Acórdão nº 624/04.7TBALB de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Junho de 2008

Data17 Junho 2008
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I)- RELATÓRIO A.....

e marido B....., C.....

e esposa D....., E....., F.....

e marido G....., H.....e marido I....., J.....

e marido K.....

intentaram, no Tribunal Judicial de Albergaria-a-Velha, acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra L.....

e marido M.....

e, ainda, contra N.....

e marido O.....

, pedindo a)-seja declarado que o prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana de Valmaior, freguesia de Albergaria-a-Velha, sob o art. 56, composto de casa de habitação, dependência e logradouro, sito no lugar de Mouquim, pertence na sua totalidade ao dissolvido casal de S..... e R....., que foram de Mouquim, Valmaior, e de que os AA. são os herdeiros, e consequentemente, sejam os RR condenados a reconhecê-lo; b)-O cancelamento do registo da inscrição a favor das RR. (cota G-1) constante da ficha n.º 04084/021226 da freguesia de Valmaior.

Como fundamento da sua pretensão, os AA. alegaram, em resumo, a seguinte factualidade: -Por escritura pública de 16.12.2003, os AA. procederam à partilha dos bens do dissolvido casal comum de S..... e João Silva; -Além dos prédios aí partilhados faz ainda parte um prédio urbano, composto de casa com sete divisões para habitação, uma dependência e logradouro, situado em Mouquim, Valmaior, Albergaria-a-Velha, inscrito na matriz urbana sob o art. 56; -Até cerca de 1940, aquele prédio pertenceu a P....., a seu irmão Q..... e a herdeiros de uma irmã, pré-falecida, na proporção de 1/3 indiviso para cada um; -Cerca de 1940, o R..... referido comprou a totalidade daquelas quotas, mas sem redução a escritura pública ou outros documentos; -Depois daquela data o R..... e esposa S....., depois os filhos os seus filhos, os AA., passaram a exercer a posse boa para a usucapião; -Porém, em 2003, ao prepararem a escritura de partilhas por óbito de seus pais, os AA. verificaram que os RR. tinham registado em seu nome, em Dezembro de 2002, o direito a 1/3 daquele prédio; -Tal registo foi efectuado porque em nome do pai dos RR., falecido, e na proporção de 1/3, estava ainda inscrito na matriz aquele prédio, estando as demais quotas inscritas em nome das pessoas a quem os pais dos AA. haviam verbalmente adquirido a totalidade das quotas; -Porque foi assim o prédio descrito pelos RR. na Conservatória, os AA. não conseguiram incluí-lo na partilha, sendo abusiva a atitude dos RR. ao arrogarem-se a titularidade de 1/3 do prédio.

Citados, os RR. contestaram, concluindo pela improcedência da acção. Com relevância, alegaram que o seu antecessor (Q.....) jamais vendeu ao R..... a sua quota de 1/3 no prédio, continuando na posse e titularidade até à data da sua morte, ocorrida em 14.04.1951, sucedendo na titularidade do direito o seu filho T....., pai das Rés, passando este a figurar na matriz. Aquando da partilha por óbito de Q....., foi adjudicado ao T..... esse direito, e por óbito destes, foi esse direito incluído na relação de bens para liquidação do imposto sucessório. Os RR., e antecessores, sempre estiveram na posse e fruição do prédio, exercida seja por si seja através dos compossuidores e sem que os AA., meros comproprietários, tenham alguma vez, hajam realizado contra os RR. ou seus antecessores, quaisquer actos materiais de oposição ao seu direito de compropriedade.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido dispensada a selecção da factualidade relevante, atenta a sua simplicidade.

Após audiência de julgamento foi proferida sentença a julgar a acção totalmente procedente e provada.

Os RR. não se conformaram com tal decisão, dela apelando para este Tribunal a persistir na sua tese, tendo extraído da sua alegação as seguintes conclusões: 1ª-Os detentores ou possuidores precários indicados no art. 1253º do CC que, tendo embora a detenção da coisa, não exercem sobre ela os poderes de facto com o animus de exercer o direito real correspondente, não podem adquirir para si, por usucapião, o direito possuído, excepto achando-se invertido o título de posse, como decorre do art. 1290º do CC… mas podem adquiri-lo para a pessoa que representam nos termos do n.º1 do art. 1252º do CC.

  1. -O proprietário inscrito, e portanto titular, pode não estar de facto na detenção da coisa e, apesar disso, haver posse, como se verifica nas situações previstas nas alíneas b) e c) do art. 1253º do CC (posse em nome alheio e tolerância do titular do direito)…Sendo que a posse assim exercida produz todos os seus efeitos na esfera jurídica do representado.

  2. -Em oposição à regra geral de que os efeitos jurídicos só atingem os que os praticam ou as pessoas em nome de quem foram praticados, o art. 1291º do CC estabelece uma regra de solidariedade entre os compossuidores… cada um dos compossuidores representa todos os outros no exercício da posse e, portanto, se em relação a um se verificar a usucapião, ela aproveita todos.

  3. -A lei não se afasta neste artigo (1291º do CC) da doutrina do n.º2 do art. 1406º do CC, relativo à compropriedade, que estabelece que o uso da coisa comum por um dos comproprietários não constitui posse exclusiva ou posse de quota superior à dele, salvo se tiver havido inversão do título de posse.

  4. -Não havendo, portanto, posse exclusiva por parte dos compossuidores, embora seja o único a praticar os actos materiais constitutivos do corpus, não pode haver usucapião em sem benefício, mas em benefício de todos.

  5. -O compossuidor, ou comproprietário, que pratique os actos materiais constitutivos do corpus sobre o todo, são havidos, relativamente à quota do bem que lhes não pertence, como possuidores precários… E não podem adquirir por usucapião o direito possuído, não se achando invertido o título da posse, como resulta expressamente da doutrina da alínea d) do art. 1263º do CC…E mesmo havendo inversão do título, o prazo só começa a correr a partir do acto da inversão (art. 1290º do CC).

  6. -A inversão do título de posse supõe a substituição de uma posse precária, em nome de outrem, por uma posse em nome próprio. A uma situação sem relevo jurídico especial vem substituir-se uma posse com todos os requisitos e com todas as consequências legais… Para o efeito torna-se necessário um acto de oposição contra a pessoa em cujo nome possuía… o detentor há-de tornar directamente conhecida da pessoa em cujo nome possuía a sua intenção de actuar como titular do direito.

  7. -Da factualidade levada aos pontos de facto (5), (6), (7), (13), (14), (15) e (17) da sentença, decorre inelutavelmente a qualidade em que os RR. estão investidos, enquanto herdeiros e sucessores de W..... Ventura (pai) e Q..... (avô paterno), de comproprietários, na proporção de 1/3 do prédio identificado em (5) da factualidade tida pro provada.

  8. -Não resulta provado dos autos que tenha havido entre os antepossuidores dos RR. e dos AA. qualquer negócio de compra e venda relativo a esse 1/3 do imóvel em questão, ou seja, que os antecessores dos RR. o tenham vendido e recebido o respectivo preço, e os antecessores dos AA. (ou os próprios AA.) o tenham adquirido e pago o respectivo preço.

  9. -Como também não resulta provado que os antecessores dos RR. ou os RR., se tenham demitido do exercício do seu direito de propriedade, declinando-o em favor de outrem (os AA. ou seus antecessores)…Isto é, não há qualquer elemento que permita concluir que tivesse havido um negócio translativo daquele direito de propriedade, na proporção de 1/3 sobre o dito imóvel, relativamente ao qual têm sido os RR. a pagar os impostos respectivos.

  10. - Os AA. não dispõem de título quanto ao 1/3 do imóvel inscrito e registado...

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