Acórdão nº 482/12.8TBACN.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelVÍTOR SEQUINHO
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 482/12.8TBACN.E1 * (…), insolvente nos presentes autos, recorreu do despacho que, no final do período da cessão, lhe recusou a exoneração do passivo restante, tendo formulado as seguintes conclusões: I. O despacho de que se recorre violou a disposição constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 243.º do CIRE, conjugada com a plasmada no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.

  1. Conforme dispõe a alínea a) do n.º 1 do artigo 243.º do CIRE, para que se materialize a circunstância que permita a recusa da exoneração do passivo restante por violação das obrigações impostas pelo artigo 239.º do CIRE, é condição verificarem-se dois pressupostos cumulativos: a) Que o devedor tenha actuado com dolo ou negligência grave; b) Que a sua actuação cause um prejuízo para os credores.

  2. Resulta do relatório final, apresentado pelo fiduciário em 13 de Abril de 2018, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 240.º do CIRE, que, não obstante a ora a recorrente não ter cumprido com a obrigação de entregar imediatamente ao fiduciário, quando por si recebida, a parte dos seus rendimentos objecto de cessão prevista no disposto na alínea c) do n.º 4 do art.º 239º do CIRE, a recorrente cumpriu com todas as restantes obrigações previstas no n.º 4 da citada norma.

  3. É o próprio fiduciário que refere, no seu relatório, que teve conhecimento das várias vicissitudes que decorreram no decurso da cessão de rendimentos, que têm a ver com a instabilidade da sua vida profissional.

  4. É o próprio fiduciário que alerta para as sérias dificuldades financeiras pelas quais a ora recorrente passou, o que nada tem que ver com actuações dolosas ou com negligência grave.

  5. O prejuízo para os credores deve, em nosso entendimento e salvo melhor opinião, ser um prejuízo relevante, por equiparação ao referido no artigo 246.º do CIRE, pois, quer a cessação antecipada, quer a revogação da exoneração, geram a mesma consequência na esfera jurídica da ora recorrente.

  6. A actuação da recorrente não causou um prejuízo relevante, que coloque em causa a satisfação dos créditos sobre a insolvência, tendo em conta o valor diminuto do rendimento disponível não entregue ao fiduciário, em comparação com o valor total do seu passivo.

  7. A decisão de recusa da exoneração, proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo, constitui consequência altamente gravosa para a ora recorrente, comparada com o escasso prejuízo causado aos credores, violando, desta forma o princípio constitucionalmente consagrado da proporcionalidade, previsto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa.

* A única questão a resolver consiste em saber se se verificam os pressupostos da recusa da exoneração do passivo restante.

* Os factos relevantes para a decisão do recurso, resultantes do processo, são os seguintes: 1 – (…), solteira, nascida em 28.08.1975, residente em (…), Serra de (…), apresentou-se à insolvência e requereu a exoneração do passivo restante em 03.12.2012.

2 – Por sentença proferida a 05.12.2012, (…) foi declarada insolvente.

3 – O agregado familiar da insolvente é constituído por si e por sua filha (…), nascida em 13.03.2009, que sustenta.

4 – Desde data anterior ao relatório do administrador da insolvência previsto no artigo 155.º do CIRE, junto aos autos em 14.01.2013, a insolvente é funcionária do Município de (…), com a categoria de assistente operacional; trabalha ainda, a tempo parcial, como operadora no Modelo Continente Hipermercado, S.A., sito em (…).

5 – Na data referida em 4, os rendimentos da insolvente eram os seguintes: - Como funcionária do Município de (…): salário-base de € 487,46, acrescido de subsídio de refeição; após os descontos a que estava sujeita, salário líquido de € 511,93; - Como empregada de hipermercado: salário-base de € 223,00, acrescido de subsídios de refeição e por trabalho nocturno e ao domingo; após os descontos a que estava sujeita, salário líquido variável entre € 356,03 e € 384,50.

6 – Na data referida em 4, a insolvente residia em casa pertença de seus pais, assumindo as despesas fixas com água, electricidade e gás.

7 – Na data referida em 4, as dívidas da insolvente tinham o montante global de € 34.993,00, sendo credores a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de (…), CRL, a (…), o Estado Português, o (…) Bank PCL, o Banco (…), SA e a (…); o património da insolvente era constituído por um conjunto de bens móveis domésticos impenhoráveis.

8 – A insolvente não tem antecedentes criminais.

9 – Por despacho proferido na assembleia de credores, realizada em 21.01.2013, foi declarado encerrado o processo, por insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas processuais e as restantes dívidas da massa insolvente.

10 – Ainda na assembleia de credores, foi liminarmente admitido o pedido de exoneração do passivo restante; o valor excluído do rendimento disponível nos termos do artigo 239.º, n.º 3, alínea b), ponto i), do CIRE, foi de € 700,00 por mês, valor esse actualizável de acordo com a...

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