Acórdão nº 1423/09.5TBMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Junho de 2014
Magistrado Responsável | CATARINA GONÇALVES |
Data da Resolução | 17 de Junho de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.
A...
, residente na (...), Vieira de Leiria, intentou acção, com processo ordinário, contra B... Companhia de Seguros, S.A., com sede na (...), Lisboa, alegando, em suma, que: celebrou com a Ré, em 07/04/2008 e em 21/04/2008, dois contratos de seguro do ramo vida, por via dos quais a Ré garantia o pagamento de uma indemnização em caso de morte ou invalidez absoluta e permanente; tal indemnização seria paga ao Banco C... e ao D... até ao valor máximo de 75.000,00€, sendo pago à pessoa segura o valor remanescente; em 09/11/2008, o Autor foi vítima de doença, tendo-lhe sido atribuída uma IPP de 80%, tendo ficado totalmente incapacitado para o trabalho em geral; não obstante esse facto, a Ré recusa-se a cumprir as obrigações resultantes dos contratos de seguro que celebrou com o Autor.
Com estes fundamentos, pede que a Ré seja condenada a:
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Reconhecer que o Autor está afectado de uma incapacidade permanente geral de 80%; b) Reconhecer que o Autor está afectado de uma invalidez total e permanente para o trabalho, em consequência da doença; c) A pagar ao Autor a importância igual ao capital em risco, constante nos contratos de seguro celebrados, o valor de 150.000,00€ acrescido de juros de mora, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
A Ré contestou, sustentando que o Autor é parte ilegítima, dada a circunstância de os primeiros beneficiários daqueles contratos serem os Bancos C...e D..., não podendo o Autor reclamar para si o pagamento de quantias que constituem créditos das referidas instituições bancárias. Mais alega que, à data da celebração dos contratos, o Autor já padecia de hipertensão arterial e de alterações degenerativas graves na coluna, tendo omitido esses factos no questionário que lhe foi apresentado previamente à celebração dos contratos, omitindo informação que permitiria à Ré tomar conhecimento da real situação clínica do Autor, sendo que a Ré não teria celebrado o contrato nas condições em que o fez, caso tivesse conhecimento daquelas patologias que constituem doenças incuráveis e evolutivas que acabam por se tornar incapacitantes com o decurso do tempo; por outro lado, sabe agora a Ré que o Autor já havia contratado pelo menos mais um seguro de vida, antes da celebração dos contratos de seguro aqui em causa (facto que o Autor também omitiu aquando do preenchimento do questionário), ao abrigo do qual também invocou a sua invalidez com vista ao pagamento do capital seguro, correndo termos uma outra acção onde o Autor exige o pagamento desse capital à E...., Companhia de Seguros, S.A.; acresce ainda que o Autor nunca fez prova de que se encontrava numa situação de invalidez total e permanente, nos termos definidos no contrato, ou seja, que se encontrava numa situação de total incapacidade para exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade lucrativa compatível com as suas capacidades, conhecimentos e aptidões e também nunca demonstrou – conforme se exigia no contrato – que fique com uma perda de ganho de, pelo menos 66%, relativamente à situação existente antes do sinistro.
Com estes fundamentos e invocando a anulabilidade dos contratos de seguro, conclui pela improcedência da acção.
O Autor respondeu, sustentando a sua legitimidade, alegando que apenas teve conhecimento do seu estado de saúde depois da celebração do contrato de seguro e alegando estar impossibilitado de auferir quaisquer rendimentos, necessitando de assistência permanente de terceira pessoa.
Conclui pela improcedência das excepções invocadas.
Foi proferido despacho saneador, onde se julgou improcedente a excepção de ilegitimidade do Autor. Foi efectuada a selecção da matéria de facto assente e base instrutória.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a Ré dos pedidos.
Inconformado com essa decisão, o Autor veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: 1. O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo não apreciou devidamente as provas produzidas em sede de julgamento, verificando-se erro na apreciação das provas; 2. Os concretos meios probatórios, nomeadamente a prova documental e testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, impunham decisão diversa da recorrida; 3. Com o devido respeito pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, entendem os Apelantes que a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, nomeadamente a testemunhal, não foi devidamente valorada, impondo-se, por isso, a sua reapreciação, quanto aos pontos o), t), u), v), y) e aa) da douta sentença.
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Vejamos, quanto aos pontos o), t), u), v), y) e aa) da douta sentença, os mesmos nunca poderiam ser dados como provados, na nossa modesta opinião.
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Isto porque, tendo em conta os documentos juntos aos autos, nomeadamente, o relatório da perícia médico legal, conjugado com o depoimentos dos médicos Dr.º F... e Dr.º G..., que efetivamente acompanharam o Apelante, resulta claramente que este apenas teve conhecimento da doença, que levou posteriormente à sua incapacidade, depois da celebração do contrato de seguro.
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Aliás, só em data posterior a 12 de Abril de 2008 teve conhecimento da mesma, depois da primeira consulta com o Dr.º G... e assinou o contrato em 7 de Abril de 2008.
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Isto porque os dois médicos foram unânimes em afirmar que o Apelante é portador de uma doença degenerativa.
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Doença, essa, que se pode manifestar de um instante para o outro, e este esclarecimento foi devidamente prestado por ambos os médicos identificados.
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Ora o Dr.º F..., cujo depoimento se encontra gravado no sistema Citius, na sessão de 18-10-2013 de 16:27:25 a 17:15:42 e o Dr.º G..., cujo depoimento se encontra gravado no sistema Citius, na mesma sessão de 17:16:53 a 17:54:28.
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O Dr.º F..., que foi sempre o médico de família do Apelante, referiu que, por ter surgido uma situação nova, encaminhou para o seu colega Dr.º G....
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Sucede que tudo isto ocorreu após a celebração do contrato de seguro, ou seja, o Autor apenas tomou conhecimento do que padecia, após os exames complementares efetuados pelo Dr.º G... e não antes.
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Isto porque, apenas seriam uma dor de costas, resultante da profissão que exercia.
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Ou seja, face ao teor de tais depoimentos, os mesmos foram unânimes ao afirmar que o Apelante apenas tomou conhecimento da doença que padecia, após a realização dos exames complementares, cujos resultados apenas teve conhecimento em finais de Abril.
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Aliás, de tais depoimento resulta que o Apelante não tinha, em momento anterior à realização dos referidos exames, informação que padece-se de qualquer doença ou anomalia relevante, para informar no contrato de seguro (muito menos degenerativa).
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Aliás, não resulta de qualquer modo da prova produzida, que o Apelante tenha tido conhecimento das mesma em momento anterior aos exames complementares realizados pelo Dr.º G....
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Ou seja, se o médico não lhe explicou, também não podia o Apelante fazer menção a elas.
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Tendo sido dado como provado que o Apelante era vigiado pelo médico de família, também é verdade que nenhuma doença lhe fora detetada.
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Pelo que a resposta a estes factos apenas deveria ser de não provados.
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Com o devido respeito pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, entendem ainda os Apelantes que a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, não foi devidamente valorada, impondo-se, por isso, a sua reapreciação.
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O Meret.º Juiz do tribunal a quo, decidiu por anular o contrato de seguro, perante a falta de verdade do Apelante.
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Com o devido respeito, não podem os Apelantes concordar com a douta decisão.
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Como já se referiu, e dado como provado, o Apelante não tinha conhecimento, à data da celebração do contrato de seguro, que fosse portador de qualquer doença.
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No âmbito do contrato de seguro de saúde releva a existência de inquéritos clínicos, que acompanham as propostas, como documentos através dos quais a seguradora fica a saber as circunstâncias concretas do risco que assume, inteirando-se assim, do estado de saúde do segurado, e daí que este, ao prestar as declarações correspondentes, com vista à celebração do contrato, o deva fazer de forma verdadeira e exata.
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A verificação da presença de doença pré-existente deve assentar em critérios objetivos, que se prendem com o respetivo diagnóstico médico, e como tal reconhecida, independentemente da maior ou menor morosidade do respetivo desenvolvimento.
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A alegação e prova da presença de doença pré-existente, por impeditiva do efeito pretendido pelo segurado, sempre caberá à parte que dela aproveita, isto é, à seguradora.
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A referência a prováveis dores que o segurado possa ter sentido, ou a possíveis restrições de mobilidade de dimensão imprecisa, são insuficientes para, na falta de prova efetiva sobre a existência do diagnóstico da doença e o respetivo conhecimento por aquele, permitir presumir tal conhecimento, com base em juízos de experiência comum, presente até as especificidades do saber exigido para a formulação desse tipo de conclusões.
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Sucede que nenhuma prova foi feita pela Apelada, de que o Apelante já era portador de doença, ou que dela já tivesse conhecimento.
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Pelo que não se verificou qualquer causa de anulabilidade do contrato de seguro.
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Pelo que não se verificou qualquer causa de anulabilidade do contrato de seguro.
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Pelo que, não restava outra alternativa ao Meret.º Juiz do tribunal a quo, como no nosso entender não resta aos Venerandos Desembargadores, senão condenar a Apelada nos termos requeridos na petição inicial.
Termos em que deve ser revogada a douta sentença, com as legais consequências.
A Apelada apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: 1. As respostas dadas pelo Tribunal “a quo”, constantes dos pontos o), t), u), v), y) e aa) da sentença, não merecem qualquer reparo, correspondendo exactamente à prova produzida nos autos, concretamente à prova documental, à prova...
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