obrigações civis.

A (…)-Sociedade Agrícola do (…), Lda. requereu a ampliação do recurso, impugnando, a título subsidiário, a sentença na parte em que julgou não provado que «o valor da reparação do pivot referido em 16. c) ascende a € 5.101,70» (facto não provado n.º 3).

Na presente ação, a autora (…)-Sociedade Agrícola do (…), Lda. pedira ao tribunal que condenasse a ré a pagar-lhe a quantia de € 36.561,70, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão, a autora tinha alegado que se dedica à exploração agrícola e florestal nos prédios rústicos denominados, respetivamente, “Herdade do Outeiro do (…)”, “Herdade da (…)” e “Herdade do Monte (…)”, todos situados na freguesia do Vimieiro, concelho de Arraiolos, todos melhor identificados na petição inicial e que a ré é a proprietária e responsável pela manutenção, conservação, bom funcionamento e garantia das condições de segurança das linhas aéreas de transporte de energia elétrica de média e baixa tensão e respetivos apoios em betão que atravessam e asseguram o fornecimento e consumo de energia elétrica às supra referidas herdades; no dia 29 de junho de 2017, ocorreu um incêndio na Herdade do Outeiro do (…), na Herdade da (…) e na Herdade do Monte (…), o qual teve origem na linha de média tensão que atravessa as três propriedades supra referidas, em virtude do embate de uma cegonha na referida linha, muito próximo do PT e do apoio em betão da linha de baixa tensão onde se encontra instado um ninho de cegonhas, local onde a rede de baixa e de média tensão se cruzam; o incêndio teve origem na Herdade da (…) e alastrou-se para as outras duas herdades e foi causado por arco elétrico determinado por contacto (curto-circuito) entre as linhas de condução de energia elétrica que atravessam a Herdade da (…) e a Herdade do Monte (…), na parte que é explorada pela autora, gerando nas respetivas linhas uma temperatura consideravelmente alta; o curto-circuito determinou a fusão dos elementos metálicos dos condutores da linha elétrica os quais se desprenderam em direção ao solo – faíscas – juntamente com a cegonha que, quando atingiu o solo, estava ainda em chamas, fazendo deflagrar o incêndio; as linhas de transporte de energia elétrica relativas à rede de média tensão que passam sobre as herdades referidas encontravam-se sem qualquer mecanismo de proteção ou sinalização que visasse minimizar o embate e consequente electrocução de aves, sendo responsabilidade da ré a manutenção, conservação, bom funcionamento e garantia de condições de segurança dos apoios em betão (postes) que sustêm as referidas linhas de transporte de energia elétrica, a monotorização e minimização dos impactos resultantes da interação entre as linhas elétricas aéreas de alta e média tensão e a avifauna, bem como a identificação e correção de linhas identificadas como “perigosas”; na rede de baixa tensão existente no local, num dos postes situados na linha de baixa tensão paralela à linha de média tensão existente na Herdade da (…), existe um ninho de cegonhas com abundante fluxo migratório; a ré deveria ter analisado o risco de colisão/electrocução atribuído às espécies de aves presentes em cada situação, o que não sucedeu no caso concreto, pois tendo conhecimento da existência do ninho de cegonhas acima referido não diligenciou pela sua desmontagem e não adotou quaisquer medidas de correção nas linhas de média tensão – as quais especificou – tendo em vista evitar os impactos resultantes da interação entre as linhas elétricas aéreas de média e baixa tensão e a avifauna; em consequência do incêndio ocorreram danos que também concretizou.

A ré contestou por impugnação, sustentando que o incêndio terá tido origem em facto desconhecido e completamente alheio ao regular funcionamento das instalações da ré, a qual, à data dos factos, tinha instalado em todos os apoios daquele ramal de média tensão dispositivos dissuasores de nidificação e ainda um dispositivo para nidificação na rede de baixa tensão de modo a evitar a nidificação na rede de média tensão, não existindo na rede de baixa tensão qualquer necessidade nem indicação de instalação de dispositivos de sinalização uma vez que as linhas são revestidas por materiais isolantes que diminuem a sua perigosidade e eliminam os riscos para a exploração da rede.

*O tribunal de primeira instância proferiu despacho no qual fixou o valor da causa e dispensou a realização de audiência prévia, elaborou despacho saneador tabelar e proferiu despacho no qual fixou o objeto do litígio e enunciou os temas de prova, tendo, ainda, decidido sobre os requerimentos probatórios e designado data para a realização da audiência final.

Realizada a audiência final, foi depois proferida a sentença objeto do presente recurso.

I.2.

A recorrente EDP formula alegações que culminam com as seguintes conclusões: «111.1 - Quanto à Matéria de Facto 1- Quanto ao facto descrito sob o n.º 8 do elenco dos factos dados como provados: - 8.

O incêndio teve origem nas linhas de média tensão e baixa tensão que atravessam o referido imóvel, em virtude do embate de uma cegonha nessas mesmas linhas.

No entendimento da recorrente, não existe qualquer prova nos autos que permita concluir que o incêndio teve origem nas linhas de média tensão em virtude do embate, mas sim, apesar de o início do incêndio não ter sido presenciado por qualquer uma das testemunhas mas em virtude dos indícios, que o incêndio teve origem no embate de uma cegonha na linha de MT.

Esta formulação que o Tribunal reconhece como a correta, como não podia deixar de ser, logo no início da sua fundamentação de direito na página 11 (não numerada) da sentença é muito relevante para a decisão da ação na medida em que evidencia a ocorrência de um caso de força maior - causa exterior ao funcionamento da coisa e deve ser devidamente articulado no que respeita à solução de Direito com o facto n.º 23.

Em Junho de 2014, no âmbito de uma ação de manutenção preventiva sistemática a toda a instalação de distribuição de energia elétrica que atravessa os imóveis supra referidos não foram identificadas anomalias termográficas e visuais, estando os cabos e respetivas flechas, os acessórios (ligadores, isoladores, etc.) e apoios devidamente conservados, dentro da sua vida útil e aptos para a atividade de distribuição de energia em perfeito estado de conservação.

Termos em que o facto descrito sob o n.º 8 do elenco dos factos dados como provados - O incêndio teve origem nas linhas de média tensão e baixa tensão que atravessam o referido imóvel, em virtude do embate de uma cegonha nessas mesmas linhas deve passar a ter a seguinte redação: - O incêndio teve origem no embate de uma cegonha nas linhas de média tensão que atravessam o referido imóvel.

Quanto ao facto descrito sob o n.º 9 do elenco dos factos dados como provados: 9.

O que causou um de curto-circuito entre as linhas de condução de energia elétrica quando cegonha tocou em ambas as linhas de condução de energia projetando faíscas para o solo, sendo de seguida eletrocutada.

Nos termos dos depoimentos acima transcritos e também dos documentos ali referidos, não existe qualquer prova que permita dar como assente que foram projetadas faíscas para o solo.

Tendo em consideração os factos provados sob os nºs 22 (A rede da linha de distribuição de energia elétrica em que ocorreu o incêndio estava licenciada.) e 23 (Em Junho de 2014, no âmbito de uma ação de manutenção preventiva sistemática a toda a instalação de distribuição de energia elétrica que atravessa os imóveis supra referidos não foram identificadas anomalias termográficas e visuais, estando os cabos e respetivas flechas, os acessórios (ligadores, isoladores, etc.) e apoios devidamente conservados, dentro da sua vida útil e aptos para a atividade de distribuição de energia em perfeito estado de conservação), afigura-se relevante não permitir a dúvida sobre o adequado comportamento do equipamento da recorrida.

Termos em que o facto descrito sob o nº 9 do elenco dos factos dados como provados - O que causou um de curto-circuito entre as linhas de condução de energia elétrica quando cegonha tocou em ambas as linhas de condução de energia projetando faíscas para o solo, sendo de seguida eletrocutada - deve passar a ter a seguinte redação: - O que causou um de curto-circuito entre as linhas de condução de energia elétrica quando cegonha tocou em ambas as linhas de condução de energia, sendo de seguida eletrocutada e projetada para o solo em chamas.

3 - Quanto ao facto descrito sob o n.º 13 do elenco dos factos dados como provados: 13.

Que nesse local fora pela ré colocada que se refere ao facto descrito sob o n.º 12 (E no apoio em betão da linha de baixa tensão encontrava-se instalada uma infraestrutura (cesto) para nidificação de cegonhas) A colocação de um cesto para nidificação de cegonhas num apoio da rede de baixa tensão existente no prédio dos autos pela ré, foi considerado um facto relevante para a decisão a quo que por isso o evidenciou na fundamentação de facto da sentença.

Ora, com o devido respeito, em sede de prova testemunhal, produzida pela própria autora, foi explicitamente referido o...

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