Acórdão nº 2992/18.4T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelTOMÉ DE CARVALHO
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo nº 2992/18.4T8STR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo Central de Competência Cível de Santarém – J4 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: Na presente acção declarativa proposta por (…) contra “Banco BIC Português, SA”, esta instituição bancária veio interpor recurso da sentença proferida.

* O Autor pedia a declaração de nulidade do contrato de intermediação financeira celebrado entre Autor e Ré e a condenação do “Banco Bic, SA” a restituir-lhe o valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) acrescido de juros, à taxa legal, desde 08/10/2014 e até efectivo e integral pagamento.

* Para tanto, o Autor invocou que procedeu à aplicação de uma verba de € 50.000,00 num produto comercializado pelo “BPN – Banco Português de Negócios, SA”, que julgava equivalente a um depósito a prazo, mas que redundou na subscrição de obrigações, sem que de tal se apercebesse.

* Devidamente citada, a Ré apresentou articulado de contestação.

* Realizado o julgamento, o Tribunal «a quo» decidiu condenar a sociedade Ré “Banco BIC Português, SA” a pagar à Autora a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação, até integral pagamento.

* A instituição bancária recorrente não se conformou com a referida decisão e na peça de recurso apresentou as seguintes conclusões: I. O Banco Recorrente não pode concordar com a matéria de facto dada como provada descrita nos pontos 2.1.3, 2.1.4, 2.1.7 e 2.1.9.

II. Não pode ainda o Banco Recorrente concordar com a matéria de facto dada como não provada e descrita nos pontos 2.2.3 e 2.2.4.

III.A modif‌icação da matéria de facto impõe-se pelos depoimentos da testemunha … (f‌icheiro 20190528094943_2807059 _2871699), nos trechos acima indicados, conjugados com a análise dos documentos: boletim de subscrição de f‌ls. 59, nota informativa e nota interna do produto.

IV.A redacção dada aos factos impugnados deverá assim ser a seguinte: 2.1.3. Aí chegado foi recebido pelo funcionário do banco (…) o qual actuando em nome do mesmo, disse ao Autor, que tinha uma aplicação equivalente um depósito a prazo e com rentabilidade assegurada.

2.1.4. Consequentemente o Autor subscreveu € 50.000,00 em Obrigações SLN Rendimento Mais 2004 tendo assinado um documento denominado “Boletim de Subscrição” – cuja cópia consta a f‌ls. 59 o qual, no canto superior esquerdo ostenta o logotipo BPN – Banco Português de Negócios, e no canto superior direito SLN Rendimento Mais 2004 previamente preenchido pelo referido funcionário, através do qual é formalizada uma ordem de subscrição das referidas obrigações.

2.1.7. O que motivou a autorização por parte do Autor para tal aplicação, foi o facto de lhe ter sido dito pelo referido funcionário que o capital era garantido, e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim entendesse.

V. O facto 2.1.9 deverá ser considerado não provado pelo simples facto de conter uma conclusão que não se encontra minimamente motivada.

VI. Entende o Banco Recorrente não ter sido prestada qualquer garantia do banco relativamente ao reembolso do produto em causa.

VII. Ora caindo esta prestação de garantia, cairá também a responsabilidade do Banco Recorrente.

VIII. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verif‌icado tem que ver com o facto de o Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado aos Autores (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação f‌inanceira era um produto sem risco e com capital garantido, não transmitindo a característica da subordinação ou a possibilidade de insolvência da emitente, conf‌igura a prestação de uma informação falsa.

IX. Porém, tal realidade não conf‌igura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

X. Não adianta aliás o douto Acórdão qual o risco que associa às Obrigações SLN e que entende deveria ter sido informado aos AA, sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verif‌icado incumprimento do reembolso… XI. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

XII. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado risco geral de incumprimento! XIII. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento f‌inanceiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! XIV. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2014, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica –, em 2004, dez anos antes! XV. A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

XVI. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.

XVII. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! XVIII. A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

XIX. O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente! XX. A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

XXI. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de conf‌iança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.

XXII. A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação… XXIII. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! XXIV. A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos f‌inanceiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.

XXV. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densif‌icação ou explicação aos clientes, a f‌im de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá af‌irmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave! XXVI. O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo sua obrigação assegurar-se de que o cliente compreendeu a af‌irmação.

XXVII. A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição se aplica, apenas e só, às declarações negociais.

XXVIII. A comercialização por intermediário f‌inanceiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da falta de reembolso por parte da entidade emitente.

XXIX. O dever de informação ao cliente, não se trata de um direito absoluto do cliente à prestação de informações exactas, mas apenas de um dever de esforço sério de recolha de informações o mais f‌iáveis possível pelo banco. XXX.O grau de exactidão em relação às informações será variável, consoante o tipo de informação em causa.

XXXI. No caso dos presentes autos, f‌icou demonstrado, e foi assumido pelos Autores, que era do seu interesse e vontade investir em produtos de com boa rentabilidade e de elevada segurança.

XXXII. Apesar de os autores não serem investidores com especiais conhecimentos técnicos na área f‌inanceira o risco do produto em causa nos presentes autos era, pelas razões já várias vezes repetidas, baixo uma vez que nada fazia antever qualquer dif‌iculdade futura do emitente.

XXXIII. Assim, não pode o Banco Recorrente senão concluir que foram salvaguardados os legítimos interesses do cliente.

XXXIV. Resultou demonstrado que os funcionários, mais concretamente o funcionário que o colocou, sempre acreditaram – até praticamente ao momento do incumprimento – que se tratava de produto seguro e se preocupavam com os interesses dos clientes.

XXXV. Dispunha sobre esta matéria o artigo 304º do CVM no sentido de que os intermediários f‌inanceiros estão obrigados a orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da ef‌iciência do mercado, devendo conformar a sua actividade aos ditames da boa-fé, agindo de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.

XXXVI. E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312º, nº 1, alínea a), do CdVM, que obriga então o intermediário f‌inanceiro a informar o investidor sobre os “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar”.

XXXVII. Tal redacção refere-se necessariamente ao negócio de intermediação f‌inanceira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução.

XXXVIII. Tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento f‌inanceiro em si! XXXIX. A informação quanto ao risco dos instrumentos f‌inanceiros propriamente dito apenas veio a ser exigida prestar aos...

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