Acórdão nº 3865/10.4T2AGD-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelCATARINA GONÇALVES
Data da Resolução10 de Julho de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

A...

e B...

, residentes na Rua (...) Amoreira da Gândara, instauraram processo de execução contra C..., residente na Rua 24 de Abril, nº 4, Amoreira da Gândara, com base em sentença que homologou uma transacção efectuada entre os Exequentes e D...

e na qual este assumiu a obrigação de realizar obras de conservação no antigo posto de leite, referido na transacção, bem como a construir a uma fossa séptica. Alegam que o referido D... faleceu em Janeiro de 2010, tendo-lhe sucedido na posição de senhorio o seu filho, ora Executado e que, não obstante as interpelações efectuadas, as obras referidas não foram ainda realizadas, encontrando-se o Executado em mora desde 30/10/2009.

Com esses fundamentos pedem que o Executado proceda à realização das obras, pedindo ainda o pagamento da quantia de 71.400,00€ correspondente à indemnização moratória que foi fixada na aludida transacção.

O Executado veio deduzir oposição a tal execução, invocando a sua ilegitimidade por não ter sido parte no processo onde foi efectuada a transacção, mais alegando ter existido lapso de escrita quando se aludiu, na referida transacção, a uma fossa séptica, já que a intenção das partes foi sempre a de executar uma fossa tanque e não uma fossa séptica. Alega que, no prazo fixado, D... executou as obras a que estava obrigado, inexistindo qualquer incumprimento e que, em qualquer caso, a cláusula penal não seria devida, porquanto, nos termos do art. 811º do C.C., o Exequente não poderia exigir uma indemnização superior ao prejuízo resultante do incumprimento e, no caso, não existe qualquer prejuízo. Sustenta ainda que a execução para prestação de facto e para pagamento de quantia certa têm tramitação incompatível, sendo, por isso, inadmissível mover execução destinada a ambas as finalidades.

Os Exequentes contestaram, sustentando a improcedência da excepção da ilegitimidade, na medida em que, no requerimento de execução, invocaram os factos constitutivos da sucessão. Mais alegam que não existiu qualquer lapso na transacção e que as obras acordadas não foram totalmente realizadas, sendo que a fossa construída não é uma fossa séptica e, em rigor, nem sequer era uma fossa estanque, já que, de acordo com o parecer técnico do Município, deveria ser impermeabilizada pelo seu interior; no que toca às obras de conservação, o Opoente apenas rebocou as paredes – reboco que em Março de 2010 já estava a cair – e não pintou as paredes, não substituiu a porta e janela que, à data da transacção, já estavam apodrecidas e a placa que colocou verte água sempre que chove.

Conclui pela improcedência da oposição, pedindo ainda que o Opoente seja condenado como litigante de má fé em multa e indemnização não inferior a 500,00€.

Foi proferido despacho saneador e foi dispensada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.

Após realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, julgando a oposição parcialmente procedente, determinou o prosseguimento da execução, mas reduzindo a quantia devida a título de cláusula penal ao valor de 10.000,00€.

Inconformado com essa decisão, o Executado/Opoente veio interpor o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1. A douta decisão do Tribunal A QUO é totalmente omissa quanto à fundamentação da matéria de facto provada. E, 2. Não identifica os factos não provados.

  1. Isso impede que o recorrente impugne a matéria de facto dada como provada e aquela que deveria dar como não provada.

  2. Tal omissão constitui nulidade processual, por influir na decisão final, nos termos dos art.ºs 607 , 615 e 195, C.P.C.

  3. O Tribunal A QUO deu como provadas sob as als. F) e H) o seguinte: F) O reboco encontra-se a cair H) A placa verte água sempre que chove 6. O recorrente não sabe com base em que provas o tribunal considerou esses factos como assente, por a sentença ser omissa. Todavia, 7. Face à peritagem feita nos autos onde o perito refere expressamente: Em 19/06/2012 e 21/06/2012 foram feitas duas vistorias em que constataram o seguinte: O antigo “posto de leite” localiza-se na freguesia de Amoreira da Gândara, na rua (...). Apresenta uma área aproximadamente de 16,65 metros (4,5X3,7) e apresenta as paredes e o tecto rebocado com acabamento em areado fino. O pavimento é regular e em cimento. As paredes apresentam fissuras e alguns indícios de humidade junto à interceção com a laje do tecto. Apresenta uma janela de 113 cm por 52,5 cm vedada pelo exterior, através de um gradeamento de quadrícula de 10 cm x 10 cm e, pelo interior, através de uma rede arâmica de quadricula 0,5 cm x 0,5 cm.

    Em resposta a quesito 3 – A placa verte água, tem deficiência na impermeabilização? Responde o Sr. Perito – Na altura da vistoria foi possível verificar que existem algumas manchas de humidade que podem ser resultantes de impermeabilização ou de processo de condensação. Sem a realização do teste de estanquicidade não é possível responder objetivamente à questão.

  4. Refere a testemunha – E... – cujo o depoimento se encontra gravado no sistema de gravação digital, disponível na aplicação informática em suso no Tribunal com início ao minuto 00:00:01 e termo ao minuto 00:15:40, cf. ata de fls…. O seguinte: Adv.

    Engenheiro D..., portanto, quem lhe pediu, e o que é que o Sr. Engenheiro D... lhe pediu para fazer, diga-me? Test.

    Rebocar, arear, fazer piso e meter tela Adv.

    Já disseram aqui que aquilo estava a cair? Test.

    Eu acho que aquilo não cai assim às boas Adv.

    Olhe, se estiver a cair, o Sr. refaz isso tudo? Test.

    Refaço 9. Diz-nos a lógica e a experiência que numa situação destas o inquilino sabia que os serviços prestados teriam garantia e comunicaria ao senhorio, o que não aconteceu, sinal que não existem esses defeitos.

  5. Face a tais elementos de prova, deveria o Tribunal A QUO considerar como não provados os factos constantes da als. F) e H) dos factos provados.

  6. Deveria o Tribunal A QUO ter dado como provado a matéria de facto constante nos art.ºs 19, 21, 29, 37, 39 e 56 da P.I. de embargos, com base no depoimento do exequente A..., disponível na plataforma informática em uso no Tribunal, com inicio desde o minuto 00:00:01 a 00:14:34 cf. a ata de fls…. e o relatório pericial junto aos autos, donde consta inequivocamente o seguinte: J.

    Este lavatório que existia no referido antigo posto de leite foi colocado por si? R.

    Não, já lá existia quando fui para lá, tenho lá para entregar ao senhorio.

    J.

    O Sr. então explora um café instalado no prédio pertencente ao Sr. D... a cerca de 15 metros R.

    Sim, 15 metros 20 metros, não é mais Sr. r. Juiz do posto de leite J.

    Relativamente à fossa, pergunta-se aqui se foi feita uma fossa tanque com capacidade para 600 litros de líquido R.

    Sr. Dr. Juiz quilo deve levar à volta de 1 m3 de água.

    J.

    Pergunta-se aqui se o antigo posto de leite é uma pequena divisão que tinha um lavatório, que quando foi feita a transação ficou eliminado um cano que vinha do poço e que fica a cerca de 9/10 metros do prédio? R.

    Sim, sim, tinha sim senhor, tinha água e luz e o senhorio é que me cortou a água e a luz J.

    Aqui também se pergunta se o espaço foi arrendado ao exequente para guardar vasilhame vazio e para arrecadação? R.

    O espaço foi, é um armazém que está destinado aos haveres do estabelecimento.

    J.

    Então é verdade, não é? R.

    É verdade.

    J.

    No antigo posto de leite não existia qualquer sanitário? R.

    Não, não J.

    Aqui pergunta-se se o Sr. ainda não colocou o lavatório que retirou antes das obras? R.

    É evidente que não, tenho-o lá para entregar.

    Do relatório pericial de fls…. consta o seguinte: - No interior do antigo “posto de leite” existe um tanque de capacidade aproximada 1m x 1m x 1m.

    Q4 – Se há nesse compartimento (antigo posto de leite) alguma instalação sanitária ou oura para que seja necessária a fossa? R.

    Não Q5 – Se no referido compartimento (antigo posto de leite) há algum ponto de água? R.

    Não Q6 – Algum lavatório? R.

    Não 12. Desse depoimento de peritagem, da lógica e de experiência, resulta inequivocamente provada a matéria de facto vertida nos art.ºs 19, 21, 29, 37, 56 da P.I. ao assim não decidir fez o Tribunal A QUO uma errada avaliação da matéria de facto.

  7. O oponente/executado é parte ilegítima nos autos.

  8. O óbito de qualquer pessoa só se pode demonstrar por documento ou de modo previsto na lei.

  9. Ao processo não foi junta qualquer certidão de óbito, portanto, não está provada que o requerido D... tenha falecido.

  10. Sem haver morte não pode haver uma sucessão “mortis causa”.

  11. Nenhuma prova existe nos autos, logo processualmente a pessoa não pode considera-se falecida.

  12. Deve a cláusula 12º da transação – sic – em caso de incumprimento do ora acordado por qualquer uma das partes, a título de cláusula penal, fixam as partes, desde já, uma indemnização diária de 200,00 € até ao cumprimento, ser declarada nula por abuso de direito, nos termos do art.º 334 C. Civil. Caso assim não se entender, 19. Atendendo ao bem em causa (prestação de facto fungível), o valor da renda, o facto de o requerido não ter tirado qualquer benefício económico ou outro, do exequente não ter tido qualquer prejuízo, de o requerido ter pedido a terceiros para fazer as obras e estar convencido que tudo tinha sido bem feito, deve o montante a fixar por este venerando tribunal a título de cláusula penal ser reduzido para o montante de 1.000,00 € (mil euros), o correspondente à renda durante cerca de dois anos e meios, nos termos do art.º 812 C. Civil.

  13. A douta decisão recorrida, violou, entre outras, o disposto nos artigos_195,607,615 e 640 C.P.C. 334, 812 C. Civil.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    ///// II.

    Questões a apreciar: Atendendo às conclusões das alegações do Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir: • Saber se a sentença padece de nulidade por falta de identificação dos factos não provados e por falta de fundamentação da matéria de facto; • Saber se...

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