Acórdão nº 911/18.7T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelMÁRIO SILVA
Data da Resolução24 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. 911/18.7T8EVR.E1 Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Évora I- RELATÓRIO (…), intentou a presente ação, sob a forma de processo comum, contra: (…), e (…), pedindo que: 1. Seja decretada a ineficácia, relativamente à autora, da dação em cumprimento pela escritura celebrada entre o réu (…) com a ré (…), relativamente aos prédios descritos no artigo 10º desta petição

2. Seja reconhecida a possibilidade de executar os bens no património da ré (…) ou praticar sobre ele atos de conservação da garantia patrimonial

3. Serem os 2º réus condenados na satisfação do crédito da autora, nos termos e para os efeitos do artigo 36º do C.P.C

Para tanto alegou, em síntese, que entre 2003 e 2012 efetuou vários empréstimos ao réu (…), no valor de € 67.400,00. Por não ter pago, veio o réu (…) a ser condenado no pagamento à autora da quantia de € 67.400,00, por decisão transitada em julgado no âmbito do processo n.º 301/12.5TBETZ, que correu os seus termos no Tribunal Judicial de Estremoz. O réu interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, que veio ser a ser julgado improcedente por acórdão notificado em 2/02/2015. Interpôs processo executivo para cobrança dos valores em dívida, que corre termos no Juízo de Execução de Montemor-o-Novo, sob o n.º 579/15.2T8MMN tendo sido notificada pelo Sr. Agente de Execução de que os únicos bens encontrados foram um veículo com a marca Mercedes, com reserva de propriedade a favor do Banco (…), S.A., e um direito de habitação sobre o prédio sito na Av.ª Dr. (…), n.º 29, em Estremoz, insuficientes para a garantia do pagamento daquele crédito. Tinha conhecimento que à data do acórdão acima referido, 1.º réu era proprietário de dois prédios: 1- O prédio sito na Av. Dr. (…), nº 29, em Estremoz, descrito na Conservatória do Registo Predial de Estremoz sob o nº …/19980924-A, da União de Freguesias de Estremoz (Santa Maria e Santo André); 2- O prédio sito na Rua (…), nº 3, em Estremoz, descrito na Conservatória do Registo Predial de Estremoz sob o nº …/19901109-A, da União de Freguesias de Estremoz (Santa Maria e Santo André). O réu alienou estes prédios urbanos à 2ª ré (…), que é sua sobrinha por escritura pública de dação em cumprimento, lavrada no Cartório Notarial de Salvaterra de Magos no dia 18-02-2015. O valor da dação em cumprimento resulta de uma dívida “fictícia” do réu (…) à ré (…), no montante de € 50.000,00, com vencimento até ao final de 2014. O valor patrimonial dos prédios à data da celebração da escritura de dação era de € 116.767,50; sendo que o valor real destes imóveis ascende a mais de € 150.000,00, em razão da sua localização e conservação; O 1.º réu deduziu contestação, defendendo-se por exceção, invocando o caso julgado / autoridade do caso julgado e por impugnação. Pediu ainda a condenação da autora em multa como litigante de má-fé. Foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual foi julgada improcedente a exceção dilatória do caso julgado / autoridade do caso julgado, e despacho de fixação do objeto do litígio e dos temas da prova. Realizou-se audiência final

Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo (que se reproduz): “Pelo exposto, julgo a presente acção procedente, por provada e, em consequência:

  1. Declaro a ineficácia, relativamente à Autora (…), da dação em cumprimento datada de 18/02/2015, feita pelo 1.º Réu (…) a favor da 2.ª Ré (…), dos seguintes prédios urbanos: 1) Fracção autónoma individualizada pela letra “A”, correspondente ao rés do-chão e primeiro andar com entrada pelo numero 29, destinado a habitação, com telheiro e logradouro, do prédio urbano sito na Avenida Dr. (…), números vinte e sete e vinte e nove, lugar de Santa Maria, União das Freguesias de Estremoz (Santa Maria e Santo André) e concelho de Estremoz, descrito na Conservatória do Registo Predial de Estremoz, sob o número (…), da freguesia de Santa Maria, e inscrito na respectiva matriz, sob o artigo (…); e, 2) Fracção autónoma individualizada pela letra “A”, correspondente ao rés do-chão – com entrada pela Rua (…), número três, destinada a habitação com logradouro, do prédio urbano, sito na Rua (…), n.ºs 3 e 3-A e Traseiras da Rua (…), s/n, lugar de Santa Maria, pertencente à união das freguesias de Estremoz (Santa Maria e Santo André) e concelho de Estremoz, descrito na Conservatória do Registo Predial de Estremoz, sob o número (…), da freguesia de Santa Maria, e inscrito na respectiva matriz, sob o artigo (…), podendo a Autora executar tais bens a fim de satisfazer os seus créditos e exercer os actos de conservação de garantia patrimonial autorizados por lei. b) Absolvo a Autora do pedido de condenação em litigante de má-fé deduzido pelo 1.º Réu. c) Custas pelos Réus, nos termos acima decididos, fixando-se a taxa de justiça em 8 UC. * Registe e notifique.” Inconformado com o decidido, veio o réu (…) interpor recurso, com as seguintes conclusões (que se reproduzem): 1º O que se discute no presente processo é saber se do acto (escritura de dação em cumprimento lavrada a 18/02/2015) resultou a impossibilidade ou agravamento da impossibilidade para a credora, de obter a satisfação integral do seu crédito, os factos posteriores à supra referida data, para a economia desta discussão tenham, tendo ou não, sido apurados na sentença da insolvência em (29/06/2015), são absolutamente irrelevantes. 2º Aparentemente, o raciocínio do julgador parecia estar alinhado com a doutrina e jurisprudência dominante sobre esta questão, ou seja, o momento a atender, para saber se do acto resultou a impossibilidade de satisfação do crédito do impugnante, era a data do acto impugnado. 3º Apesar do que foi inicialmente consignado, a data em que foram considerados como provados os factos constantes nos pontos 4, 10 a 16 foi a de 29/06/2015. 4º Parece-nos, assim, ser por demais evidente que existe discrepância e contradição entre o que foi referido em diferentes lugares da fundamentação da matéria de facto e a própria decisão. 5º Ou seja, os factos dados como provados constantes nos pontos 10) a 16) referem-se à data de 29/06/2015 e não à data de 18/02/2015. 6º Não é sustentável à luz da lei, da doutrina e da jurisprudência que a prova dos factos do que se discute no caso vertente, saber se do acto impugnado verificado a 18/02/2015, (escritura de dação em cumprimento) a data que releva para saber se dele, resultou a impossibilidade de satisfação integral do crédito da impugnante, possa ser feita a partir daquilo que foi apreciado na sentença da acção de insolvência que veio a ser intentada decorridos mais de dois meses, no dia 21/04/2015 a qual transitou no dia 27/10/2015. 7º A partir daqui, resultaram evidentes as contradições de raciocínio do julgador e as tensões plasmadas na sentença, acerca do momento a ter em conta para apurar a impossibilidade de satisfação integral do crédito da impugnante, que não podia ser outro que não fosse o dia 18/02/2015, com o entendimento expendido na sentença relativo à força e autoridade do caso julgado do que foi decidido no processo de insolvência nº. 69/15.3T8ETZ. 8º Ao chamar para a fundamentação do presente processo o que foi apurado no processo de insolvência nº. 69/15.3T8ETZ, aparentemente parecia ser algo de justificado segundo o princípio da autoridade do caso julgado. 9º Mas, a situação jurídica materialmente definida na sentença da insolvência, não é a mesma que a da presente acção, as regras substantivas que a enquadram esta acção exigem a verificação de determinados factos para a sustentação do pedido, como o da circunstância temporal bem precisa (data da prática do acto a impugnar), relevar para aferir da suficiência patrimonial do devedor. 10º Assim, à luz do que se discute nos presentes autos não existe qualquer autoridade do caso julgado, os factos apurados na sentença da insolvência não servem para provar o que aqui se discute. 11º E assim também é, porque na prolação do despacho saneador (ref.: 28284060), o tribunal já tinha decidido que não existia autoridade do caso julgado derivada do processo de insolvência «Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, julgo improcedente por não provada, a excepção dilatória do caso julgado e/ou autoridade do caso julgado». 12º Todas estas contradições, para além de serem motivo de nulidade da sentença não podem deixar de motivar a modificabilidade da decisão de facto, tendo em conta a inexistência de autoridade do caso julgado para sustentar o que foi decidido. 13º Os factos valorados e apreciados a partir da data indicada da sentença de insolvência no presente julgamento, são uma aberração, tendo em conta que a sentença deve constituir um silogismo judiciário, em que a norma jurídica constitui a premissa maior, os factos provados a premissa menor, sendo a decisão a consequência lógica de tais premissas. 14º Mas, “in casu” verificou-se um desvio e contradição entre os factos, a decisão no despacho saneador e a decisão na sentença, cuja consequência não pode ser outra, senão a nulidade da sentença por estarem às avessas uns com os outros. 15º O ponto 17) dos factos dados como provados na decisão da matéria de facto, não podia ter sido dado como provado com base naquilo que foi decidido no processo de insolvência e conforme foi referido na fundamentação, por não constar o mesmo dos factos provados da insolvência e ainda porque a data constante no ponto 17) é muito posterior ao trânsito em julgado do processo de insolvência, a qual ocorreu em 27/10/2015. 16º As contradições entre o decidido na sentença, no despacho saneador e o escrito na fundamentação são suficientemente flagrantes para gerarem a nulidade da sentença. 17º A Autora não respondeu à matéria da excepção peremptória da suficiência patrimonial do Réu, e isso só podia ter tido uma consequência, o efeito cominatório previsto no artigo 574º, nº 2, ex vi artigo 587º, nº 1, do CPC, a admissão dos factos alegados pelo Réu por acordo e a consequente absolvição dos Réus do pedido. 18º Esta questão processual deveria ter...

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