Acórdão nº 2792/06.4TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelISAÍAS PÁDUA
Data da Resolução22 de Janeiro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de CoimbraI-_Relatório1. Os autores, A... e mulher B..., instauraram contra os réus, C... e mulher D..., acção sob a forma sumária (posteriormente convertida para ordinária), e que denominaram “acção de reivindicação”, pedindo que, na procedência da mesma, sejam os últimos condenados a: “- Reconhecer o direito de propriedade dos autores sobre o logradouro de acesso constante do artº 166 – urbano da matriz predial da freguesia de Torredeita, fazendo parte da descrição e registado a favor dos Autores sob o nº 3544 da 1º Conservatória do Registo Predial de Viseu e, em consequência, restituir o referido prédio aos autores, livre de incorporações, designadamente – passeio em cerâmica, parte de alpendre com cobertura metálica e objectos ali depositados – lenha, baldes com plantas e outros bens.

- Reconhecer e respeitar a confrontação em linha recta determinada pela cotadura existente ao lado do portão dos autores e a esquina do alpendre em granito dos réus.

- A pagar ao autor a importância de dois mil duzentos e setenta e sete euros e cinquenta e seis cêntimos, sendo dois mil euros a título de danos não patrimoniais e setenta e sete euros e cinquenta e seis cêntimos por danos patrimoniais.” Para o efeito alegaram, em síntese, o seguinte: Serem os autores proprietários de um prédio misto sito ao Fôjo inscrito na matriz sob o art. 166º e 2933º rústico da matriz predial da freguesia de Torredeita, concelho de Viseu, descrito e registado a favor dos AA na 1ª Conservatória do Registo Predial de Viseu sob o nº 3544, o qual adquiriram através de testamentos do pai e da mãe do autor.

Que a ligação entre a parte urbana e a parte rústica desse seu prédio se faz por uma faixa de terreno, com a área de 90 m2, denominada “logradouro de acesso” descrita no art. 166º urbano de Torredeita e sob o nº 3544 na Conservatória do Registo Predial, apresentando a forma de um rectângulo irregular, que passa defronte da casa dos réus, confrontando a nascente com o alpendre dos autores, a poente com olival dos autores, a norte com a Rua das Carvalhas e a sul com trouço de terreno rectangular situado defronte da casa dos réus e a estes pertencentes.

Que há mais de 60 anos o dito “logradouro de acesso” é utilizado pelos pais e avós do autor e por este, como ligação entre a parte rústica e a parte urbana, ali passando a pé, com carro de bois e animais, tractor, lenha, erva, estrume, alfaias, produtos da colheita do olival, parque de estacionamento, à vista de todos, sem que alguém se tenha arrogado direitos sobre o prédio, na convicção do exercício do seu legítimo direito de propriedade.

Que os réus sem autorização vêm ocupando toda a área desse logradouro, tendo ali implantado um alpendre, nivelado e cimentado o chão, depositado diversos objectos e feito do terreno parque de estacionamento, como se de coisa sua se tratasse e impedindo a sua utilização pelos autores.

Que os réus se vêm recusando a entregar aos autores tal logradouro, não obstante terem sido por várias vezes e sob diversas formas instados a fazê-lo, alegando deterem a propriedade sobre o mesmo.

Que o referido comportamento dos réus causou depressão, tristeza, desgosto, mal-estar, noites mal dormidas ao autor, obrigando-o a tomar regularmente calmantes e medicamentos para a tensão arterial e a despender a quantia de € 277,56 em electrocardiogramas, consultas e medicamentos.

  1. Os réus contestaram, defendendo-se por excepção e por impugnação.

    No que concerne àquele primeiro tipo de defesa começaram por invocar a existência de excepção de caso julgado, com o fundamento no trânsito em julgado da sentença proferida no processo nº 3914/05.8 TBVIS, que correu termos no 1º Juízo do mesmo Tribunal, e na identidade dos pedidos, sujeitos e causas de pedir em ambas as acções.

    Com base em tal facto pediram ainda a condenação dos autores como litigantes de má fé.

  2. Os autores apresentaram então novo articulado onde, além do mais, pugnaram pela improcedência da excepção do caso julgado aduzida pelos réus (nomeadamente pela inexistência da identidade de pedidos nas duas acções em confronto), e ainda pela condenação dos mesmos como litigantes de má fé.

  3. No despacho saneador a srª juiz a quo conhecendo da aludida excepção aduzida pelos réus, e em consequência dessa apreciação, decidiu nos seguintes termos: “- julgo procedente a excepção dilatória do caso julgado em relação ao pedido de reconhecimento do direito de propriedade e de condenação dos réus a restituir o logradouro reivindicado aos autores (alínea A de fls. 9) e, em consequência, absolvo os réus C... e mulher D... da instância nessa parte.

    - julgo manifestamente improcedentes todos os restantes pedidos formulados e, em consequência, absolvo os réus C... e mulher D... do pedido, em relação aos mesmos.

    - julgar improcedentes os incidentes por litigância de má fé suscitados por autores e réus e, em consequência, absolvo autores e réus do pedido de condenação no pagamento de multa e indemnização formulado pela parte contrária com fundamento em litigância de má fé”.

  4. Não se tendo conformado com tal decisão, os autores dela interpuseram recurso, o qual (e pelas razões aduzidas no despacho de fls. 245) foi recebido como apelação.

  5. Nas correspondentes alegações que apresentaram a tal recurso, os autores concluíram as mesmas nos seguintes termos: “A - No despacho saneador o juiz a quo, ao decidir pela existência de caso julgado, violou o preceituado no artº 498º nº 1 e 3 do CPC, por não se verificar identidade quanto ao pedido.

    B - Na verdade, na primeira acção os AA pediram a restituição do Logradouro de Acesso através de Acção de Restituição de Posse, intentada de acordo com o preceituado no art.º 1278º do CC.; Na segunda acção os AA pediram o reconhecimento do direito de propriedade sobre o Logradouro de Acesso e consequente restituição deste, em Acção de Reivindicação, intentada de acordo com o preceituado no art.º 1311º do CC.

    C - Por outro lado, nunca se estaria perante caso julgado , por na primeira acção não se ter conhecido do mérito, tendo havido tão só lugar à extinção da instância, por desistência, de acordo com o preceituado no artº. 287º, alínea d) do CPC.

    D - Com a excepção de caso julgado, pretende o legislador evitar que o julgador seja colocado perante a possibilidade de contradizer uma decisão anterior, o que manifestamente nunca poderia ocorrer nestes autos.

    ” 7. Não foram apresentadas contra-alegações.

  6. Corridos que foram os vistos legais, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.

    *** II- FundamentaçãoA) De facto.

    Para além dos factos descritos no ponto I (vg. sob o nº 1), importa atender, para apreciação do presente recurso, ainda aos seguintes factos que foram dados como assentes pelo tribunal a quo: 1) Sob o nº 3914/05.8TBVIS do 1º Juízo Cível deste Tribunal, correu termos uma acção sumária, que denominaram “acção de restituição de posse”, proposta por A... e mulher B... contra C... e mulher D..., em que os então autores pediram que os então réus sejam condenados a restituir aos autores um terreno designado por logradouro de acesso com 90 m2 de área pertencente ao prédio descrito no art. 166º da matriz predial urbana da freguesia de Torredeita, situado entre a rua das Carvalhas e a propriedade dos réus, livre de incorporações, designadamente passeio em cerâmica, parte de alpendre com cobertura metálica e objectos ali depositados – lenha, baldes com plantas e outros bens.

    2) Na acção referida em 1) - cuja petição inicial se encontra consubstanciada no documento junto a fls. 108/112, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido -alegaram os então autores, em síntese, que: - são donos e possuidores de um prédio inscrito na matriz sob o art. 166º e 2933º rústico da matriz predial da freguesia de Torredeita, concelho de Viseu, tendo sido adquirido pelos autores através de testamentos do pai e da mãe do autor.

    - a ligação entre a parte urbana e a parte rústica do seu prédio faz-se por uma faixa de terreno denominada “logradouro de acesso” descrita no art. 166º urbano de Torredeita que passa em frente da casa dos réus, compreendida na sua maior extensão entre o caminho – Rua das Carvalhas e uma faixa de terreno pertencente aos réus, - desde 1975 o dito “logradouro de acesso” é utilizado pelos autores para passagem (de e para a parte urbana e rústica da daquele seu prédio, e do qual faz parte) de pessoas, alfaias e produtos agrícolas e estacionamento de viaturas, de forma consecutiva, com conhecimento de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT