Acórdão nº 4894/07.0TVLSB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Junho de 2008
Magistrado Responsável | ARLINDO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 03 de Junho de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A....
intentou o presente procedimento cautelar de apreensão de veículo automóvel, contra B...., já identificados nos autos, com o fundamento em, no desenvolvimento da actividade de financiamento de aquisições a crédito, nomeadamente de veículos automóveis, ter celebrado com a requerida, em 06 de Março de 2007, o contrato que teve por objecto o financiamento da quantia de 11.587,78 €, que esta destinou à aquisição de um veículo automóvel, de marca Ford, modelo Focus, com a matrícula 86-97-NN, de que se acha junta cópia a fl.s 25 e 26, aqui dado por reproduzido.
Como condição da celebração de tal contrato e como garantia do seu bom cumprimento, exigiu a ora requerente a constituição de reserva de propriedade, a seu favor, sobre o mencionado veículo, o que, assim, veio a verificar-se, mediante a venda da mencionada viatura à ora requerida, com tal reserva de propriedade, a qual se acha registada a seu favor, cf. certidão de fl.s 27, aqui, igualmente, dada por reproduzida.
De tal contrato decorria para a requerida a obrigação de pagar à requerente uma prestação mensal no montante de 238,86 €, por um período de 48 meses, sendo que aquela não efectuou o pagamento das prestações vencidas em 08/04; 08/05 e 08/06/2007, no montante de 237,35 €, cada, que, ainda, não pagou.
Em face do que, através de carta registada com aviso de recepção, datada de 02/07/2007, concedeu à requerida um prazo suplementar de 8 dias úteis para pagamento de tais quantias, findos os quais a mora se converteria em incumprimento definitivo, carta que a requerida não recebeu, apesar de enviada para a sua morada e sem que esta tenha pago as quantias em dívida ou procedido à entrega da viatura em causa.
Fundamenta o pedido de entrega da viatura na reserva de propriedade de que beneficia.
Inicialmente, os presentes autos deram entrada nas Varas Cíveis de Lisboa e distribuídos à 3.ª Secção da 5.ª Vara, foi proferido o despacho de fl.s 32 a 35, no qual se julgou aquele tribunal incompetente, em razão do território, atribuindo-a ao Tribunal da Comarca de Viseu.
Interposto recurso de agravo desta decisão, a mesma foi confirmada cf. Acórdão proferido no Tribunal da Relação de Lisboa, junto de fl.s 73 a 86, pelo que, a final, foram os autos remetidos ao Tribunal da Comarca de Viseu.
Conclusos os autos à M.ma Juiz, esta, conforme despacho de fl.s 100 a 103, indeferiu liminarmente o procedimento cautelar requerido, por falta de legitimidade activa da requerente, com o fundamento em que, nos termos do disposto nos artigos 15.º e 16.º do DL 54/75, de 12/02, a procedência da providência cautelar requerida, impõe que o titular da reserva de propriedade coincida na mesma pessoa jurídica do vendedor, sendo que só este tem legitimidade para a propositura definitiva da acção de resolução do contrato de compra e venda, para além de que, dado o carácter especial da providência requerida, não se pode recorrer a interpretação analógica, nos termos do disposto no artigo 11.º CC, no sentido de aqui abarcar outras figuras negociais que não a alienação, designadamente, o mútuo.
Inconformada, interpôs a requerente, o presente recurso de agravo, concluindo a sua motivação do seguinte modo (resumidamente): 1. Entendeu o M.mo Juiz a quo que não se encontravam reunidos os pressupostos para o decretamento da providência, nomeadamente não se verificava um dos pressupostos que é a resolução de um contrato de compra e venda.
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Ou seja, para o M.mo Juiz a quo não basta que se verifique a existência de reserva de propriedade inscrita a favor da requerente, nem que se verifique o incumprimento das obrigações que originaram a mesma, é necessário, também, que a referida reserva de propriedade seja garantia do cumprimento de um contrato de compra e venda resolvido, e não de qualquer outro.
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Ora, salvo o devido respeito, discordamos deste entendimento que, em nossa opinião, não faz a correcta interpretação da lei.
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A reserva de propriedade, tradicionalmente uma garantia dos contratos de compra e venda, tem vindo, face à evolução verificada nas modalidades de contratação, a ser constituída como garantia dos contratos de mútuo, sobretudo, daqueles cuja finalidade e objecto é financiar um determinado bem, ou seja, quando existe uma interdependência entre o contrato de mútuo e o contrato de compra e venda.
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Nestas situações tem-se verificado uma sub-rogação do mutuante na posição jurídica do vendedor, isto é, o mutuante ao permitir que o comprador pague o preço ao vendedor, sub-roga-se no risco que este correria caso tivesse celebrado um contrato de compra e venda a prestações, bem como, nas garantias de que este poderia dispor, no caso, a reserva de propriedade.
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Este entendimento encontra pleno acolhimento no artigo 591.º CC, bem como, no princípio da liberdade contratual estabelecido no artigo 405.º CC, uma vez que, não se...
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