Acórdão nº 665/1998.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelTÁVORA VÍTOR
Data da Resolução22 de Janeiro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra.

A......

, intentou a presente acção declarativa sob a forma sumária contra B... e marido, C...., pedindo a condenação dos Réus no pagamento da quantia de 1.321.190$00, acrescida de juros vincendos desde a data da citação.

Para tanto, alega que, no âmbito da sua actividade comercial celebrou um contrato de fornecimento de ervilha com a Ré, nos termos do qual lhe forneceria sementes de ervilha, serviço de sementeira (tudo no dito valor de 1.321.190$00) e toda a assistência técnica.

Acordaram as partes que se a Ré deixasse que a cultura viesse a sofrer danos por vários factores, de onde resultasse a impossibilidade da colheita mecânica não seria imputada qualquer responsabilidade à Autora.

Acontece que no final do processo de cultura não houve produção que a Autora pudesse adquirir, por falta de cumprimento das instruções dadas pela Autora, por parte da Ré.

Finalmente, alega que o preço da sementeira seria descontado no preço que a Autora viesse a adquirir à Ré, tendo a Autora sofrido grande prejuízo pela falta de produção.

Os Réus contestaram. A Ré mulher excepciona a prescrição do crédito invocado, por já terem decorrido mais de três anos desde a data da factura e a da sua citação e a ilegitimidade do Réu, uma vez que está judicialmente separada de bens do Réu, sendo ela a única outorgante do contrato em causa. No mais, impugna parcialmente a factualidade invocada pela Autora, negando não ter cumprido as instruções dadas por aquela e imputando a impossibilidade da colheita às chuvas diluvianas que ocorreram.

Conclui, pugnando pela sua absolvição do pedido.

O Réu invoca, nos mesmos termos a sua ilegitimidade e, no mais, reproduz a contestação apresentada pela Ré.

A Autora respondeu alegando que a Ré exerce a actividade de agricultora como actividade comercial concluindo assim pela não prescrição do seu crédito.

No saneador conheceu-se da validade e regularidade da instância relegando-se para final o conhecimento das invocadas excepções.

Procedeu-se a julgamento acabando por ser proferida sentença que julgou a acção totalmente procedente e assim condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 6.590.07, acrescida de juros à taxa legal que em cada momento for devida desde 10/3/1999, até efectivo e integral pagamento.

Daí o presente recurso de apelação interposto pela Ré, a qual no termo da sua alegação pediu que se profira Acórdão no sentido de se considerar que a recorrente não é devedora da recorrida, atenta a divisão de risco contratualizada que impõe que cada um dos outorgantes do contrato arcasse com os seus prejuízos.

Foram para tanto apresentadas as seguintes, Conclusões.

1) O Sr. Juiz a quo ao dar como não provada a matéria constante no nº 33 da base instrutória efectuou um julgamento errado da prova existente nos autos; 2) O depoimento da testemunha ......, proferido na cassete 1, lado B a voltas 111 a voltas 276, do referido lado e que aqui se dá por integralmente reproduzido, é claro quanto a quem competia os riscos do contrato, pelo que deveria ter sido dado como provada a matéria constante no nº 33 da Base instrutória, ou seja que "o contrato celebrado entre a A. e a R. pressupunha, como se veio a efectuar, uma divisão dos riscos da cultura?”; 3) Mas ainda que não se considerasse o testemunho como suficiente para se dar como provado o constante no artº 33, a prova documental existentes nos autos, o contrato celebrado, por si só ou conjuntamente com o testemunho supra referido, é suficiente para se dar como provado o ponto da base instrutória; 4) O Sr. Juiz a quo efectua uma deficiente leitura, quer literal quer lógica do contrato celebrado entre recorrente e recorrida, pelo que enferma a sua decisão de dar como não provado o ponto 33 da base instrutória, de erro; 5) Violou assim a sentença em análise o disposto no artº 653º nº 2 do C.P.C., pelo que se deve dar como provada a matéria constante no nº 33 supra-aludido; 6) A qualificação dada ao contrato pelo Sr. Juiz a quo é incorrecta, porquanto entende estarmos perante uma união de contratos, ambos de compra e venda.

7) Estamos sim perante um contrato atípico misto, do tipo múltiplo, em que se verifica uma componente de contrato de compra e venda, um contrato de prestação de serviços consubstanciado numa empreitada e um contrato de compra e venda de bens futuros; 8) Face à caracterização do contrato, partindo da teoria da combinação, verifica-se que aplicando, ao fornecimento da semente de ervilha, a regra geral do artº 796 do C. C. e à sementeira as normas dos artsº 1 228º e 1212º do C. C., a responsabilidade pelo perecimento da coisa deveria caber à Recorrente, tendo esta de pagar as prestações peticionadas pela recorrida.

9) Porém, as normas supra-indicadas têm carácter supletivo, nada impedindo que as partes fixem em moldes diferentes o regime do risco, o que estas de facto fizeram; 10) Desde logo tal se verifica, sendo (como é claro e evidente) provado o nº 33 da base instrutória, que o acordo entre a Ré e a Autora pressupunha divisão de riscos de cultura, pelo que o prejuízo adveniente do perecimento total da mesma deverá ser suportado pelas duas partes; 11) Ou seja: as duas partes fixaram em moldes diferentes daqueles que as regras gerais quanto aos tipos de contrato prevêem de forma supletiva a questão do risco do contrato, prevendo a divisão dos mesmos e assunção dos prejuízos para si mesmo atento a impossibilidade superveniente da produção não imputável a qualquer um dos contraentes; 12) Pelo que a sentença julgou erradamente o presente processo, violando o disposto no artº 809º do Código Civil a contrario.

Contra-alegou a apelada pugnando pela confirmação da sentença.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

* 2. FUNDAMENTOS.

O Tribunal deu como provados os seguintes, 2.

  1. Factos.

    2.1.

  2. A Autora é uma...

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