Acórdão nº 3242/18.9T8STR-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Setembro de 2020
Magistrado Responsável | FRANCISCO MATOS |
Data da Resolução | 24 de Setembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Proc. nº 3242/18.9T8STR-B.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório 1. Banco (…), S.A., com sede na Praça (…), 28, Porto, requereu a declaração de insolvência de (…), solteiro, maior, residente na Rua da (…), Lote 9, 1º dtº, Samora Correia.
Alegou em resumo que é credora do requerido no montante (capital e juros) de € 125.348,06, proveniente de um empréstimo, garantido por hipoteca, cujas prestações mensais o requerido deixou de pagar a partir de 2/2/2017 e da quantia (capital e juros) de € 531,32, a título de descoberto na conta de depósitos à ordem por aquele titulada nos seus balcões.
Ao requerido é conhecido apenas um bem imóvel com o valor patrimonial de € 107.597,92, sobre o qual incide hipoteca a favor da requerente e uma penhora a favor da Autoridade Tributária e Aduaneira para pagamento da quantia de € 4.536.655,38.
O património do requerido é manifestamente insuficiente para solver o seu passivo e a execução instaurada pela Autoridade Tributária revela que a sua situação financeira não lhe permite cumprir as suas obrigações e, entre elas, as que respeitam ao Banco requerente.
Pediu a declaração de insolvência do Requerido.
O Requerido deduziu oposição argumentando, em resumo, que não se mostra em incumprimento perante a Requerente, uma vez que esta não o notificou do incumprimento definitivo do contrato e também não o integrou no PERSI, pressuposto indispensável à instauração de qualquer execução contra si e, assim, da execução universal que o processo de insolvência representa.
As dívidas tributárias que motivaram a penhora do imóvel eram originariamente da sociedade (…) e (…), Unipessoal, Lda., foram objeto de reversão para o Requerido, enquanto devedor subsidiário, reversões sobre as quais incidem oposições e só em caso de improcedência destas se poderá concluir pela sua responsabilidade quanto às dívidas tributárias.
Concluiu pela improcedência do pedido.
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Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e depois foi proferida sentença, em cujo dispositivo designadamente se consignou: “Pelo exposto e decidindo: Julgo procedente, por provada, a presente ação e, em consequência, declaro a insolvência de (…)”.
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O Requerido recorre da sentença e conclui assim a motivação do recurso: “51. A sentença a quo entende ter-se verificado o incumprimento definitivo, contudo não é possível assim concluir pelo teor da missiva de 22/02/2017.
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Afirmar no 1ª mês em que falha pela primeira vez o pagamento da prestação mensal do contrato que “... deixou de ter condições económicas e financeiras para honrar o seu compromisso...” truncando outras expressões “... impossibilidade de cumprir (...) os termos do contrato ...” não pretende manifestar intenção firme e definitiva de não cumprir o contrato.
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Pretende sim, demonstrar a impossibilidade de cumprir os termos do contrato da forma como ele foi inicialmente desenhado.
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Não invalidando o direito que tem, na nossa perspetiva até irrenunciável, a inclusão em PERSI sendo até informado de direitos que podia até desconhecer.
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Não tendo sido, aliás, informado dos seus direitos no âmbito do PERSI, mesmo que se ajuizasse a carta de 22/02/2017 como manifestação de intenção de não cumprimento das obrigações (da qual discordamos completamente), tal seria sempre uma declaração que não poderia produzir efeitos considerando o regime obrigatória, pelo menos de instauração e dever de informação do PERSI.
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Com o teor da transmissão de 22/02/2017, a instituição bancária deveria, por imposição legal inclui-lo automaticamente no PERSI nos termos dos seus deveres plasmados no artigo 4º e seguintes do DL nº 227/2012, de 25/10 e especialmente a alínea b) do nº 1 e nº 2 do artigo 9º do mesmo diploma.
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Mais, com toda a certeza o recorrente não manifestou intenção firme e definitiva de não cumprir pois até propôs uma forma de o cumprir alternativa através da dação.
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A dação seria uma forma de cumprimento do contrato.
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Em suma, consideramos incorreta a conclusão sobre a manifestação de intenção firme e definitiva de não pretender cumprir o contrato.
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Embora a sentença a quo, no 7º parágrafo de folhas 11 a sentença a quo reconhece com o PERSI a instituição de crédito está impedida de instaurar ações judiciais com a finalidade de obter a satisfação do seu crédito – artigo 18º, nº 1, alínea b), do DL nº 227/2012, de 25/10, reconhecer ainda no último parágrafo ainda de folhas 11 que a integração no PERSI é obrigatória sob pena de estarmos perante uma exceção dilatória.
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Por outro lado, no 2º parágrafo de folhas 14, a sentença a quo considera possível a petição de insolvência conforme o mesmo referido artigo 18º.
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Perspetivamos esta interpretação do artigo 18º não correta não respeitando a teleologia e a hermenêutica do ordenamento e com maus resultados dessa aplicação do direito.
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Da aplicação do direito na visão da sentença a quo obteríamos o enviesamento total quer do diploma DL nº 227/2012, de 25/10 quer mesmo do CIRE por tratar de execução universal não deixando de ser uma execução com características específicas.
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Mais, a jurisprudência é consensual relativamente a diversos pressupostos processuais para execuções cíveis aplicável naturalmente sem restrições a execuções universais e a esta em particular; 65. Interpretar o ordenamento no sentido de não ser necessário à instituição bancária iniciar, comunicar, tramitar e concluir o PERSI como requisito para peticionar insolvência vamos decerto assistir ao uso deste meio processual em substituição da instauração da execução comum.
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Se o legislador mostra querer construir um ordenamento que pretende proteger o mutuário do crédito bancário através de procedimentos sérios de restruturação da dívida, para mais em cenário onde a instituição bancária está protegida com garantias hipotecárias, provavelmente em 100% dos casos, então não seria a sua intenção que essa mesma instituição bancária pudesse peticionar a insolvência nessas mesmas situações.
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Se até se concede que a petição de insolvência possa ser peticionada por outros credores, não se concorda de todo, que tenha a instituição bancária legitimidade para assim peticionar sob pena da evidente distorção do ordenamento que se constrói para proteger o mutuário por um lado e depois por uma determinada interpretação da alínea b) do nº 1 do artigo 18º do DL nº 227/2012, de 25/10 permitiria e legitimaria a instituição bancária a requerer a insolvência, esvaziando por completo essa mesma construção.
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Motivos pelos quais, a declaração de incumprimento definitivo do contrato de mútuo com hipoteca entre a requerente e o requerido é um desses pressupostos obrigatórios assim como a inclusão em procedimento PARI ou PERSI e tramitação consequente.
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Também pelo exposto, o requerido não é devedor à requerente por falta de declaração e notificação do incumprimento definitivo.
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Quanto à questão da comunicação do início do PERSI, levanta-se, pois, a interrogação – de que serve o Banco afirmar que iniciou o PERSI se não sucede em provar que assim fez.
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Embora a sentença a quo dê como provado o envio da comunicação de início do PERSI (embora reconheça não existir prova do seu recebimento) e além de pensarmos não existirem no processo meios probatórios para reconhecer provado esse envio; 72. O envio de comunicações válidas e cartas para mais entre contraentes outorgantes em escritura obedece ao aí previsto devendo ser realizadas por correio registado.
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Ora a comunicação alegadamente enviada não foi acompanhada de registo postal pelo que não tendo validade na esfera do destinatário pouca relevância ou nenhuma terá se foi efetivamente enviada ou não.
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Mesmo os testemunhas indicadas pela instituição bancária não acrescentam nem podiam quanto à prova do envio da comunicação do início do PERSI, não tendo sido nenhuma delas a elaborar ou remeter a alegada carta, a qual teria foi centralmente emitida.
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As testemunhas, provenientes do balcão onde o mutuário tinha conta, não tinham qualquer relação com os serviços centrais do banco nem com a emissão da aludida comunicação socorrendo-se das mesmíssimas cópias incluídas no processo.
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Termos em que não se pode dar como provado a remessa da comunicação do início do PERSI ao destinatário e ainda que assim se entendesse como enviado a sua relevância jurídica é nula pois não tendo sido recebida não se poderá concluir pelo início e existência de PERSI.
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