Acórdão nº 219/06.0TBVZL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelISABEL FONSECA
Data da Resolução23 de Setembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam os juízes da 1ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra I.RELATÓRIO A...

e B...

intentaram a presente acção, com forma de processo sumário, contra C...

e D...

, pedindo que: a) seja declarada nula e de nenhum efeito a escritura de justificação aludida no art. 3.º da petição inicial quer por o direito justificado assentar em factos e considerações falsos, quer por os justificantes não terem o direito justificado; b) seja declarada nula e de nenhum efeito, por falsa, a declaração "modelo 129" que os justificantes apresentaram nos Serviços de Finanças de E...

, participando-se oficiosamente; c) ordenar-se o cancelamento do registo com base na escritura impugnada.

Para tanto, alegam, em síntese, que as declarações efectuadas na escritura pública de justificação notarial são falsas, pois que os réus não compraram, como afirmam, o prédio em causa, que adquiriam em inventário que correu termos com o nº 14/91, por morte do pai do autor e do réu marido, sob a verba n.º12, que lhes foi adjudicada; que o prédio nunca foi misto, sendo que os réus peticionaram a rectificação das áreas do prédio no próprio inventário e participaram às Finanças o prédio misto com artigos matriciais um urbano e um rústico, com confrontações novas, posto que falsas.

Mais invocam que intentaram acção sumária sob o n.º 14/91-A na qual se põe em causa a partilha efectuada naquele inventário, designadamente no que se refere à verba então adquirida, pretendendo, com o vencimento da mesma, o regresso do bem imóvel ao acervo hereditário. Concluem que a actuação dos réus visa pôr tal bem fora de alcance, comprometendo esse fim.

Os réus contestaram, excepcionando a ilegitimidade dos autores para instaurar a acção, pois que a procedência desta em nada lhes acresce no respectivo património. Alegam, além do mais, e em síntese, que uma vez lavrado o registo da aquisição efectuada com base em escritura de justificação, não é possível impugnar a mesma, porquanto os casos de nulidade notarial constam dos arts. 70.º-71.º do Código de Notariado; não há fundamento legal para declarar nula a declaração do modelo 129; e, finalmente, que o recurso à escritura de justificação se explica pelo facto de o de cujus do inventário n.º 14/91 ter apenas ½ do prédio da verba 12, sendo a partilha nula quanto à outra ½ desse prédio, que pertencia a F...

, irmã do inventariado, quota que esta adquiriu, tal como este, da partilha por morte dos pais. Finalizam esclarecendo que o réu marido adquiriu os quinhões hereditários da F...por escritura pública cuja cópia juntam.

Os autores apresentaram resposta, alegando serem parte legítima e ser admissível a impugnação da escritura pública de justificação, independentemente de ter havido registo.

Com vista a concretização de matéria de facto e junção de documentos, foi realizado um convite ao aperfeiçoamento aos autores, a que estes acederam.

Cumprido o contraditório, os réus, essencialmente, remeteram para a primitiva contestação.

Procedeu-se ao registo da acção.

Em sede de audiência preliminar, procedeu-se ao saneamento do processo, julgando-se “improcedente a invocada excepção dilatória de ilegitimidade activa” e concluindo-se que as partes são legítimas.

Entendeu-se, ainda, que o estado dos autos permitia o conhecimento do mérito do pedido formulado proferindo-se sentença que concluiu nos seguintes termos: “Pelo exposto, o Tribunal julga parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:

  1. DECLARA-SE QUE A ESCRITURA DE JUSTIFICAÇÃO, outorgada no dia 13.05.2004, no Cartório Notarial de E..., id. em 8 da matéria assente NÃO PRODUZ QUAISQUER EFEITOS JURÍDICOS.

  2. DETERMINA-SE o cancelamento do registo efectuado pelos RR sobre o prédio identificado na referida escritura.

  3. ABSOLVE os RR do restante pedido.

* Custas pelos AA e RR em 1/3 e 2/3 respectivamente.

* Registe e notifique as partes e dê conhecimento ao Cartório Notarial de E... e à Conservatória do Registo Predial de E...”.

Não se conformando, os réus recorreram, peticionando a revogação da decisão em ordem à “absolvição dos réus da instância, por ilegitimidade activa, ou do pedido, por improcedência”.

Formulam, em síntese, as seguintes conclusões: “(…) 7.2. Os autores são parte ilegítima, segundo o que alegam, pois não têm interesse directo em demandar e a procedência da acção não lhes traz qualquer utilidade (art. 26º, C.P.Civil).

7.3 Por outras palavras, o seu património jurídico não é acrescentado com a procedência da acção, nem tão pouco é diminuído com a improcedência.

7.4. A impugnação da escritura de justificação é inadmissível, depois de registado o direito justificado, como decorre da lei notarial (art.101º, C. Not.).(…) 7.7. Os réus invocaram os factos constitutivos do seu direito, ao contrário do que se pretende. (…) 7.9. O recurso à escritura de justificação explica-se por o de cujus do inventário, G..., ter na verdade apenas metade do prédio em causa, sendo a partilha nula quanto à outra metade desse prédio, pertencente à irmão do G..., F....

7.10. Acrescente-se que a mesma adquiriu essa quota, tal como o G...

, na partilha por morte dos pais, H...

e I...

, vindo os réus a adquirir os respectivos quinhões hereditários da F..., ou seja, a outra metade do dito prédio.

7.11. Desta forma, a escritura de justificação, pecando na aparência por pouco ortodoxa, sanciona na verdade uma realidade jurídica demonstrável e comprovada, não havendo qualquer interesse em obrigar os réus a substituir no caso um registo (da justificação) por outro (da aquisição sucessória e das compras conexas).

Os autores apresentaram contra alegações, formulando as seguintes conclusões: “1ª Os RR. justificantes não compraram, verbalmente e em 1981, nada à F...e marido; logo mentiram! 2ª Os RR. não compraram em 1990 o prédio justificado, antes o quinhão hereditário da F...na herança ilíquida e indivisa deixada por óbito dos pais J...

e mulher; 3ª Dado que os J... e mulher eram, simultaneamente pais da F..., do G... (pai dos A e R. maridos) e de outros filhos que ao caso não interessam, o imóvel deixado por óbito daqwueles (J.... e mulher) não integra necessariamente o quinhão hereditário da F...; 4ª Porque não partilhada a herança do J... e mulher, avós dos A. e R. maridos, estes são a ela chamados em representação do pai (G..., filho do J... e irmão da F...), podendo o prédio vir a caber –lhes na partilha; têm assim os AA. Interesse económico e processual na declaração de ineficácia da escritura de justificação.

5ª No inventário 14/91 (instaurado por óbito do G...) não foi partilhado o quinhão hereditário deste ( G...) na herança dos pais ( J... e mulher); 6ª É ilegal e impróprio o recurso à escritura de justificação quando os justificantes tinham título: apenas a questão do prédio integrar ou não o quinhão hereditário (e vimos de ver que não) lhes impediu o registo …”. Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

  1. FUNDAMENTOS DE FACTO A 1ª instância deu por provada a seguinte factualidade, aditando esta Relação os factos ora consignados...

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