Acórdão nº 8563/15.0T8STB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução21 de Maio de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 8563/15.0T8STB-A.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I.

Relatório 1. (…), residente na Av.ª (…), nº 6, em Setúbal, por apenso à execução sumária para pagamento de quantia certa que lhe foi instaurada pela Caixa Geral de Depósitos e em que são co-executados (…), (…) e (…), veio deduzir oposição mediante embargos.

Alegou que a escritura pública do contrato de mútuo, dada à execução, foi celebrada em 22/12/89, o mútuo foi resolvido em 20/3/1993, ficando em dívida a quantia de € 34.449,95 e a execução deu entrada em 7/10/2015.

O prazo de prescrição da dívida é de cinco anos e como decorreram mais de 22 anos entre a resolução do contrato e a instauração da execução, a dívida mostra-se prescrita.

Concluiu pela extinção da execução.

A Embargada contestou argumentando, em resumo, que a dívida emerge de uma única obrigação, pagável em prestações, cujo incumprimento implicou o imediato vencimento de todas, a que é aplicável o prazo ordinário da prescrição e não o prazo de cinco anos e, de qualquer forma, o prazo prescrição interrompeu-se com a citação da Embargante, e dos demais executados, para a ação executiva, que correu termos com o nº 341/97 e com o reconhecimento da dívida pelos devedores, em reuniões havidas entre a embargada e os mutuários e representante destes, entre 23/6/1998 e 24/5/2002, com vista a formalizarem um acordo de pagamento ou a eventual venda do imóvel hipotecado.

Concluiu pela improcedência dos embargos.

  1. Seguiu-se despacho saneador que conhecendo do mérito da causa dispôs a final: “(…) considerando verificada a exceção da prescrição, julgo os presentes embargos procedentes e, por consequência, determino a extinção da execução relativamente à embargante.” 3. A Embargada recorre da sentença formulando as seguintes conclusões: “1. O presente recurso foi interposto da Douta Sentença com a Referência 89368085, proferida pelo M.º Juiz a quo, a qual “considerando verificada a exceção da prescrição, julgo[u] os presentes embargos procedentes e, por consequência, determino[u] a extinção da execução relativamente à embargante”.

  2. Decidindo como decidiu, salvo o devido respeito, o M.º Juiz a quo não fez correta nem adequada aplicação do Direito.

  3. A Apelante está, pois, convicta que Vossas Excelências, reapreciando a matéria dos autos e subsumindo-a nas normas legais aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar a Douta sentença proferida pelo Tribunal a quo.

  4. Salvo o devido respeito, é manifesto que, da prova produzida, não poderia o douto Tribunal a quo concluir que, por um lado, o crédito exequendo encontra-se prescrito e que, por outro lado, não ocorreu qualquer circunstância suscetível de produzir o efeito interruptivo da prescrição.

  5. Vejamos: resulta dos autos que, em 18.04.1997, a Recorrente instaurou uma ação executiva para pagamento de quantia certa, à qual foi atribuído o n.º 341/97, contra (…), (…), (…) e (…).

  6. Tendo a Recorrente comunicado aos mutuários e aos fiadores, onde se inclui a aqui Recorrida, que “foi enviado ao Tribunal Cível da Comarca de Setúbal o expediente necessário à instauração do processo executivo, para cobrança integral e coerciva do crédito referente ao empréstimo em epígrafe”.

  7. Foram ainda realizadas reuniões, nas quais foram apresentadas propostas pelos devedores, analisadas diversas possibilidades de acordo e de eventual venda extrajudicial do imóvel hipotecado, sendo manifesto que, através destas propostas e reuniões, os devedores reconheceram a dívida para com a aqui Recorrente, pese embora não tenha sido alcançado um acordo entre todas as partes.

  8. Ademais, o requerimento executivo inicial foi apresentado em juízo tendo por base a escritura pública que subjaz ao mútuo com hipoteca e fiança celebrado e o respetivo documento complementar que inequivocamente atesta as responsabilidades assumidas pelas partes, bem como as respetivas sanções a aplicar em caso de incumprimento. 9. Aqui chegados, e conforme vertido na douta sentença proferida pelo Tribunal a quo “Coloca-se assim a questão de saber se, face à exigibilidade de toda a dívida, o prazo de prescrição a considerar deve ser o ordinário, de vinte anos, estabelecido no art. 309º, e não o prazo de cinco anos previsto na alínea e) do art. 310º, que dispõe que as quotas de amortização do capital pagáveis com os juros prescrevem no prazo de cinco anos”.

  9. Considera a Recorrente que a resposta terá que ser afirmativamente a primeira solução apresentada, contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal a quo, o qual é do entendimento de que aos presentes autos é aplicável a segunda hipótese.

  10. Efetivamente, resulta dos autos, as prestações convencionadas no contrato que constitui título executivo da presente ação deixaram de ser pagas em 20.03.1993, o que implicou o imediato vencimento de todas as prestações, nos termos do disposto no artigo 781.º do CC e do clausulado contratual.

  11. Daqui resulta que em causa está uma dívida previamente fixada que seria paga em diversas frações também elas previamente estipuladas, ou seja, estamos perante o vencimento antecipado de uma obrigação liquidável em prestações pela perda do benefício do prazo, razão pela qual a obrigação exequenda não é subsumível à alínea e) do artigo 310.º do CC, mas sim ao artigo 309.º do mesmo diploma.

  12. Ainda a este propósito, ensina o Prof. Galvão Telles (in “Obrigações”, 2.ª ed., 178) que não se devem confundir as dívidas a prestações e as dívidas periódicas. Nestas últimas há uma pluralidade de obrigações distintas, embora todas emergentes de um vínculo fundamental, de que nascem sucessivamente como dívidas de renda, que periodicamente se constituem com base no contrato de arrendamento. Nas primeiras, pelo contrário, há só uma obrigação cujo objeto é dividido em frações com vencimentos intervalados.

  13. O Prof. Galvão Telles defende, assim, que “as prestações periódicas resolvem-se em atos sucessivos, com intervalos regulares ou irregulares, como a obrigação do inquilino de pagar as rendas ou a do fornecedor de fazer entregas à medida que forem solicitadas” (in “Direito das Obrigações”, 7.ª ed., pág. 39 e seguintes), respeitantes a créditos emergentes de contratos de prestação de serviços, designadamente fornecimentos de bens essenciais, com vencimento periódico e reiterado, em regra representativos de contrapartidas resultantes da utilização de certos bens ou serviços.

  14. Mais acrescenta que “não se confunde com esta última categoria o caso de uma obrigação única dividida ou fracionada em parcelas. Existe então uma obrigação global que é efetuada por partes, escalonadas no tempo, as quais se dizem “prestações” num sentido especial da palavra: pode apontar-se como exemplo (…) um empréstimo em dinheiro em que se convencione o pagamento parcelado”.

  15. Efetivamente, nas prestações fracionadas o tempo não influi na determinação do seu objeto mas tão-somente se relaciona com o seu modo de execução, ao contrário das prestações duradouras, nas quais a prestação devida depende do fator tempo.

  16. Aliás, conforme doutrinariamente defendido na obra “Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia”, volume III, página 47, 1.º, 2.º e 3.º parágrafos do ponto IV, redigida pelo Professor Dr. Jorge Miranda: “Na verdade, na situação prevista no artigo 310.º, alínea e), não estará em causa uma única obrigação pecuniária emergente de um contrato de financiamento, ainda que com pagamento diferido no tempo, a que caberia aplicar o prazo ordinário de prescrição, de vinte anos (…).” 18. A este propósito, ensina Menezes Cordeiro que “a prescrição quinquenal apenas se irá aplicando escalonadamente, na medida do plano de...

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