Acórdão nº 439/08.3TBMGL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Maio de 2009

Data12 Maio 2009
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam os juízes da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra 1. RELATÓRIO A...

e esposa B...

, C...

e esposa, D...

, E...

e esposa, F...

propuseram contra G...

e esposa H...

, I...

e marido, J...

, L...

e marido, M...

, N...

, O...

e marido P...

, Q...

e mulher R...

e O...

, o presente procedimento cautelar comum, pedindo que o tribunal ordene aos requeridos: a) que não mais coloquem quaisquer obstáculos no caminho ou, por qualquer forma, impeçam ou dificultem a circulação de pé e de carro pelo mesmo; b) que não mais realizem quaisquer trabalhos ou obras no caminhos e nos respectivos muros de suporte que impeçam ou dificultem a circulação de pé e de carro pelo mesmo; c) que retirem todos os obstáculos que impedem a circulação de pé e de carro através do referenciado caminho e procedam ao aterro da cratera identificada no artigo 52.º do requerimento inicial e reconstrução do muro de suporte por forma a ser possível a circulação de veículos pelo caminho; d) que não impeçam ou dificultem a realização pelos requerentes de quaisquer obras no caminhos necessárias a permitir a circulação através deste de pé e de carro.

Para fundamentar a sua pretensão invocam, em síntese, que são proprietários de prédios sitos em Ponte Nova, freguesia de Germil, prédios aos quais sempre acederam por um caminho público, até que os requeridos, que questionam a pública dominialidade do caminho, invocando que o mesmo lhes pertence, obstruíram o mesmo, impedindo que os requerentes por aí passem; em virtude dessa actuação os primeiros requerentes tiveram de suspender as obras de construção de uma habitação no seu prédio, sendo que a licença da obra terminará em 25 de Março de 2009, os segundos requerentes cultivam o prédio rústico de sua propriedade e nele construíram um barracão, no qual tinham uma cabra que foi morta recentemente e os terceiros requerentes deixaram de aí poder passar os fins de semana.

Subsidiariamente, e para o caso de se reconhecer que o caminho pertence aos requeridos, sempre se teria constituído a favor dos prédios dos requerentes o direito de servidão de passagem, pelo instituto da usucapião, uma vez que os requerentes, há mais de 30 anos, por si e antecessores utilizam o referido caminho, de pé e de carro, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, ignorando que lesavam os direitos de outrem e no convencimento de exercerem um direito próprio.

Os requeridos apresentaram oposição, impugnando a factualidade invocada pelos requerentes. Sustentam, em síntese, que o leito do caminho está implantado no seu prédio, sendo sua propriedade e sempre se destinou ao uso dos donos da Quinta da Retorta e que os requerentes podem aceder aos seus prédios por dois caminhos públicos, pelo lado de Germil e Ponte do Cavalo, querendo passar pelo caminho dos requeridos apenas para “encurtarem distância”; aqueles caminhos são absolutamente transitáveis e mesmo que não estejam, eventualmente, nas melhores condições só a inércia e negligência dos requerentes e da Junta de Freguesia de Germil se deve.

Procedeu-se à audiência final.

Proferiu-se sentença, que concluiu da seguinte forma: “Atento o exposto, julgo o procedimento cautelar improcedente e, em consequência, absolvo os requeridos do pedido mencionado nas als. a) a d) de fls. 47.

Custas do procedimento pelos requerentes.

Registe e notifique”.

Não se conformando, os requerentes apresentaram recurso formulando as seguintes conclusões: “

  1. A prova decorrente dos depoimentos testemunhal e documental, identificados em II-8, impõem decisão diversa da recorrida quanto aos artigos 78.°, 79.° e 80.° do requerimento inicial e aos pontos 3.14, 3.26, 3.64 e 3.71 da sentença "a quo", bem como quantos às alíneas a) e s), enfermando a decisão proferida de deficiente e errónea analise critica da prova produzida violando o disposto 653° n° 2 CPC.

  2. Relativamente à matéria de facto dos artigos 78.°, 79.° e 80.° do requerimento inicial deve ser sempre considerada provada bem como, deverá ser alterado o teor da resposta dada à matéria de facto constante do ponto 3.71 da sentença "a quo", o qual deverá passar a ter o conteúdo indicado no último parágrafo de II-1.

  3. Da análise em conjunto da prova produzida não poderá resultar entendimento diverso relativamente ao título a que foi cedido o caminho e quanto ao animus da sua utilização pelos requerentes devendo ser considerado em ambos os casos como público ou, subsidiariamente, como particular.

  4. Relativamente à matéria de facto considerada provada dos pontos 3.14 e 3.26 e não provada nas alíneas a) e s) da sentença, considerando o pedido principal formulado de reconhecimento da pública dominialidade do caminho, deverá ser alterado o conteúdo das respostas consideradas provadas passando estas a ter o conteúdo indicado em II-4.

  5. Subsidiariamente à pretensão formulada na alínea anterior e, para o caso de não proceder tal pretensão, então deverá ser alterado o teor da resposta dada à matéria de facto dos pontos 3.14, 3.26 e 3.63 da sentença passando estes a ter o conteúdo indicado em II-5.

  6. A qualificação de um caminho como público pode fundamentar-se em dois fundamentos distintos: - No facto de ser propriedade de entidade de direito público resultante da sua afectação a entidade pública pelo anterior proprietário e estar afecto a tal utilização, não sendo necessária a verificação do requisito da imemorialidade; - No seu uso directo e imediato pelo público, desde tempos imemoriais, visando a satisfação de interesses colectivos relevantes.

  7. O anterior proprietário do terreno onde se situa o caminho de pé e de carro identificado nos autos afectou-o ao uso público e este encontra-se afecto a tal utilidade pelo que, o caminho é público.

  8. O primitivo carreiro por onde se circulava de pé é imemorial, por os vivos não se recordarem da data da sua construção e afectação ao uso público.

  9. Tendo ocorrido mudança do local onde se situava o carreiro e mantendo-se a sua afectação a uso público estamos perante situação enquadrável analogicamente em mudança de servidão, mantendo o novo caminho o requisito da imemorialidade para efeitos de classificação como caminho público.

  10. Os requerentes formularam no requerimento inicial, a título subsidiário, o pedido de reconhecimento de servidão de passagem de pé e de carro.

    A contraditoriedade do pedido subsidiário com o pedido principal não determina ineptidão do requerimento inicial por aquele só dever ser considerado para o caso de improcedência do pedido principal.

  11. Não se reconhecendo a existência de caminho público deverá então ser reconhecida a existência de servidão de passagem de pé e de carro a favor dos prédios dos requerentes e sobre o prédio dos primeiros requeridos nos termos constantes da matéria de facto provada.

    1) Nos autos encontra-se provada a probabilidade séria de existência do direito dos requerentes, fundado receio de que o seu direito sofra lesão grave e dificilmente reparável, adequação da providência solicitada para evitar a lesão, não ser o prejuízo resultante do decretamento da providência superior ao dano que se pretende evitar e não existe providência cautelar especificada que acautele aquele direito pelo que, deverá ser decretada a providência requerida”.

    Os requeridos apresentaram contra alegações, propugnando pela improcedência do recurso.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

    1. FUNDAMENTOS DE FACTO A 1ª instância deu como provada a factualidade que segue, procedendo esta Relação, nos termos do art. 667º do C.P.C., à correcção de um lapso que é evidente e decorre do próprio texto, ponderando o sentido da alegação dos requeridos – no art. 43º da oposição referiu-se que “todos os requeridos, como já se referiu, têm os caminhos/acessos públicos que sempre tiveram, pelo lado de Germil e Ponte do Cavalo, não constando a existência de outro no local”, quando se queria manifestamente aludir aos “requerentes”, lapso que passou para o texto da decisão, sob o ponto 3.77 – bem como à alteração da inserção da factualidade enunciada sob o ponto 3.64, que corresponde a alegação dos requerentes (art. 80º) mas foi colocada na decisão na parte alusiva aos “Factos indiciados emergentes da oposição”: Do requerimento inicial: 3.1 A requerente B... é dona e legítima proprietária do seguinte prédio: “Casa de habitação de dois pisos e duas dependências com a superfície coberta de 166m2, dependências com 27m2 e superfície descoberta com 784m2, sito no lugar de Moinhos do Pisão, Ponte Nova, freguesia de Germil, concelho de Penalva do Castelo, a confrontar de norte com Rio Dão, sul e poente caminho e nascente T..., inscrito na matriz predial urbana da dita freguesia sob o artigo 543º e descrita na Conservatória do Registo Predial de Penalva do Castelo sob o n.º 0680.” – Doc. n.º 1 junto a fls. 49 a 51 e que aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

    3.2 O referido prédio adveio à posse da requerenteB...por partilha das heranças abertas por óbitos de U... e V..., efectuada por escritura de 04 de Maio de 2005, lavrada no Cartório Notarial de Penalva do Castelo exarada a fls. 107 a 109 do livro 75-E. – Doc. 2 junto a fls. 52 a 57 e que aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

    3.3 A requerente D... é dona e legítima proprietária do seguinte prédio: “terra de cultura com videiras, oliveiras e fruteiras, com a área de 1.540m2, sita ao Lameirinho, Ponte Nova, freguesia de Germil, concelho de Penalva do Castelo, a confrontar de norte com herdeiros de X..., sul caminho, nascente V... e poente herdeiros de Z..., inscrito na matriz predial rústica da dita freguesia sob o artigo 1180º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Penalva do Castelo sob o nº 0759.” – Doc. nº 3 junto a fls. 58 e ss. e que aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

    3.4 Os requerentes E... e mulher F...são donos e legítimos proprietários do seguinte prédio: “Terra de pastagem com oliveiras, fruteiras e videiras em cordão com a...

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