Acórdão nº 318/11.7TBTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução25 de Março de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1 A...

, intentou contra B... , C...

e marido D... , E... e F...

, ação declarativa, de condenação, com forma de processo sumário.

Pediu: A condenação dos réus a: a) reconhecerem que o autor é proprietário exclusivo dos dois prédios descritos no artigo 1º da petição; b) não entrarem nos ditos prédios do autor, nem estorvarem a sua posse restituindo-lhes a parcela e dependência que ilicitamente ocupam livres e devolutas; c) Pagarem ao autor uma indemnização pelos prejuízos causados, que não sendo passíveis de apurar em toda a sua extensão terão de ser apurados em futura liquidação.

Para tanto alegou: É dono e legitimo possuidor de dois prédios identificados no artigo 1º da petição inicial, os quais foram doados ao autor por seus pais, os quais há mais de 20 e 30 anos, por si só e pelos seus antepossuidores vem possuindo, ininterruptamente à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja, agricultando-se, semeando-os, colhendo vinho, batatas e demais frutos, melhorando-os, fruindo-os e dispondo deles como único e exclusivo dono.

Os réus há alguns anos que ocupam cerca de 3.000 m2 dos referidos prédios e ainda uma dependência agrícola a que atribuem o destino de casa de habitação.

No mês de Janeiro de 2011 os réus cortaram duas oliveiras na referida parcela, sem autorização e conhecimento do autor. Acrescenta que quase diariamente os réus à excepção da primeira ré estacionam veículos automóveis e tractores na referida parcela propriedade do autor, ou na entrada da mesma dessa forma obstruindo e impedindo o autor de livre acesso.

Com tal ocupação ilegal os réus vêm privando o autor da fruição da referida parcela de terreno e da dependência agrícola e paralelamente, alcançando à custa do autor todos os benefícios que essa parcela e dependência são susceptíveis de dar, não sendo ainda tal prejuízo inteiramente conhecido.

A curadora provisória nomeada à ré B (...), em representação desta apresentou contestação/reconvenção, alegando: Por contrato verbal celebrado no ano de 1967 a ré B (...) e seu marido tomaram de arrendamento a G...

e um primo uma casa de habitação constituída por r/c com dois quartos, uma cozinha e uma sala e um sótão amplo com um barracão com cerca de 30 m2, implantado no prédio rústico identificado no artigo 1º, al. a) da petição.

Desde há mais de 40 anos que a 1ª ré passou a habitar a referida casa, nela dorme, confecciona e toma refeições tendo ali criado os filhos até à idade em que estes constituíram o seu lar e abandonaram o lar dos pais.

Pelo arrendamento misto começaram por pagar 60 alqueires de milho por ano e há cerca de 3 anos, a quantia de € 175,00 por ano.

A ré é uma pessoa de idade avançada, sofre de doença que lhe dificulta a locomoção.

A ré cortou uma oliveira já velha e seca sem qualquer préstimo.

Pediu: A improcedência da ação e a absolvição dos réus dos pedidos.

E, em reconvenção, pede que o autor seja condenado a: a) reconhecer que há cerca de 40 anos entre a ré B (...) na qualidade de arrendatária e G(...) e um primo deste foi celebrado um contrato de arrendamento misto, uma parte para habitação e que tem como objecto a casa de habitação identificada no artigo 2º da contestação e outra parte que integra uma parcela de terreno com a área de cerca de 3.000 m2 dos artigos rústicos identificados pelo autor no artigo 1º da petição, pagando actualmente de renda a quantia de € 175,00 por ano; b) Reconhecer que após a morte dos primitivos proprietários o contrato de arrendamento misto se transmitiu para os pais do autor H... e I... e posteriormente após a doação que estes fizeram dos bens ao autor, se transmitiu para este; c) reconhecer que a casa de habitação identificada no artigo 2º, casa onde a ré B (...) habita há mais de 40 anos é predominante tendo, um valor superior, à parte rústica; d) reconhecer que a parte rústica do arrendamento é secundária e complemento da parte destinada à habitação; e) reconhecer que a renda inicialmente acordada de 60 alqueires de milho por ano é hoje no montante de € 175 por ano, renda que nos últimos três anos tem sido paga aos pais do autor; f) reconhecer a ré B (...) como arrendatária da casa de habitação e da parcela agrícola e como tal com o título legítimo que lhe permite o uso e fruição de tais bens; g) ser o autor condenado como litigante de má fé em multa e indemnização a favor da ré contestante de montante não inferior a € 1.500; Em resposta o autor: Admitiu a possibilidade de existir um contrato de arrendamento rural o qual por ser verbal é nulo por vicio de forma, não podendo o mesmo obstar ao exercício do direito de reivindicação do autor.

  1. Prosseguiu a ação os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual se decidiu: «I - Julga-se a presente acção totalmente procedente por provada e em consequência, condenam-se os réus B (...), J(...), C (...) e marido D(...), E(...) e F(...): a) Reconhecerem que o autor é dono e legítimo proprietário dos prédios identificados nos pontos 1) e 2) da factualidade provada; b) A não entrarem nos prédios aludidos nos pontos 1) e 2), nem estorvarem a posse do autor, restituindo-lhe a parcela aludida em 3) que ocupam, livre e devoluta.

    1. A pagarem ao autor uma indemnização pelos prejuízos causados, a apurar em futura liquidação.

    II – Julga-se procedente a excepção dilatória prevista no artigo 35º, n º 5 DL 294/2009, de 13 de Outubro, julgando extinta a instância reconvencional e em consequência absolvo o autor/reconvindo A (...), da instância reconvencional.

    Não se vislumbra a existência de litigância de má fé por parte do autor.» 3.

    Inconformado recorreu a ré B (...).

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1- a 3 – meramente descritivas.

    4 – Afigura-se à Ré que o Tribunal “à quo” não fez uma judiciosa valoração da prova, uma correcta selecção da matéria de facto e não fez também uma criteriosa aplicação da Lei aos factos.

    5 – A Ré para obstar à procedência do pedido de restituição, invoca a existência de um contrato de arrendamento conjunto (misto) de uma parte urbana e de uma parte agrícola/rústica.

    6 – Os factos vertidos na acta de fls. em resultado da inspeção judicial ao local nomeadamente os constantes dos pontos nº 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 14 e 15 que aqui se dão como reproduzidos por economia processual, caracterizam e identificam a casa de habitação da Ré, o número de compartimentos, os materiais utilizados na sua construção, a porta principal e o número de janelas em alumínio e outros elementos identificativos e caracterizadores de tal habitação.

    7 – A Ré logrou provar que há cerca de 40 anos conjuntamente com o seu falecido marido tomaram de arrendamento, de modo verbal, aos anteriores proprietários G(...) e a um primo uma casa de habitação e uma parcela de terreno com cerca de 3.000 m2 desafectada dos artºs rústicos 1880 e 1881.

    8 – Pelo arrendamento da casa de habitação e da parcela de terreno as partes convencionaram a renda de 60 alqueires de milho, renda que foi alterada em 2011, por acordo, para numerário que fixaram em 175 € por ano.

    9 – O estado de saúde da Ré e de seu marido ainda em vida deste não lhe permitiam cultivar a parcela agrícola, sendo que após o falecimento deste há cerca de 3 anos a mesma encontra-se de lameiro.

    10 – A impossibilidade da Ré em agricultar a parte agrícola, facto do conhecimento dos pais do Autor e também deste, levou a que aceitassem como fim do arrendamento a habitação da Ré, sendo revelador da vontade das partes a alteração da renda em géneros para pagamento em dinheiro.

    11 - Consagra o artº 1066 do Código Civil que “1 – O arrendamento conjunto de uma parte urbana e de uma parte rústica é havido por urbano quando essa seja a vontade dos contraentes. 2 – Na dúvida, atende-se sucessivamente, ao fim principal do contrato e à renda que os contraentes tenham atribuído a cada uma delas. 3 – Na falta ou insuficiência de qualquer dos critérios referidos no número anterior, o arrendamento tem-se por urbano”.

    12 – Com o pagamento em numerário da renda foi vontade dos anteriores proprietários e da Ré em aceitar como fim principal ou exclusivo do arrendamento a habitação, sendo acessório deste a parte agrícola.

    13 – O Tribunal “à quo” deu incorrectamente como julgado os pontos 6 e 7 da base instrutória ao declarar que a casa de habitação da Ré se trata de uma dependência agrícola dos prédios do Autor destinada a guardar alfaias agrícolas, confundindo-se a casa de habitação com as construções anexas para criação de animais e guarda alfaias agrícolas.

    14 – O Tribunal “à quo” não atendeu à vontade das partes, ao que os anteriores proprietários quiseram dar de arrendamento e o que é que a Ré e seu marido quiseram tomar de arrendamento àqueles, apenas e tão somente a casa de habitação e uma parcela agrícola, que não os prédios no seu todo que o A. identifica na petição.

    15 – Os anteriores proprietários, a Ré e seu marido autonomizaram o objecto do arrendamento cingido à casa de habitação e à parcela agrícola, que desafectaram e autonomizaram do conjunto predial nada tendo a ver os artºs rústicos inscritos sob os artºs 1880 e 1881 com o contrato de arrendamento celebrado.

    16 – A maior predominância da parte urbana sobre a parte agrícola foi até constatada pelo Tribunal aquando da inspecção judicial ao local, com a fruição e gozo da casa de habitação pela Ré e o não cultivo da parte agrícola.

    17 – É revelador e indiciador da vontade das partes em atribuírem como fim principal do arrendamento para habitação a alteração da renda em géneros para numerário, se outros elementos não houvessem para caracterizar o arrendamento como urbano acessoriamente com uma parte agrícola 18 – O Tribunal “à quo” não decidiu correctamente o ponto 8 da base instrutória ao considerar que a ocupação da casa de habitação e da parcela agrícola (que não de toda a área dos prédios identificados pelo Autor) ocorre de forma abusiva e indevida.

    19 – A Ré provou que tem título legítimo que lhe permite...

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