Acórdão nº 270/08.6TBGRD de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelGRAÇA SANTOS SILVA
Data da Resolução28 de Janeiro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra: *** *** I- Relatório: A....instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra B...., pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 7.865,00, acrescida dos juros de mora vencidos desde Julho de 2006.

Fundamentou o pedido em ter celebrado, com a Ré, um contrato para produção do 2º Festival da Serra da Estrela, tendo-lhe entregue, a título de caução, e até que esta recebesse o subsídio do IPJ a que tinha direito, a quantia de € 25.000,00. Mais tarde o IPJ pagou directamente à Ré a totalidade do valor caucionado, sendo que a Ré, depois de interpelada, apenas devolveu o montante de € 16.000,00. A A. devia à Ré € 1.000,00 pela produção do festival referente ao ano anterior, mas quando novamente a instou para lhe devolver a quantia de € 8.000,00, ela apenas lhe pagou € 135,00. Mais invocou a natureza abusiva e nula da cláusula aposta no final do contrato, de onde a Ré retira que tinha direito de opção para o evento a realizar no ano de 2007, porquanto foi escrita depois do local das assinaturas e não existiu qualquer acordo entre as partes, nesse sentido.

A Ré pugnou pela improcedência da acção. Para tanto, admitindo a produção do evento e o recebimento da importância entregue pela A. a título de caução, invocou que não tem que restituir a importância peticionada, porquanto a mesma se traduz na indemnização devida pela violação do pacto de preferência celebrado em 2006 para o evento a realizar no ano de 2007, correspondente ao valor proposto nos orçamentos de 2007, a título de produção executiva, não lhe tendo a A. comunicado as condições da realização do evento nesse último ano, para que pudesse exercer o seu direito de preferência. Alegou, ainda, que a cláusula inserida no contrato, por baixo das assinaturas, foi uma cláusula negociada, relativamente à qual a A. não colocou qualquer reserva.

A A., replicou, mantendo o alegado na petição inicial.

Realizado julgamento, foi proferida sentença, por força da qual foi a Ré condenada a restituir à A. a quantia de € 7.865,00, acrescida dos juros de mora vencidos desde o dia 28/3/2007, absolvida no demais peticionado.

Inconformada, a Ré recorreu, pedindo a total improcedência da acção, mediante a apresentação das seguintes conclusões das alegações de recurso: “I- A questão de Direito essencial para a boa decisão da presente causa consiste em aferir da validade da cláusula a que alude a alínea d) dos factos provados; II – A Recorrente não se conforma com a aplicabilidade ao caso concreto dos artigos 5º, 6º e 8º, alíneas a) e b) do Decreto-Lei n.° 446/88, de 25. 10, em razão da Recorrida ser uma pessoa colectiva, e, quanto a estas, apenas são aplicáveis os artigos constantes nas secções I e II do capítulo V desse diploma legal.

III – Sem prescindir, as cláusulas contratuais gerais caracterizam-se, segundo o n.° 1 do artigo 1.° do citado Decreto-Lei, pela pré-elaboração, rigidez e possibilidade de utilização por pessoas indeterminadas, ainda que elas possam constar de contratos individualizados, desde que se verifiquem os demais requisitos.

IV - Sendo certo que, em qualquer caso, que no melhor entendimento, este último requisito deve ser interpretado restritivamente, de modo a abranger apenas os contratos pré-formulados celebrados entre profissionais e consumidores – o que não se verifica relativamente às partes nestes autos -.

V - A pré-celebração não se deve confundir com a pré-existência de formulários contendo cláusulas contratuais, apesar de muitas vezes caminharem juntas, residindo a sua distinção na diferença entre vontade contratual e a redacção emergente dela.

VI – No caso vertente as partes negociaram o contrato, por via da aceitação do orçamento, o qual é individualizado, porquanto, tem em conta a especificidade do evento a produzir, in casu, o festival da serra da estrela.

VII – Falece por aqui logo o primeiro dos requisitos: as partes não se limitam a subscrever ou aceitar o que vier a ser clausulado, e, assim, fica afastado também o requisito da rigidez. Elas tiveram nas suas mãos os termos contratuais, tendo ido a possibilidade de modelarem o conteúdo do contrato, nomeadamente no que respeita ao preço, ao tipo de equipamentos, etc..

VIII - Aliás, não poderá perde-se de vista o que veio a suceder no ano seguinte, em que a Recorrida, na posse de um orçamento, solicitou ao Recorrente um segundo, e um terceiro, a uma outra entidade.

IX - Do mesmo modo, não se pode falar aqui de indeterminabilidade, visto que, não obstante as cláusulas impressas, existiu toda uma individualização traduzida pela individualidade dos outorgantes, do objecto, do preço, dos equipamentos, etc..., não sendo de acolher a ideia de que a Recorrida se limitou a subscrever e aceitar o contrato dos autos.

X – Acresce que, a preferência é um instituto conhecido, vulgar, não se indo para ela para com uma mera subscrição ou aceitação, sabendo-se o que tal traduz, que encerra em si uma emanação duma normalidade de vontade para quem quer dar preferência à contraparte, pelo que que não pode falar-se, também, quanto a este ponto, de mera subscrição ou aceitação.

XI - Cremos, então, que "da experiência (das máximas de experiência), do curso ou andamento normal das coisas, da normalidade dos factos" (Prof. M. de Andrade, NEPC, 215) podemos retirar, se necessário, a presunção natural de que a Recorrida, ao...

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